A articulação entre PT, PSB e PSOL é uma pequena reviravolta no universo da esquerda. Com ela, o PT parece desarmar um relativo isolamento político dentro de seu próprio campo, que vinha sofrendo desde a criação do bloco entre PDT, PSB e PCdoB.
A causa dessa mudança de ares foi a divergência entre PDT (e PCdoB), de um lado, que decidiu apoiar a reeleição de Maia, e PSB, de outro, cujo presidente e lideranças parlamentares tem sinalizado contra Maia.
Para obter sucesso, o PT fez dois movimentos paralelos.
O primeiro foi aproximar-se ainda mais do PSOL, legenda com a qual, depois de uma relação tumultuada, o PT voltou a ter afinidades. As novas relações entre PT e PSOL forjaram-se nas batalhas políticas dos últimos anos, em especial as lutas contra o golpe. A posição firme das principais lideranças do PSOL contra a prisão de Lula, uma questão hoje central no PT, e a participação intensa do candidato psolista Guilherme Boulos na campanha de Haddad no segundo turno, ajudaram a cimentar a união dessas duas legendas. Desalojado do poder e acossado pela perseguição dos órgãos judiciais, com sua principal liderança presa, o PT precisou beber nas fontes simbólicas da esquerda, onde reencontrou o PSOL, o qual nunca deixou de ser um PT à moda antiga, um PT dos anos 80.
Esse movimento do PT explica a ida de Gleisi à Venezuela, que pouca gente entendeu, em especial a ala que os petistas mais radicais hoje chamam de “direita do PT”, liderada por Haddad e Jaques Wagner.
O bloco formado por PDT, PCdoB e PSB esvaziou-se prematuramente, ao não demonstrar convergência, sequer planejamento, em seu primeiro teste real, a eleição de um nome para a presidência da Câmara.
Com o bloco à deriva, o PT fez um segundo movimento: com apoio já garantido do PSOL a seu próprio bloco, atraiu o presidente do PSB, Carlos Siqueira, e o líder do partido na Câmara, Tadeu Alencar, que já haviam sinalizado expressamente contra o presidente da Câmara, e que deviam estar constrangidos com a recente visita de Maia a Paulo Câmara, governador de Pernambuco, e as entrevistas deste em favor da reeleição do deputado do DEM.
O PT rearticula-se, assim, como liderança, ao menos por enquanto, no modesto universo da esquerda parlamentar. E aparece, na opinião pública, como uma legenda ainda capaz de superar suas dificuldades.
Os porta-vozes deste novo “bloco de oposição” disseram agora que “irão convidar” PDT e PCdoB. Para quem lê nas entrelinhas, sabe que é uma sutil ironia em referência a convite similar que lideranças do PDT e PCdoB fizeram ao PT.
O bloco do PDT, PSB e PCdoB, por sua vez, corre o risco de implodir. O próprio vice-presidente do PSB, o governador Paulo Câmara, na entrevista concedida à Folha nesta segunda, fala no bloco como se referisse a uma ideia já morta.
Para o PDT, a movimentação petista traz um novo desafio. Em diversas entrevistas e discursos, as lideranças do partido deixaram claro sua estratégia, de fazer uma oposição “propositiva”, que fuja à polarização quase sanguínea, frequentemente irracional, que parece existir entre Bolsonaro e o petismo. Para isso, o PDT precisa atrair, no parlamento e na opinião pública, forças sociais dispostas a assumir uma posição de independência em relação a Bolsonaro, e ao mesmo tempo ainda muito desconfortáveis diante dos erros políticos e escândalos midiático-judiciais do PT.
E o PSB? Quase sem militância orgânica, com lideranças discretas, é difícil saber o que pensa o partido. A neutralidade do PSB no primeiro turno das eleições presidenciais foi, no fundo, um apoio velado ao PT, já que os socialistas não podiam fazê-lo abertamente, por causa da oposição a isso de algumas alas importantes do partido, que defendiam a neutralidade ou o apoio a outro candidato.
O lado negativo da nova movimentação petista seria criar dificuldades para a estratégia de superar a polarização excessiva e atrair o centro político, na sociedade e no parlamento, com vistas a reconquistar as maiorias (incluindo as neurastênicas e barulhentas classes médias) e derrotar essa direita entreguista e antissocial, com aspirações fascistas, representada por Bolsonaro. Um bloco hegemonizado ideologicamente pela dupla PT/PSOL teria dificuldades de seguir por essa via (que de resto é tão incerta como qualquer outra).
O lado bom, de um grande bloco de esquerda de oposição, reunindo PSB, PDT, PCdoB, PT e Rede, seria a possibilidade – hoje ainda um sonho distante, por causa de feridas ainda não cicatrizadas, além das diferenças ideológicas, estratégicas, morais, de visões de mundo, etc – de unir o campo progressista.
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PT, PSB e PSOL convidam PDT, PCdoB e Rede para fortalecer bloco de Oposição a Bolsonaro na Câmara
Postado em 22 de janeiro de 2019
Em reunião nesta terça-feira (22), presidentes do PT, PSB e PSOL estiveram reunidos na Liderança do PT na Câmara para debater a criação do bloco dos partidos de Oposição na Câmara Federal. O grupo visa fortalecer a resistência que os parlamentares farão ao governo de extrema direita de Jair Bolsonaro e seus apoiadores no Congresso Nacional. A presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR), adiantou que o PCdoB, o PDT e a Rede serão procurados para integrar o “campo democrático-popular”, que se oporá aos retrocessos provocados pelo governo Bolsonaro.
Gleisi Hoffmann (PR) frisou a importância de unificar a oposição na conjuntura atual para atuar em defesa do povo brasileiro. “Tiramos o encaminhamento de convidar o PCdoB e a Rede para uma reunião, a fim de que se unam a esses três partidos [PT, PSB e PSOL] nessa organização aqui dentro da Casa”. A senadora ficou de conversar com o presidente do PDT, Carlos Lupi, e com Luciana Santos, presidenta do PCdoB. O PSOL, por sua vez, fará contato com a Rede, para convidá-los a compor o bloco. Outras forças de esquerda e de centro-esquerda também devem se juntar à resistência ao governo autoritário de Bolsonaro.
A deliberação da reunião, segundo a senadora, aponta que é fundamental fazer “o enfrentamento firme em relação ao governo Bolsonaro que já demonstra que não tem capacidade de sustentação, pelo que está acontecendo em relação ao seu filho [Flávio Bolsonaro] e seus envolvimentos”, relatou, ao se referir aos escândalos que atingem Fabrício Queiroz, ex-motorista do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).
O líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), disse que nesse momento que o país vive, em um cenário de perplexidade de agravamento das denúncias da família Bolsonaro com esquemas criminosos, “é muito importante sinalizar para a sociedade brasileira que existe dentro do parlamento uma Oposição independente neste momento”. Para Pimenta, “estar junto como PSOL e o PSB, sinalizando essa independência que não vamos apoiar Maia, é um sinal muito importante de um bloco que tem compromisso com a democracia, com a soberania e com o direito dos trabalhadores e das trabalhadoras. Isto é estratégico para o País”. Segundo o líder, PDT, PCdoB e Rede serão chamados para reforçar o campo democrático e popular. “Essa é a nossa centralidade nos próximos dias”, enfatizou.
PSB – O presidente do PSB, Carlos Siqueira, deixou claro que os socialistas não apoiarão a candidatura de Rodrigo Maia (DEM-RJ). “Não há a menor chance de o PSB se aliar a Maia. Ele é o candidato de Jair Bolsonaro. Vamos fazer um esforço conjunto para enfrentar o desastroso governo de Bolsonaro”, explicou. O PSB defende uma unificação da esquerda para lutar contra os retrocessos nas políticas sociais, as quais serão promovidas pelo governo federal.
PSOL – Conforme o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) a reunião do PSB, PT e PSOL consolida “uma visão do enorme desgaste que está tendo o governo Bolsonaro”. Valente diz que é necessário chamar o PCdoB e o PDT, aliados históricos, para o bloco. “Nossa agenda é contra os retrocessos civilizatórios nos costumes, e, particularmente, contra a agenda reacionária de retirada de direitos proposta pelo Paulo Guedes [ministro da Economia]. A proposta de conjugar todos os partidos de oposição e de esquerda é uma sinalização, simbólica, para a sociedade de que há uma grande resistência a esse governo”, avalia.
O deputado federal eleito Marcelo Freixo (PSOL-RJ) considera fundamental garantir a unidade do campo de esquerda, com PT, PSB, PSOL, PCdoB, PDT e Rede. Disse que sua candidatura à presidência da Câmara está colocada para o debate, mas que o mais importante é a unidade dos partidos de esquerda.
Participaram também da reunião o líder da Oposição na Câmara, José Guimarães (PT-CE); o deputado Carlos Zarattini (PT-SP); o presidente do PSOL, Juliano Medeiros; e o deputado Tadeu Alencar (PSB-PE).
Carlos Leite
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