Coluna Segunda Opinião
A democracia deve ir às ruas
Por Wanderley Guilherme dos Santos
Pelo tempo que existir, o próximo será um governo culturalmente tosco. Não basta a nulidade reconhecida do anunciado chefe da casa civil, a impostura de um anônimo Bebiano, agraciado com os despojos do toma lá dá cá de uma legenda sem destino, a truculência do futuro ministro da fazenda e a grosseria das manifestações orais do próprio clã Bolsonaro.
Era preciso adicionar ao espetáculo fantasmagórico um ministro das relações exteriores que se entusiasma com a confissão, por outras palavras, de ser um frankstein ideológico. Difícil interpretar como a Casa de Rio Branco concedeu-se o vexame de abrigar semelhante exemplar de talidomida diplomático. Mas, se o mundo não estiver ensandecido à la Trump, a Europa ocidental, os nórdicos, mais os russos e sobretudo a China se encarregarão de expulsá-lo do Itamaraty, já que os nossos não o fizeram.
Urgente compreender o que significa um governo de ocupação para o qual os discordantes são inimigos a serem vigiados e perseguidos. A regra do segundo turno ilude a governantes e governados de que se trata de um governo de maioria. Nunca foi, nem é. Os cerca de 58 milhões de votos dados a Jair Bolsonaro no segundo turno, correspondem a não mais do que a 41% do eleitorado total e a 28% da população. A maioria de 59% do eleitorado não o escolheram, sem mencionar a porcentagem dos que, na realidade, votaram contra Fernando Haddad. Dadas as regras, a eleição foi limpa e o mandato é legítimo, mas o governo não é da maioria mas, sim, deveria governar para a maioria. Com o que, a concepção brutamontes em cartaz discorda, mediante ameaças e promessas de vingança.
Consta que as OABs dispõem de sentinelas para acorrerem aos perseguidos e injustiçados. Pois é absolutamente vital que os profissionais não esperem pelas associações de classe, nem pelas burocracias partidárias em contínua disputa para controlar frentes que não terão fundo, só fachada. Essencial que grupos de médicos e médicas, enfermeiros e enfermeiras, assistentes sociais, psicólogos e, claro, advogados e advogadas, tomem a iniciativa de compartilhar o número dos celulares, endereços eletrônicos, turnos de receptores e distribuidores de mensagem, sem necessidade de hierarquia, documentos com bravatas ridículas ou relatórios para funcionários de partidos. Não custam nada, apenas tempo e disposição democrática, sem restrição de qualquer espécie. Importa a compromisso de atender aos ferimentos da democracia e dos democratas, ali onde necessário. E que os postos de recebimento de informações sobre atentados à democracia sejam largamente conhecidos e, assim, qualquer brasileiro ter a quem comunicar uma arbitrariedade que testemunhe.
Não existe nenhuma organização vigilante fascista no país e duvido que venha a existir. Mas, sem uniforme ou saudações fanáticas, bem que cada um de nós poderia funcionar como vigilantes da democracia. Não se iludam. Seremos necessários.