Denise Assis*
Cinquenta anos depois, o discurso de Caetano Veloso, no Teatro da Universidade Católica de São Paulo (TUCA), na fase nacional do III Festival Internacional da Canção (1968), soa estranhamente atual. Por que será que as frases proferidas aos gritos, por Caetano, em 15 de setembro daquele ano, nos soam oportunas?
“Vocês estão por fora! (…) Mas que juventude é essa? Que juventude é essa? Vocês jamais conterão ninguém. Vocês são iguais sabem a quem? São iguais sabem a quem? (…) Vocês são iguais sabem a quem? Àqueles que foram na Roda Viva e espancaram os atores! ! Vocês não diferem em nada deles, vocês não diferem em nada.”
Para melhor aproximar aqueles fatos, convém relembrar o momento em que Caetano entrou no palco e, com sua figura “fora do padrão”, foi recebido com a ferocidade dos que cobram “costumes”, cobram “postura”, destilam moralismo.
A cena foi magistralmente descrita em uma crônica contida no livro “A Cabra Vadia”, de Nelson Rodrigues. Qualquer semelhança com os tempos de 2018, pode não ser mera coincidência.
“A vaia selvagem com que o receberam já me deu uma certa náusea de ser brasileiro. Dirão os idiotas da objetividade que ele estava de salto alto, plumas, peruca, batom etc. etc. Era um artista. De peruca ou não, era um artista. De plumas, mas artista. De salto alto, mas artista. E foi uma monstruosa vaia (…) Era um concorrente que vinha ali, cantar; simplesmente cantar. Mas os jovens centauros não deixaram”.
Algo me diz que o autoritarismo da época ronda os tempos atuais, e fazem ecoar em nossos dias as palavras do artista. É possível que os centauros – criaturas com cabeça, braços e dorso de um ser humano e com corpo e pernas de cavalo, e que simbolizavam a força bruta, insensata e cega – estejam de volta.
Por isto, precisamos mais que nunca ter em mente as palavras de Caetano Veloso:
“Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?(…) “Vocês não estão entendendo nada, nada, nada, absolutamente nada.”
* Jornalista
frederico costa barros
19/09/2018 - 19h28
Aquela juventude é hoje a classe média que saiu as ruas para depor a Dilma e ter ódio pelo PT. Eles continuam não entendendo NADA!!!! Continuam iguais aos jovens que eram e repassam isso aos filhos, a coisa se perpetua.
Carlos Valentin
19/09/2018 - 15h39
A cidade e o estado de São Paulo são os mais coxas, mais reaças, mais golpistas e os mais preconceituosos de toda a federação.
Francisco
19/09/2018 - 11h32
Sem aspas…, então explica, pois continuo não entendendo nada em relação ao escrito, pois fora do contexto, leia Izaías, o comentarista, acima, que permite-me parar por aqui.
Izaías Almada
19/09/2018 - 10h44
Com todo o respeito à jornalista autora do artigo, devo lembrar que a fala de Caetano, em contexto totalmente diferente daquele do que se passa hoje, foi dita para uma juventude antifascista na sua base.
Caetano, que entende bem de Narciso, não se conteve por receber vaias de um público que supunha fiel a ele.
Comparar o público do Tuca à juventude fascista de hoje é também não refletir sobre dois momentos históricos antagônicos. Há uma parte da juventude de hoje que quer a volta dos militares e os jovens que vaiaram Caetano, em sua maioria, lutavam contra a ditadura.
São, por vezes, pormenores que não ajudam ao entendimento da luta de emancipação do povo brasileiro que luta desde a colonização portuguesa e ao regime escravista (por sinal o último a desaparecer na Historia) cujo sentido de submissão cultural perdura até os dias de hoje.
Paulo Figueira
19/09/2018 - 13h43
Você esclareceu os acontecimentos, parece que a autora do post desconhecia a circunstância em que se deu a vaia a Caetano.
frederico costa barros
19/09/2018 - 19h36
Como já disso em um post aquela juventude é hoje a classe média paulistana na faixa dos 60 anos que saiu sim as ruas, pedindo a volta dos militares e que passaram isso aos filhos. O fato de serem contra a ditadura não quer dizer que tivessem um visão de esquerda.
Nilson Messias
19/09/2018 - 09h09
Politicamente, a contribuição de Caetano Veloso, até hoje, é estética. É da turma do Zé Padilha, Wagner Moura, Paula Cifrão Lavigne, Marcelo freixo, Marcelo Serrado e outros “combativos”.
Francisco
19/09/2018 - 02h30
São Paulo, lamentável e paradoxalmente, parece ser uma cidade visceralmente provinciana.
Ter proibido Haddad de fazer campanha na TV (o ovo da serpente?) para eleger o “cosmopolita” Doria, para mim, foi a certeza lavrada em cartório: São Paulo é terra de tabareu complexado. ..
Paulo
18/09/2018 - 23h03
Artista tem que estar preparado pra tudo. Talvez não tenha havido autoritarismo, como citado, mas, simplesmente, conservadorismo. São Paulo era – e pra muitos ainda é – uma cidade conservadora. Lembro-me de um episódio da minha infância, no início dos anos 70, em que um baiano que tinha mudado recentemente pro nosso bairro deu pra sair de mulher no carnaval. Foi escorraçado…