Alckmin corre risco de “cristianização”, diz colunista da Piauí

Trecho de coluna de José Roberto Toledo, na Piauí:

(…) O petista é líder isolado em 20 colégios eleitorais. Lula ganharia no primeiro turno em todos os estados do Nordeste, além de no Tocantins. Sua maior vantagem está no Piauí, onde tem 57 pontos a mais do que Bolsonaro. Fora essas unidades da Federação, ele está tecnicamente empatado com o rival no Paraná, Goiás e Rondônia. Lula só perde para o candidato do PSL em quatro lugares: Roraima, Acre, Distrito Federal e Santa Catarina. No primeiro, a crise de refugiados provocou uma onda de xenofobia. Os dois últimos têm duas das maiores rendas per capita do país.

Nada se correlaciona mais com o voto em Lula do que o voto em Bolsonaro. Correlação negativa: onde um cresce o outro míngua. São os dois polos de um mesmo fio desencapado, à espera do curto-circuito. Nenhum dos outros onze candidatos a presidente têm uma ligação tão forte entre si – seja estatística, seja política. Sem ordem de prisão, o segundo turno seria entre Lula e Bolsonaro. Não há margem aritmética para outro resultado.

Ainda assim, a polarização soa fantasiosa. Lula está preso em Curitiba e não deve sair de lá nem para votar, quanto mais para ver sua foto exibida na urna eletrônica. É o grande elefante branco do pleito: a um só tempo, líder absoluto e inelegível, principal alto-falante e mudo, um articulador do próprio ócio.

Se os analistas damos essa situação de barato, para grande parte do eleitorado ela não é nada óbvia. No cenário em que o Ibope testou Haddad no lugar de Lula, o eleitorado sem candidato saltou 14 pontos na média ponderada das 27 pesquisas. A cada três eleitores, um não sabe em quem votar, diz que anulará ou votará em branco se o líder das pesquisas ficar fora do páreo. Mas essa média tem os pés na geladeira e a cabeça no forno.

Entre os extremos, a diferença supera 100%. No Rio Grande do Norte, a maioria absoluta, 51% dos eleitores, fica sem candidato quando Lula sai. No Acre são só 22% de branco/nulo e indecisos.

Esse exército de órfãos do lulismo se dispersa também entre os outros concorrentes. Ciro dobra de 5% para 10%; Marina pega 6 pontos em ex-lulistas e vai a 13%. Bolsonaro ganha dois pontos e chega a 21%; Alckmin ganha igual e bate em 8%. A ausência forçada de Lula produz saldo negativo para o tucano, entretanto. Enquanto Haddad patina nos 4%, Alckmin vê Marina abrir vantagem além da margem de erro em relação a ele. Mais: fica atrás de Ciro numericamente e não diminui sua distância de Bolsonaro.

Só resta ao tucano rezar a Santa Clara, padroeira da tevê, para que os 434 spots de 30 segundos a que ele terá direito a partir de amanhã mudem drasticamente o cenário eleitoral. É propaganda para santificar qualquer pecador: a cada quarenta inserções desse tipo, Alckmin aparecerá 39 vezes contra uma única aparição de Bolsonaro – seu alvo e concorrente pelo voto antipetista. A santa terá apenas duas semanas para operar seu milagre, porém.

Se Alckmin não reagir até o final da rodada de pesquisas Ibope e Datafolha a ser divulgada entre 6 e 18 de setembro, aumenta exponencialmente seu risco de cristianização. A expressão já tem 67 anos e pode levar os mais novos a confundirem Cristo com Cristiano (Machado), mas o resultado é o mesmo: os Judas entre apoiadores do tucano abundarão se ele não crescer logo – ou se, no mínimo, não conseguir desgastar Bolsonaro. Não é fácil, porque o rival não depende apenas da propaganda para aparecer.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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