Pelo andar da carruagem, a cada pesquisa que for divulgada se seguirão acalorados debates no campo da esquerda sobre quem é o melhor candidato para enfrentar o representante do capital – provavelmente Bolsonaro – no segundo turno.
Tal debate pode ser absolutamente saudável, se se der em alto nível e não desviar demasiadamente o foco dos nossos adversários em comum, os inimigos dos trabalhadores e do próprio conceito de nação brasileira.
Não esqueçamos que estaremos todos juntos no segundo turno e, em caso de vitória, no governo. Como lembrou algumas vezes Guilherme Boulos, deixemos o pensamento único para a direita.
Este colunista acredita que a melhor opção para o campo progressista é Ciro Gomes. Isso não significa, por óbvio, não reconhecer os feitos do PT no governo e o peso de Lula, o maior líder popular do país e presidente mais bem avaliado da história, no processo eleitoral.
Dito isto, passemos ao saudável debate.
Um dos vários motivos que me leva a crer que Ciro é o melhor nome para fazer frente ao golpe é o seu estilo combativo.
Ontem, em sabatina realizada por O Globo, Época e Valor Econômico, Ciro detonou o general Hamilton Mourão, candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, chamando-o de “jumento de carga”. O general havia feito, após afirmar, tresloucadamente, que tinha certeza que o autor da facada em Bolsonaro era do PT, a seguinte ameaça explícita: “Se querem usar a violência, os profissionais da violência somos nós”.
Ciro foi o único candidato que reagiu energicamente às declarações bizarras de Mourão, inclusive provocando-o com um “Vem, general (fazendo o gesto de chamar para a briga com as mãos). Jumento de carga!”.
Diante da naturalização do fascismo e do assanhamento de golpistas como o general, é evidente que o campo democrático deve subir o tom e não admitir esse tipo de arreganho autoritário, como bem fez o pedetista.
Um parêntesis surreal: o general Mourão disse que “não admite baixar o nível da campanha” e que Ciro “não tem argumentos” e por isso “parte para a ofensa”. Mourão defende a possibilidade de um golpe militar e se definiu como “profissional da violência”, mas é Ciro, extremamente preparado intelectualmente, quem não tem argumentos. Nem o general deve acreditar no que diz. Fecha parêntesis.
Haddad, por sua vez, a despeito de ser também um intelectual de respeito, é um dos quadros mais moderados do PT, que é um partido moderado em vários aspectos. É claro que o golpe e a radicalização da política vêm empurrando a agremiação para uma postura mais combativa – o que é ótimo.
Entretanto, dois trágicos episódios recentes demonstram que o PT e Haddad terão que dar um giro de 180 graus na sua postura – deixando a polidez, a elegância, o “republicanismo” e a apatia de lado – para ter condições de fazer frente à sangrenta guerra que temos pela frente. Tanto no impeachment quanto na derrota de Haddad na eleição municipal de 2016, faltou combatividade e assertividade no enfrentamento com a direita – atributos que sobram em Ciro Gomes.
Uma entrevista de Haddad ao Estadão, no dia 10 de agosto de 2016, pouco antes das eleições municipais e da consumação do golpe (Dilma foi definitivamente afastada da presidência no dia 31 daquele mês), ilustra bem este ponto. Haddad disse que “golpe é uma palavra um pouco dura” e que “não me parece de bom tom o que está acontecendo: um vice se insurgir contra a cabeça de chapa”.
Enquanto isso, Ciro chamava o golpe de… golpe e a parceria entre PMDB e PSDB, urdida para derrubar Dilma, de “sindicato de ladrões”. Cunha era definido como o picareta-mor da nação, marginal e vagabundo. Para Temer, além de ladrão e corrupto, Ciro reservou, em ao menos uma oportunidade, o carinhoso epípeto “conspirador filho da puta”.
Peço perdão aos leitores mais sensíveis do Cafezinho pelo palavrão – e às putas também – mas creio ser importante demonstrar a diferença do tratamento dado aos conspiradores por Haddad e por Ciro.
Golpe não é uma palavra nada dura para a derrubada ilegal de uma presidenta eleita – é a única adequada, na verdade. As atitudes de Temer são muito melhor definidas como as de um “conspirador filho da puta” do que com um “não é de bom tom”.
Esse ímpeto de Ciro – o de chamar as coisas pelo que elas são – é absolutamente necessário para esclarecer a população sobre quem são os inimigos dos trabalhadores.
Ainda mais quando temos uma mídia que monopoliza o debate político e busca pasteurizá-lo, escondendo golpes, saques ao país e canalhices em geral atrás de ternos bem alinhados e postura e vocabulário impecáveis.
Eis um dos motivos – dentre outros – pelos quais Ciro Gomes parece ser o melhor nome para enfrentar o trator golpista: sua combatividade invulgar.