O espaço vazio permeia a realidade.
As estrelas, planetas e demais corpos celestes ocupam um diminuto espaço na imensidão escura que enxergamos quando olhamos para cima, à noite. Da mesma forma, os átomos que compõe o corpo humano têm um volume de matéria extremamente baixo comparado ao espaço vazio – diz-se que a proporção é mais ou menos como a de uma mosca em uma catedral.
O vazio está por toda parte e funciona como uma espécie de palco, como a sustentação da matéria, da realidade manifestada.
O futebol, como parte integrante da realidade, não foge à regra. É necessário espaço para que as jogadas fluam e a arte se manifeste. Quanto menor o espaço, mais difícil jogar bola.
A seleção do Uruguai sabe muito bem disso e fechou magistralmente os espaços contra a França, na abertura das quartas de final da Copa do Mundo.
As explosões de Mbappé podiam sobrepujar um ou até dois marcadores, mas logo eram debeladas pelo firme e compacto sistema defensivo celeste. Na única vez em que ele teve algum espaço para ganhar na velocidade, após bela enfiada de Pogba, o passe rasteiro para o meio da área não encontrou nenhum companheiro – às vezes é inviável acompanhar o ritmo estonteante do camisa 10.
Sem espaço, a França penou para criar chances no primeiro tempo. O Uruguai, sem Cavani, praticamente também não ofereceu perigo para Lloris.
Aos 39, tudo muda. Griezmann cobra falta da meia direita, com capricho, e o zagueiro Varane, após afastar o marcador com um drible de corpo, desvia de cabeça, fazendo a bola morrer no cantinho direito do gol de Muslera.
Aos 43 o Uruguai respondeu com uma jogada parecida, levantamento na área e desvio de Cáceres com direção certa, também no cantinho direito, mas Lloris fez uma defesa de cinema e salvou a França do empate.
A desvantagem no placar foi um golpe duro no time sul-americano. Faltou, nitidamente, qualidade técnica para os nossos vizinhos conseguirem produzir jogadas de ataque e criar chances de gol. Suárez mal participou do jogo e Cavani fez, como se previa, falta demais.
Aos 15 da segunda etapa, um chute despretensioso de Griezmann, com certa força mas exatamente na direção do goleiro uruguaio, acabou transformando-se no segundo gol francês. Muslera espalmou para dentro do gol, tomando um frangaço e praticamente enterrando qualquer possibilidade de reação da Celeste.
O time francês, então, passou a jogar com inteligência, trocando passes e deixando o tempo passar, até que o Uruguai não tivesse mais forças para reagir. Com espaço, tudo fica mais fácil.
Destaque para a dupla Pogba e Griezmann, que ditou o ritmo da partida, controlando o meio de campo com muita técnica e tranquilidade, características que se expressavam nos passes precisos e seguros da dupla.
A França sofreu mais do que contra a Argentina, até porque o time de Messi tentou propor o jogo e, assim, concedeu muito, mas muito mais espaço para Mbappé e companhia.
Mesmo assim, os bleus confirmam o favoritismo e chegam à semifinal com autoridade, apresentando um futebol vigoroso fisicamente mas igualmente técnico e habilidoso.
Dez anos depois do primeiro título, a França tem uma chance preciosa de conquistar o bi campeonato mundial. E vem fazendo por onde.