Hugo Sales Corrêa: Mais uma opinião sobre Haddad X Ciro

Caro Miguel,

Por questão de sanidade mental preciso liberar angústias e energias acumuladas ao assistir o que hoje acontece no Brasil.

Ofereço a você e as seus leitores, caso julgue relevante, as minhas humildes reflexões. Não posso afirmar que o que escrevo aqui é isento de um viés pessoal e é uma análise qualificada, porque me falta tanto preparo quanto paz de espírito para tal. Mas aqui vai:

Primeiro, se deve esclarecer o que há de comum entre Haddad e Ciro:

1. Programa Emergencial para Geração de Empregos: Retomar obras paradas e aquecer o setor de construção civil, que depende pouco de importação e faz uso de mão de obra de baixa qualificação.
2. Programa relativo ao crédito das Famílias: Aquela coisa toda do SPC, em que as pessoas já deveriam estar carecas de saber como é.
3. Revogação do Teto do Gastos e da Reforma Trabalhista.
4. Retomada do Pré-Sal e fortalecimento da Petrobrás: Nesta questão me preocupa a atitude cautelosa e ponderativa de Haddad, onde deveria ser mais enérgica e dura. Haddad também parece ter desistido da Embraer.

Os itens acima já dão muito o que fazer para um governo de quatro anos e assinalam um fim da nossa masoquista fase de austeridade e entreguismo. Portanto, supondo mobilização política das massas e autoridade no executivo, não me preocupa muito a escolha entre os dois.

O que me preocupa é exatamente esta suposição de mobilização, para ambas as escolhas.

Afirmo, ao interpretar André Singer, em seu diagnóstico de muita clareza (espero não distorcer suas palavras aqui): O Lulismo é uma política de não-enfrentamento, que é portanto, despolitizadora das próprias massas que ao PT deram o poder.
Tanto uma decisão marqueteira quanto uma abertura à psique coletiva do apoio orgânico ao PT, a frase da campanha é: O Brasil Feliz de Novo. Será que as premissas para o Brasil Feliz de outrora se configuram da mesma forma hoje?

Ciro também preocupa nesse quesito, já que se encontra com apoio diminuto de forças partidárias e tem pouca presença popular. Será que por si só, a mensagem do Novo Desenvolvimentismo chegará aos corações das pessoas, já ocupados por medo da violência e repulsa da política? A própria campanha de Ciro avalia que não e decide intensificar críticas ao PT (merecidas ou não) e apostar na mensagem de propor uma salvação de uma polarização odienta (real ou não).

Hoje o medo se instala nos progressistas e moderados com a escalada da extrema direita. Ciro periga se juntar à plateia da corrida eleitoral, onde já se encontram Alckmin e Marina. Haddad e os nossos compatriotas petistas recebem a inegável mensagem do antipetismo evidenciada pelas duas últimas pesquisas. Será que o gênio político Lula perdeu a precisão nos cálculos ao ser privado de acesso direto à dissonância de sinais da realidade brasileira? Será que houve um tropeço na dança à beira do abismo?

O que é certo é que não se pode culpar só o PT pelo Bolsonaro, que nada mais é que uma resposta tosca e contraditória às limitações do capitalismo globalizado e financeirizado. A tragédia é que, na conivência da esquerda, a nossa voz perdeu a força para responder em nome do nosso povo.

Qual é o vencedor que trará o povo de volta para o jogo da democracia? É o candidato que quer o Brasil Feliz de Novo ou é o candidato em que todos discordam em algo, mas que poucos fecham os ouvidos às suas propostas, já que não há ódio nem amor?

Atenciosamente,
Hugo Sales Corrêa

Mestrando do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação
COPPE, UFRJ

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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