A pré-candidata pelo PCdoB, Manuela D’Ávila, escreve em suas redes que atendeu ao convite do general Villas Boas, comandante do Exército, e foi conversar com ele. Villas Boas já recebeu Bolsonaro, Haddad, Ciro Gomes e está convidando todos os candidatos.
Um dos erros – talvez um dos piores – do campo progressista foi não ter dado a atenção devida às relações políticas com as Forças Armadas. Melhoramos nossas relações com diversos países, ampliamos o diálogo com movimentos sociais, mas esquecemos que sem força não existe poder. As escolas militares foram entregues à ideologia conservadora mais entreguista e antinacional, e a prova foi a resignação com que as forças armadas reagiram à prisão do Almirante Othon, determinada pelo juiz Marcelo Bretas, responsável pela Lava Jato no Rio, sem falar em todo o processo de desmonte do nosso sistema de defesa e infra-estrutura, liderado por Sergio Moro.
Uma das maiores qualidades de Leonel Brizola foi nunca ter esquecido da importância de boas relações com as forças armadas. Essas relações, construídas de maneira puramente política, porque Brizola nunca foi militar, ajudaram a derrotar o Brasil de um golpe de Estado e de um massacre, em 1961. E quando eu falo em boas relações, eu quero dizer construção de influência, um conceito que, diante do que se tornou o STF, me parece bem fácil de entender. O Poder Democrático não apenas precisa ser influente junto aos órgãos de poder, como tem obrigação de defendê-los politicamente de influências antidemocráticas externas. Por exemplo, é preciso cortar os cabos de transmissão que permitem à Globo manipular as consciências dos ministros do STF.
Segundo Jorge Ferreira, historiador da Universidade Federal Fluminense, citado na biografia de Brizola escrita por FC Leite Filho, a penetração de ideias nacionalistas e progressistas nas Forças Armadas, no início da década de 60, era enorme: “cálculos sugerem que, dos 40 mil sargentos na ativa, 22 mil eram brizolistas”. Ferreira lembra que, ao falar na tv, Brizola muitas vezes aparecia com dois fuzileiros navais, empunhando seus fuzis, um de cada lado do líder”.
É um fato histórico conhecido que, em 1961, o ministro da guerra, o marechal Odylio Denys, sob pressão do general Orlando Geisel, mandou bombardear o palácio do Piratini, onde o então governador Leonel Brizola, junto com centenas de apoiadores, entre eles muitos jornalistas, resistiam à tentativa de golpe contra a posse do vice-presidente João Goulart. A ordem foi dada para a 5ª Zona Aérea, subordinada ao ministério da Aeronáutica, que estava sob o comando do brigadeiro Aureliano Passos, “fiel à cúpula militar de Brasília” (estou usando as palavras de FC Leite Filho, biógrafo de Brizola).
Entretanto – e esse fato é tão emocionante que mereceria ser explorado em mais detalhes por outros historiadores – houve uma sublevação de sargentos, que depuseram o brigadeiro, após terem esvaziado os pneus dos aviões que lançariam suas bombas sobre a praça da Matriz e o palácio Piratini, onde causariam um massacre sem precedentes, visto que havia milhares de pessoas reunidas nesses locais.
A recente manifestação de Villas Boas, aquele famigerado twitter publicado na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula no STF, em que pediu “fim da impunidade”, foi resultado, naturalmente, de um gigantesco jogo de pressões internas das forças armadas, as quais refletem, por sua vez, as pressões da mídia e da opinião pública construída pela mídia. A resposta não é, obviamente, isolar Villas Boas, mas ao contrário, conversar com ele, dialogar, até porque quem conhece as Forças sabe que o comandante representa, ali dentro, uma consciência bem mais democrática do que a média da instituição.