Em se tratando de pesquisas de intenção de voto, creio que poucos questionarão que Ibope e Datafolha são os mais respeitados institutos, tanto por tradição quanto pela qualidade dos trabalhos apresentados, sempre acompanhados de tabelas estratificadas onde se nota uma ponderação bastante razoável.
O Paraná Pesquisas peca pelo pouco detalhamento de seus dados: nunca mostra o desempenho dos candidatos por renda familiar, por exemplo. Além do mais, o instituto ainda precisa superar o problema de credibilidade gerado por uma pesquisa divulgada logo após o primeiro turno de 2014, que mostrou Aécio Neves com 17 pontos à frente de Dilma. Até hoje muita gente não engoliu aquilo.
O Datapoder360 ainda está por provar a que veio. É uma pesquisa feita por telefone, através de um sistema de robôs, e os números estratificados vinham apresentando problemas sérios, até mesmo de ordem lógica.
A pesquisa da XP/Ipespe tem a vantagem de trazer periodicidade semanal, mas também é feita por telefone, método que ainda está por adquirir legitimidade no Brasil.
O Vox Populi, por sua vez, tem alguns problemas: o principal deles é se tratar de uma pesquisa patrocinada pelo próprio PT, ou pela CUT, o que é a mesma coisa. Assim como muitos internautas questionariam a isenção de uma pesquisa paga pelo PSDB, isso também vale, naturalmente, para pesquisas pagas pelo PT. Além disso, o Vox Populi tem um site que não traz uma mísera informação sobre suas pesquisas.
Eu aconselharia a todos os institutos a terem site próprio, onde deveriam publicar sempre a íntegra, com dados estratificados, de suas pesquisas, além da íntegra dos questionários apresentados aos entrevistados, dados sobre os métodos, história do instituto, respostas às acusações, etc.
Dito isso, passemos à análise de uma pesquisa de intenção de voto, para governador e presidente da república, feita pelo Ibope, para o estado do Rio Grande do Norte. Vamos nos concentrar aqui na pesquisa para presidente da república.
Os números são resultado de pesquisa de campo realizada entre os dias 14 a 17 de julho. É a pesquisa, portanto, mais recente, e que podemos usar para entender, mais ou menos, como está a dinâmica eleitoral no Nordeste.
A íntegra da pesquisa, com todos os detalhes e dados estratificados, pode ser lida aqui.
O Ibope, assim como têm feito quase todos os institutos, fez dois cenários: com Lula e sem Lula.
- Com Lula
Lula lidera isoladamente no estado, com 56% das intenções de voto. Em segundo lugar, vem Jair Bolsonaro, com 11%. Ciro e Marina empatam em terceiro, com 6% e 5%, respectivamente. Entre quem ganha menos de 2 salários, Lula tem 60% ou mais dos votos. A diferença entre Lula e seus concorrentes nestes segmentos mais pobres é impressionante. É como se apenas Lula existisse.
Quando vamos para o universo dos eleitores com renda superior a 2 salários, começa a aparecer um pouco de vida própria para além do lulismo (ainda falando, evidentemente, do cenário com a presença do ex-presidente).
Bolsonaro tem 22% no Rio Grande do Norte, entre eleitores que ganham mais de 2 salários. Ciro se distancia de Marina (que estaciona em 5%) e pontua 9%. O ex-presidente, por sua vez, tem 43% entre eleitores com renda familiar acima de 2 salários.
- Sem Lula
Caso o ex-presidente não consiga o seu registro eleitoral, e não participe das eleições presidenciais de outubro, o quadro muda completamente. Para começar, o número de brancos/nulos e indecisos, que estava em 15% e 2% no cenário com Lula, salta para 40% e 6%, quando o ex-presidente não é apresentados como uma opções.
Este altíssimo percentual de nulos/indecisos concentra-se sobretudo entre as famílias de renda mais baixa. Entre os que ganham menos de 1 salário, por exemplo, a soma de nulos/indecisos, em cenário sem Lula, chega a 51% das intenções.
Entre famílias que ganham mais de 2 salários, brancos/nulos/indecisos atingem 33%.
Sem Lula, há um empate técnico entre Ciro Gomes (14%), Jair Bolsonaro (12%) e Marina Silva (14%).
Entre o eleitorado masculino, que costuma antecipar a média dos dois gêneros, Ciro Gomes tem 20% das intenções de voto do eleitor do Rio Grande do Norte, contra 18% de Bolsonaro e 11% de Marina Silva. É interessante notar que Ciro ganha de Bolsonaro tanto entre homens como entre mulheres.
Entre famílias que ganham mais de dois salários, Jair tem seu melhor desempenho, e pontua 24%; é seguido de Ciro Gomes, que tem 18% dos eleitores nessa faixa de renda; no mesmo segmento, Marina tem 11%
O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, foi apresentado como opção neste cenário, mas pontuou abaixo de 1%, então nem aparece nas tabelas.
A pesquisa traz ainda números estratificados sobre a rejeição dos candidatos.
Jair Bolsonaro é, de longe, o mais rejeitado nesse estado do Nordeste. O ex-militar tem 35% de rejeição na média. Ironicamente, ele tem mais rejeição justamente entre a faixa de renda que mais vota nele, o que é explicável pelo maior nível de participação política (e, portanto, maior polarização) desse eleitorado: entre famílias com renda superior a 2 salários, Bolsonaro tem 41% de rejeição. Ainda em função da mesma lógica, Jair Bolsonaro tem rejeição de 47% entre eleitores com nível superior.
Outros candidatos tem baixo nível de rejeição no Rio Grande do Norte.
O ex-presidente Lula tem uma rejeição baixa no estado, de apenas 15%. Entre eleitores de renda maior e maior instrução, porém, a rejeição do ex-presidente se eleva substancialmente. Entre famílias com renda familiar superior a dois salários, por exemplo, o percentual de eleitores que responderam que não votariam em Lula “de jeito nenhum” cresce para 26%; e, entre eleitores com nível superior, para 27%.
- Conclusão
Os números revelam uma feliz coerência dos eleitores do Rio Grande do Norte (e do eleitorado do Nordeste, de forma geral, conforme já vimos em outras pesquisas): o eleitor de Lula não vota em Bolsonaro. Quando o ex-presidente não é apresentado como opção, Bolsonaro permanece no mesmo lugar, com 11% a 12%.
Os principais herdeiros do voto lulista são Ciro Gomes e Marina Silva, mas especialmente o primeiro. Entre os eleitores com renda familiar superior a 2 salários e que os próprios números mostram ter maior participação política, a migração de votos de Lula para Ciro é substantiva: Ciro passa de 9% para 18% nessa faixa de eleitores.
Fernando Haddad, nome usado pelos institutos de pesquisa como eventual substituto de Lula, ainda tem desempenho muito baixo nos estados do Nordeste. Como o PT só pretende apontar um substituto para Lula, no caso do ex-presidente não poder concorrer, a poucos dias do pleito eleitoral, um candidato como Haddad (ou outro petista escolhido) enfrentará um desafio enorme para conquistar o voto lulista, sobretudo em função do tempo exíguo que os partidos terão este ano (em 2014, o PT tinha 12 minutos de TV, e dois meses de propaganda eleitoral; este ano, haverá apenas um mês de propaganda e o PT terá pouco mais de 1 minuto).
- Disputa para governador
A propósito, a senadora Fátima Bezerra, do PT, lidera isoladamente, com 31%, a pesquisa Ibope para o governo no Estado.