A candidata a vice na chapa derrotada no segundo turno, Manuela D’Ávila, na primeira entrevista concedida à grande imprensa após a eleição, antes mesmo que fosse perguntada, fez questão de elogiar a campanha de Ciro Gomes:
(…) O Ciro teve uma internet exemplar. Teve pouquíssimo tempo de TV, mas, mesmo assim, conseguia reverberar suas ideias. Ele não tinha essa guerrilha do submundo, da baixaria, dos milhões de reais que financiam os boatos.
Apesar de ter considerado um “equívoco” o não envolvimento de Ciro no segundo turno, a candidata não atribuiu a ele responsabilidade pela derrota. Ao contrário, Manuela disse que não fosse a “participação brilhante” do presidenciável no primeiro turno, não haveria segundo turno:
O Ciro teve uma participação brilhante no primeiro turno e ele foi quem viabilizou também, com seu elevado percentual de votos, o segundo turno. Ciro não contribuiu para nossa derrota. Ele contribuiu para a existência do segundo turno com a campanha que fez até o último dia em alta intensidade. Ele cometeu um equívoco em não se envolver no segundo turno.
Os elogios de Manuela a Ciro devem ser entendidos na conjuntura política. Seu partido, o PCdoB, está formando um bloco político na Câmara dos Deputados com o PDT e PSB, sem o PT, que foi convidado a se unir, mas sem papel de liderança no processo.
Por que isso?
Por que as mais importantes legendas de centro-esquerda deram esse passo para longe do PT?
Quem acompanhou o processo de formação de alianças no primeiro turno sabe o que se trata. O principal quadro do PCdoB, o governador Flavio Dino, junto com outros nomes na Executiva Nacional do partido, defendiam a unidade da esquerda, sob a liderança de Ciro Gomes, em função da impossibilidade de Lula ser candidato.
Em conversas reservadas, Dino assegurava que seus colegas governadores petistas também apoiavam a ideia pois tinham “juízo”.
A posição de Jaques Wagner, nome preferido de Lula para a cabeça da chapa petista, é mais que conhecida: o ex-governador e agora senador eleito sempre defendeu uma aliança do PT com Ciro Gomes.
A ideia de alguns setores do PT e do próprio ex-presidente de uma chapa Lula-Ciro (em entrevista ao Roda Viva, já no segundo turno, Haddad disse que defendia essa ideia) implicaria em enterrar o pedetista no mesmo buraco em que PT e Lula enfiaram Haddad no primeiro turno: tirando-o de entrevistas, sabatinas, debates, e transformando-o num outro “poste” do ex-presidente preso em Curitiba.
O candidato do campo popular precisava ser livre para participar do embate de ideias, e ao mesmo tempo ser visto como alguém independente, com visão própria, e não um preposto de outra liderança.
Segundo reportagem da Folha de São Paulo de 1º de agosto de 2018, assinada por Marina Dias, uma das principais jornalistas políticas da imprensa brasileira, o próprio ex-presidente Lula, da cadeia, articulou uma série de ações para isolar a candidatura Ciro Gomes.
(…) Lula mandou recados por interlocutores que o visitam frequentemente na prisão e deu aval para decisões terminativas da presidente de seu partido, Gleisi Hoffmann (PR), para pelo menos cinco atos que reverberaram contra Ciro: sinalizou com a vice do PT para Manuela D’Ávila (PC do B) no momento em que o partido era assediado pelo PDT; repreendeu governadores petistas que defendiam aliança com Ciro; assistiu ao PR, de Valdemar Costa Neto, levar o centrão para a órbita de Geraldo Alckmin (PSDB) ao invés de fechar acordo com o PDT (…)
Por fim, nesta quarta-feira (1º), Lula teve participação direta na negociação que neutralizou o PSB na eleição nacional, afastando-o definitivamente de Ciro Gomes.
A decisão final do PCdoB de formar chapa com PT foi tomada nas últimas horas do prazo do TSE para se registrar os nomes das chapas. Orlando Silva, candidato a deputado federal por São Paulo e membro da Executiva Nacional do PCdoB, postou algumas mensagens no Twitter, de que estava indo se encontrar com a Executiva do PT altas horas da noite para que ambos os partidos chegassem a uma decisão. O que houve naquela noite?
Ricardo Cappelli, homem forte do governador Flavio Dino em Brasília, publicou no dia seguinte um artigo doloroso, intitulado “Domingo Sangrento”, em que expunha as entranhas do que havia ocorrido. Trechos do artigo de Cappelli:
(…) Reviravoltas e viradas de mesa, coligações consagradas rompidas à canetada, candidaturas cassadas, convenção anulada na justiça, muitas ameaças e todo tipo de chantagem marcaram a batalha de domingo. Um cavalheiro pode virar um assassino cruel quando o assunto é poder.
Lula exerceu sua força, utilizou o nordeste como quartel general de suas tropas e impôs sua estratégia. Tem uma popularidade espantosa na região. Todos os governadores querem ou necessitam estar ao seu lado.
Ciro ousou questionar a linha definida pelo ex-presidente. Acabou isolado.
Carlos Siqueira, presidente do PSB, expôs a dureza da situação ao Estadão. Responsável pela decisão que retirou Marília Arraes do caminho do governador Paulo Câmara e decapitou Márcio Lacerda em Minas, Siqueira reclamou no jornalão do “sentido exclusivista do PT”.
Se não concorda, por que tomou a decisão de levar seu partido à neutralidade, esfacelando sua identidade nacional? Simples. Emparedado por Lula, não lhe restou alternativa.
O PCdoB viveu situação semelhante. O partido lutou pela unidade. Tinha como resolução a construção de uma Frente Ampla. Acabou compondo uma “frente” com o PT, o PROS e o exótico PCO.
Os comunistas, premidos pelo fantasma da cláusula de barreira e pela força de Lula no nordeste, foram alvo de artilharia de toda sorte. Acabaram obrigados a cuidar da própria sobrevivência apostando na “unidade possível” com as melhores condições para seus objetivos partidários. Tudo legítimo e compreensível.
No recuo imposto, um feito. A vice de Haddad para Manuela, quando Lula for impugnado. O PT não admite que um não petista fale como vice do ex-presidente.
Com movimentos em direção a Ciro e candidatura própria, PSB e PCdoB não agiram por “antipetismo”. Partiram de uma leitura da conjuntura. A mesma que orienta o PDT.
Acreditavam que alguém de outra sigla, com o apoio do PT, teria mais chances. Não estiveram sozinhos nessa jornada. Vozes como Jaques Wagner, jornalistas progressistas, intelectuais e governadores do PT se levantaram na mesma direção.
O que houve de quarta feira para cá? Mudaram de opinião? Não. Acabaram todos subjugados pela impressionante força de Lula.
Para o PDT, o PCdoB e o PSB fica uma lição. Isolados jamais conseguirão liderar um projeto nacional. O PT prefere correr o risco de perder liderando do que ganhar liderado. É legítimo que pense assim. Provou ter força suficiente para impor sua vontade, qualquer que seja ela.
Lula dobrou a esquerda. Terá que provar que, com uma aliança esquálida, preso em Curitiba, consegue repetir a “fórmula Dilma” e levar o ex-prefeito de São Paulo ao Palácio do Planalto. Se obtiver êxito sairá de vez da vida, vivo, para virar uma lenda, um mito.
Se falhar, as gotas de sangue do “domingo sangrento” continuarão a pingar, infelizmente, por um longo tempo.
Abaixo, a íntegra da entrevista de Manuela:
No O Globo
‘Ciro não contribuiu para nossa derrota’, diz Manuela D’Ávila
Candidata a vice na chapa de Fernando Haddad, a deputada do PCdoB reconhece que aliados subestimaram a capacidade eleitoral de Bolsonaro
Por Catarina Alencastro
02/11/2018 – 15:57 / 02/11/2018 – 19:46
BRASÍLIA — Em sua primeira entrevista após a derrota na corrida presidencial, Manuela D’Ávila (PCdoB), vice do petista Fernando Haddad, reconhece, ao GLOBO, que os partidos de esquerda subestimaram o potencial eleitoral de Jair Bolsonaro no segundo turno. A deputada estadual diz que a campanha petista conseguiu estabelecer uma forte conexão com as ruas na reta final da corrida ao Planalto, mas considera que tanto ela quando Haddad deveriam ter retomado a campanha de rua mais cedo após o primeiro turno.
Ao avaliar o comportamento do presidenciável do PDT, Ciro Gomes, no segundo turno, Manuela afirma que foi um “equívoco” o pedetista não ter se engajado na campanha de Haddad. Antecipar a disputa de 2022, diz, é “não compreender a necessidade de estarmos unidos”.
Manuela é mãe de uma menina de dois anos, que viajou com ela a 19 estados durante o processo eleitoral. Nos primeiros compromissos de campanha, ainda amamentava. Ela diz que sua maior contribuição nas eleições foi “mostrar que as mulheres que são mães podem ocupar os espaços públicos”. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Qual é o balanço da eleição?
Foi um processo cheio de particularidades. Teve um desfecho de uma mobilização social muito impressionante, muito bonita. O engajamento de pessoas sem nenhum partido, que nunca tinham se engajado, em defesa de causas muito valiosas, como a democracia e a liberdade. O resultado tem relação com muitos fatores. Lá atrás, em novembro do ano passado, já defendíamos, no PCdoB, uma união de esquerda mais ampla. No final, o desfecho popular foi a construção da unidade que nós não conseguimos fazer nos partidos. Fiz um esforço lá atrás muito grande, dizendo que a unidade não era uma bandeira, que deveria se materializar na prática. E na prática a única que deixou de ser candidata fui eu, o que várias vezes foi criticado de forma machista dizendo que foi um gesto de submissão.
Por que não foi possível construir uma frente ampla de partidos de esquerda?
Os partidos têm as suas posições, que não são incorretas, são as que melhor representam o conjunto da sua militância, mas não tinham a avaliação exata do perigo que representava o adversário. Vários partidos subestimaram a hipótese de o Bolsonaro ir para o segundo turno. Esse nunca foi o meu caso. Eu, desde 2014, voltei para Porto Alegre muito por causa disso. Já percebia que havia uma mudança no tecido social, e que essa mudança teria impactos no processo eleitoral. Há bastante tempo eu dizia que o Bolsonaro era um candidato bastante forte. Quando tu faz essa avaliação, é mais fácil tirar as consequências dela. Se tu acha que esse cenário não é o mais provável, é mais fácil cometer o erro de lançar candidatura e achar que a unidade não é algo tão importante.
Quais foram os principais erros da chapa?
O erro geral foi subestimar o esquema de difusão de mensagens falsas pela internet e o incremento do uso do WhatsApp. Foi um erro não imaginar que esse mecanismo teria um impacto tão intenso na sociedade. Havia a ideia de que as eleições seriam como todas de 1989 para cá. Especialmente na comunicação, que era o formato de grandes partidos, tempo de TV e campanha de rua. Teve quem apostou em TV e partidos, e quem apostou em rua e Internet. O Ciro teve uma internet exemplar. Teve pouquíssimo tempo de TV, mas, mesmo assim, conseguia reverberar suas ideias. Ele não tinha essa guerrilha do submundo, da baixaria, dos milhões de reais que financiam os boatos.
A senhora enxerga erros do PT nesse processo?
Qual a chapa que representava mais renovação do que a nossa? Uma chapa representada por uma mulher com uma trajetória construída sozinha no movimento social e por um professor, que não é um político tradicional. E a questão da temporalidade do lançamento da candidatura do Haddad entra num campo de hipóteses que não têm como serem aferidas. Porque a força do presidente Lula é real, ele era o primeiro colocado nas pesquisas até o dia 17 (de setembro), até ser oficialmente retirado. E a transferência deu certo, nós chegamos ao segundo turno. Muitos diziam que nós não chegaríamos a quatro pontos. O resultado foi positivo.
O quanto a figura do Lula preso prejudicou?
A rejeição do Haddad cresceu em função de uma campanha difamatória que sofremos pela internet, que envolveu milhares e milhares de pessoas. Avaliar a partir de programas de TV o que foi feito, o que foi dito, é não perceber o que aconteceu no processo eleitoral. A TV contou tão pouco que nosso adversário não teve a hombridade de debater e isso não pesou contra ele. Atribuo a rejeição às mentiram bárbaras que foram pregadas. Às vezes tenho a impressão de que as pessoas não têm noção da amplificação que tem uma mentira na internet: 70 perfis que publicaram notícias falsas sobre mim foram compartilhados 300 mil vezes e somam 13 milhões de visualizações. A gente está falando de uma audiência gigantesca.
O PT foi muito cobrado por fazer a autocrítica pelos erros cometidos, o que não aconteceu.
O (governador do Maranhão) Flávio Dino falou uma vez que autocrítica é algo que se faz na prática. E vários pontos foram incorporados pelo programa de governo. Um deles, que conversei com Haddad, era a ausência de incorporação de mecanismos de controle pelas estatais, mecanismos que existem nos ministérios. Isso na prática é uma autocrítica.
O que deveria ter sido feito diferente?
Avalio que a frente ampla deveria ter sido construída. Fiz o que estava ao meu alcance para isso. Acredito que nós, no segundo turno, vimos que havia muita vontade do povo brasileiro de se engajar no processo eleitoral a nosso favor, mas isso aconteceu sobretudo nos últimos dez dias. Acho que a gente poderia ter ido para a rua ainda antes.
O PDT tem dito que não estará ao lado de PT e já começa a se movimentar para 2022.
A primeira coisa que temos que fazer é ouvir o recado das ruas, dos brasileiros e brasileiras que estiveram conosco especialmente no segundo turno. Quero estar com eles. Fazer a disputa de 2022 ou de qualquer coisa que o valha ou de hegemonismo de um partido sobre esse processo é não compreender a necessidade de estarmos unidos para garantir que as liberdades individuais sejam garantidas e a Constituição, resguardada. Todas as outras questões são menores.
O Ciro contribuiu para a derrota de Haddad?
O Ciro teve uma participação brilhante no primeiro turno e ele foi quem viabilizou também, com seu elevado percentual de votos, o segundo turno. Ciro não contribuiu para nossa derrota. Ele contribuiu para a existência do segundo turno com a campanha que fez até o último dia em alta intensidade. Ele cometeu um equívoco em não se envolver no segundo turno.
Na reta final, Mano Brown disse que o PT perdeu a conexão com as ruas. Concorda?
Sim. Não o PT, o foco no PT é errado. Vários segmentos do setor democrático e progressista se descolaram, e a maior parte dos que votaram escolheu o nosso adversário. Não há prova maior do que o resultado das urnas. Se estivéssemos, como campo político, mais próximos da população, isso teria sido mais difícil de acontecer. Claro que a crítica do Brown é válida. Tanto que ele fala explicitamente da comunicação. Se você pensa a campanha a partir da TV e hoje um youtuber tem uma influência maior do que qualquer apresentador de televisão, tem uma dessintonia.
A esquerda vai ter que passar por uma correção de rumos?
A reta final do segundo turno já corrigiu o nosso rumo. É esse o rumo que temos que manter. De muita unidade popular, de uma militância na rua, ouvindo as pessoas, conversando. O movimento de virada de votos foi isso. Um movimento de humildade, de ir, de ouvir, de estabelecer laços, de ser mais compreensivo, de ouvir sobre os equívocos. A reta final para mim é a nossa nova posição.
Qual deve ser o papel do Haddad agora?
Ele vai voltar a dar aula, é o que ele faz, é o que ele fez quando saiu da prefeitura de São Paulo. Mas ele é o grande líder da oposição do Brasil hoje. Esse é o lugar em que a sociedade o colocou. Não sei como ele vai ocupar, não conversei com ele sobre isso. Ele voltou para São Paulo e voltei para Porto Alegre para marcar a banca do meu mestrado.
E a senhora?
Estou terminando o mestrado. Terminei durante a campanha, entreguei minha dissertação no dia do debate da Record, 30 de setembro. Agora só tenho que marcar a banca. Mas vou continuar militando, é o que faço a minha vida toda. Vou trabalhar na área de políticas públicas, sou jornalista, e vou continuar militando. O Brasil precisa que nos organizemos para dar um salto na nossa democracia.
A senhora manifesta muita preocupação com a disseminação de fake news.
Em 2015, vivi o que são as redes de mentira e já alertava que existiam grupos com financiamento não declarado, por não se tratarem de partidos, que construíam essas mentiras potencializadas pelas redes sociais. Para mim, tem um episódio que foi muito emblemático. Minha filha nasceu em agosto de 2015. Antes disso, viajei com meu marido para ele finalizar um disco e pedi uma licença atípica na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul – era uma licença em que eu tinha todos os dias (de salário) descontados. Eu estava grávida. E, por alguma razão, inventaram que eu tinha feito o enxoval em Miami. Eu não conheço Miami. Achei graça. Quando me dei conta, nas redes sociais o debate que começou é se eu tinha direito de fazer um enxoval em Miami ou não. Ou seja: a mentira deu lugar a um debate de pós-verdade.
E a senhora não conseguiu desmentir essa informação?
Nunca ninguém parou para me perguntar se eu tinha feito. Não conheço Miami. Aquilo foi emblemático. Logo depois que a Laura nasceu, ela tinha dois meses, eu tava num show do meu marido e uma mulher me agrediu e acabou agredindo minha filha, que estava presa a mim. A mulher me bateu perguntando se eu tinha comprado o sling (pano com o qual a mãe amarra o bebê em seu corpo) em Miami. Eu tinha que ter comprado em Cuba, porque eu era comunista. Aí me dei conta de que, primeiro, existia alguém que financiava a amplificação da mentira. Porque não existe isso, de um país inteiro debater a falsa compra de um falso enxoval feita numa cidade que eu sequer conheço. Isso não acontece de graça. E, segundo, que o ódio das redes foi para as ruas, porque, se alguém tem coragem de bater num bebê de dois meses… Ali me dei conta da estrutura.
Como foi disputar a eleição com um bebê?
Foi lindo o nível de afeto que a campanha promoveu. Recebi declarações de mulheres, mães, o tempo inteiro. Isso foi muito forte e estimulante. Quando comecei a fazer a minha pré-campanha, a Laura ainda era amamentada e eu não sabia como ia ser, e tinha que levá-la comigo. E muitos questionavam: como assim, ela vai com a criança? Tenho uma filha de dois anos, e não aceito mudar como a educo. Foi algo que, no início, era uma imposição minha, em função da necessidade. E teve uma transformação. A primeira vez que vi isso foi quando desci no aeroporto, em Minas, e a Jô Moraes tinha organizado uma comitiva mirim. Todos os militantes que tinham filhos da idade da Laura levaram os filhos para acompanharem a agenda do dia inteiro. Foi a cena mais emocionante, porque vi que tinha virado um disco. E talvez tenha sido o que de mais importante fiz nesse processo eleitoral: mostrar que as mulheres que são mães podem ocupar os espaços públicos. Porque os espaços públicos nos são tirados quando somos mães de crianças. Por outro lado, por causa dela, mais me impactava a violência que eu sofria.
Qual foi o pior momento da campanha?
Não consigo compreender que tipo de gente faz uma mãe com uma criança no colo ter medo, como alguém consegue gritar com uma mulher com uma criança no colo. O pior momento de toda a eleição foi um dia em que eu estava num hotel em São Paulo tomando café com a Laura e uma mulher começou a gritar coisas horrorosas para mim, e achei que ela ia me bater. E eu não conseguia responder, fiquei com o meu corpo na frente do corpinho dela, com medo de que a mulher batesse nela. E quando a mulher foi embora, eu não sabia o que fazer, pensei em chamar a polícia, pensei no circuito de câmera para identificá-la, porque tinha uma menor junto. E a Laura só me abraçou e falou: “o pão de queijo desse hotel é o melhor de todos, mamãe, fica tranquila”. Faço política desde os 16 anos e nunca vi as pessoas se odiarem tanto por pensarem diferente. Nunca vivi isso. E muito menos com aquilo que é o mais sagrado, que é a maternidade. Então a dor e a delícia de ser quem sou foi isso.
Teve que repensar sua segurança?
Esta foi a sétima eleição que disputei. Nunca tinha mudado a minha rotina. Ando muito a pé em Porto Alegre, quase não dirijo, faço feira toda semana, inclusive com a Laura, nunca deixei de fazer. E nessa reta final da campanha, pela primeira vez na vida, comecei a andar com segurança o tempo inteiro. E fiz pela minha segurança, pela Laura e pelo Guilherme, meu enteado de 15 anos. Quem é político e tem visibilidade te não tem como tirar a camiseta ou o adesivo. A gente é o adesivo. Comecei a andar mais de carro, a andar menos sozinha e passei a andar com o pessoal que trabalha comigo. Mudei bastante. Fui obrigada a fazer porque o nível de violência e beligerância que tomou conta da sociedade brasileira foi muito grande.
O que a senhora espera do governo Bolsonaro?
Torço e desejo profundamente que ele cumpra, e que zelemos todos juntos, pelo texto da Constituição, que é o uniu o povo brasileiro depois de anos muito difíceis que vivemos. É por isso que vou trabalhar.
O que achou do fato de o juiz Sergio Moro ter aceitado o convite para o Ministério da Justiça?
Ao aceitar o convite para ser ministro da Justiça, Sergio Moro decide finalmente tirar a toga para fazer política.
Em 2022 você e Haddad reeditarão essa chapa para a Presidência?
Não sei, vou ser uma quarentona em 2022. Torço para que a gente consiga ter comigo, com Haddad, com Ciro, com Boulos e com centenas de novas lideranças que o Brasil tem um campo mais amplo. Seguirei sendo uma batalhadora dessa ideia: para mim a unidade é o caminho da vitória do povo, sempre.