“Algum dia, em qualquer parte, em qualquer lugar indefectivelmente te encontrarás a ti mesmo, e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga de tuas horas.”
Após o show de bizarrices com Jair Bolsonaro ontem, no programa Roda Viva, Neruda falaria que a direita brasileira se encontra em horas de grande amargura.
Primeiramente, vale ressaltar que a bancada da mídia golpista colocou seu arsenal para tentar desconstruir o segundo colocado nas principais pesquisas eleitorais. Não coincidentemente, Veja e Época começaram a semana com ataques que o sempre preciso Fernando Brito chamou de primeiro comando do Chuchu.
Em segundo lugar, a atuação da tropa de choque do establishment foi um desastre. Todos os jornalistas, em algum momento, bateram boca com Bolsonaro. Se o MBL foi forjado na guerra, Bolsonaro foi forjado nos debates polêmicos do Super Pop com uma experiência invejável de discutir com Padre Quevedo.
Portanto, não surpreende que os jornalistas ficaram tão perplexos, inclusive, com a capacidade do deputado de fugir da verdade com toda a tranquilidade do mundo.
Bom, quem discute política nesse país já passou por milhares de debates com as mesmas retóricas que Jair apontou ontem. Debater mentiras como: “Tudo é culpa da corrupção”, “policial/militar tem que matar vagabundo”, “BNDES financia o comunismo”, “cota divide o país” e outras bobagens que não resistem a três rodadas de uma discussão dialética, são como bom dia de whatsapp pra quem é progressista.
Contudo, a direita brasileira – com altíssima participação da mídia – sempre aceitou esse batalhão de mentiras, principalmente para tentar ganhar as eleições de 2014 (como a Veja do “eles sabiam de tudo” pode reclamar do Bolsonaro?) e para dar o Golpe e derrubar a presidenta Dilma em 2016.
Está cada vez mais claro que parte da direita nacional, atualmente, deseja uma certa normalidade democrática para ter certa paz para implementar sua agenda neoliberal. Lula não representa essa paz por ser contra essa política, e Bolsonaro também não a representa por ser a materialização do autoritarismo (e o paradoxo foi bem visto na greve dos caminhoneiros).
Contudo, a direita apostou alto demais na apolítica e na ruptura institucional e não consegue mais voltar desse caminho tenebroso. Em outras palavras, Bolsonaro encarnou completamente o antipetismo xucro e golpista e agora tem um público bem fiel a essa loucura.
Vale ressaltar, também, que a direita se viu refém várias vezes das respostas do Bolsonaro por conta da sua limitação ideológica. Reparem, por exemplo, que a hostilidade da bancada contra Jair abre a brecha para seus seguidores aceitaram tranquilamente uma crítica à pejotização do jornalismo. Entretanto, os representantes da mídia não podem discutir seriamente a pejotização pois foi amplamente a favor da contrarreforma trabalhista que transformou a carteira assinada em bico.
O mesmo ocorreu com dados de investimentos públicos em saúde e em educação, quando nenhum jornalista pôde deixar claro que sem dinheiro público não tem investimento nessas áreas.
Sem falar, por fim, na ligação direta de Bolsonaro com Temer que a mídia tem que esconder pois não pode bater no presidente usurpador.
Bolsonaro é cria da mídia. Também é cria da cultura histérica contra o “comunismo” que deu base para o Golpe de 64. Agora, toda essa pós-verdade veio cobrar sua fatura. O golpe prometeu um país ultraliberal, sem cotas, sem bolsa família, sem Estado, sem PT, sem Dilma e sem Lula. Contudo, apenas Bolsonaro continuou com essas promessas.
E o clímax desse encontro foi quando Bolsonaro, sadicamente, citou como livro de cabeceira a obra de um torturador símbolo da ditadura militar do Brasil.
Em pleno 2018, a direita teve que engolir isso.