Denise Assis-jornalista –
Passo diante de um comitê do candidato Jair Bolsonaro (PSL). Sim. Tenho dificuldade de escrever este nome, mas é o nome dele, fazer o quê? Estive fazendo comprinhas na rua Halfeld, a mesma, em Juiz de Fora(MG), cenário da tal facada que levou o candidato ao segundo turno, e promete levá-lo à presidência, a persistir os seus índices nas pesquisas.
Da potente caixa de som que chama a tenção dos transeuntes saem os versos de “Eu te amo meu Brasil”, da dupla Dom e Ravel. A primeira reação é de incredulidade. Não. Eu não estou ouvindo isto. Mas a potência do som não permite que eu me iluda. Sim, aquela duplinha intragável está novamente a nos impingir os seus versos pobres, de melodia chiclete, fartamente usada pela ditadura civil-militar, inclusive em sessões de tortura, como relataram vários ex-presos políticos.
Foi como entrar no túnel do tempo. Tão assustada fiquei que olhei à volta para conferir em que tempo estava.Os trajes eram contemporâneos, portanto, eu não podia estar deslocada na época ou tampouco numa viagem ao ano de 1970, quando os artistas lançaram a canção que embalou a vitória da seleção canarinho.
Ambas foram fartamente usadas pelo ditador da vez: Médici, o verdugo. A música e a seleção. Toda bandinha de interior que se prezasse tinha em seu repertório o sucesso de Dom e Ravel para as solenidades militares, desfiles cívicos e alvoradas em dias santos.
Uma leve tontura me fez parar diante de uma vitrine repleta de calçados modernos, para organizar a respiração. (Não, não era pesadelo). Sim. Os versos de “Eu te amo meu Brasil” invadiram o meu presente e ameaçavam o meu futuro. Era como se me antecipassem o que virá, se porventura aquele senhor chegar lá, com o seu ministério fardado.
Viveremos novamente ao som de hinos marciais e musiquinhas de quinta categoria, de caráter apologético às riquezas de um país que empobreceu. Um dos versos da melodia infame, de terríveis lembranças, diz: “a mão de Deus abençoou/ Em terras brasileiras vou plantar amor”…
Deus, falando sério, acho que você errou. Em vez de amor, plantou o ódio. Deu tudo errado, meu caro. Só lançando mão de outro sucesso da época, em que o compositor e cantor Antônio Marcos falava do seu filho. Nela, ele pediu: “vem meu amigo volte logo/ Venha ensinar teu povo/ Que o amor é importante/ Vem dizer tudo de novo”. Não sei se não seria mais importante um curso intensivo de política, ética e civilidade. Mas, por favor, caso ele tope vir, diga a ele que se apresse. Faltam poucos dias para o juízo final.