Ciro ultrapassa Bolsonaro entre pobres, mulheres, nordestinos e eleitores com mais de 45 anos

Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul, durante a Campanha da Legalidade, em 1961. O trabalhismo vencerá o fascismo?

Desde maio passado, a pesquisa mensal do site Poder 360 não traz cenários com Lula.

As chances do ex-presidente conseguir o seu registro eleitoral – e exercer o sagrado direito político de se candidatar à presidência da república –  são cada vez menores. Em vista disso, todos institutos de pesquisa tem ampliado os cenários sem a presença do ex-presidente.

Quando seu nome é colocado nas pesquisas, Lula se mantém firme em primeiro lugar: no último Ibope, tinha 33% das intenções de voto.

Como de praxe, faço o alerta para que os internautas não levem tão a ferro e fogo as pesquisas, seja quando mostram números bons para seu candidato, seja quando trazem números ruins. Elas são boas apenas para nos dar uma ideia sobre tendências, e contextualizar e estimular nossas análises e debates. Se mantivermos os olhos no conjunto das pesquisas, como sempre fazemos aqui no blog, o risco de cometermos erros de avaliação são menores.

A pesquisa DataPoder360 é feita por telefone, método muito usado nos EUA, mas ainda incipiente aqui no Brasil. Esperemos que a empresa corrija suas imperfeições e faça um trabalho sério, porque é absolutamente necessário, em nome da democracia, que o mercado de pesquisas seja o  mais plural e diversificado possível. Eu mesmo já fiz duras críticas ao Datapoder360, sobretudo à ausência de ponderação nos resultados estratificados, que não tinham pé nem cabeça; esses erros parecem ter sido reduzidos, mas ainda há exageros e outras coisas estranhas, que vamos comentar na conclusão.

Cumprimento o site por ter divulgado, desde já, o relatório completo da pesquisa, com os dados estratificados. Isso ajuda muito o trabalho do analista. O Poder 360 publicou, até o momento, dois posts sobre a pesquisa: um deles, mais focado nos números de intenções de voto, pode ser lido aqui; o outro, centrado na rejeição a Lula e no potencial de votos do ex-presidente, está aqui.

Num cenário com apenas 6 candidatos, Bolsonaro experimentou uma forte queda, de 4 pontos, e estacionou em 21 pontos. Houve oscilação positiva de um ponto para Ciro Gomes, que se consolidou em segundo lugar, com 13 pontos, bem à frente de Marina Silva, com 8 pontos.

 

Num cenário ampliado, com 15 candidatos, Bolsonaro caiu para 18 pontos, e Ciro subiu para 12 pontos. Alckmin oscilou 1 ponto para cima, para 7 pontos; Haddad oscilou para baixo, para 5 pontos.

Na tabela que mede o grau de certeza dos eleitores, Jair Bolsonaro e Ciro Gomes tem a melhor pontuação. 79% dos eleitores de Bolsonaro responderam que votarão “com certeza” no candidato, ao passo que 70% dos eleitores de Ciro disseram a mesma coisa. Eleitores de Alvaro Dias e Geraldo Alckmin não tem tanta certeza sobre seu voto.

 

Na estratificação por renda, observa-se que Ciro Gomes já lidera entre eleitorado mais pobre, com 20%, contra 18% de Bolsonaro, mas também está à frente entre eleitores com renda acima de 10 salários, onde pontuou 14%, contra 12% do capitão da reserva. O candidato do PDT assumiu a liderança também, com 18%, entre eleitores com idade entre 45 e 59 anos, contra 10% de Bolsonaro.

2º turno

A pesquisa mostra que Bolsonaro ainda tem uma vantagem de 10 pontos sobre Ciro Gomes, num eventual segundo turno: 36% X 26%. Neste cenário, haveria 34% de brancos e nulos.

Neste eventual segundo turno, contudo, Ciro Gomes já obtém vantagem substancial entre alguns segmentos de renda importantes, os quais, até então, pareciam cativos de Bolsonaro. Entre eleitores com renda familiar de 5 a 10 salários, Ciro ganha de 45% X 35%, e entre os que ganham acima de 10 salários, de 43% X 21%. Os dois estão quase empatados entre eleitores com ensino superior: 37% X 40%. O candidato do do PDT vence igualmente entre eleitores com mais de 45 anos.

***

1º turno, por região

Na estratificação por região, observa-se que Ciro é, até o momento, herdeiro natural do voto lulista: o candidato do PDT alcançou 21 pontos no Nordeste. Marina Silva, por sua vez, pontua apenas 8 pontos na região.

Os números são um pouco diferentes dos que aparecem nas últimas pesquisas tradicionais. No último Datafolha, do início de junho, Ciro tem 13 pontos no Nordeste, contra 17 pontos de Marina. No último Ibope, do final de junho, Ciro tem 14% no Nordeste, contra 16% de Marina. Sempre falando de cenários sem Lula, naturalmente.

Apesar das diferenças, a dinâmica da pesquisa DataPoder360 parece correta. Segundo todas as pesquisas, Ciro Gomes, que tem um longo histórico de aliança com o PT e Lula,  que traz um programa de governo alinhado à esquerda, e que denuncia, em todas as suas entrevistas, o golpe de Estado de 2016, tem crescido na região. Faz sentido.

Marina Silva, por sua vez, que tem um programa neoliberal, na contramão do petismo, que apoiou o Aécio em 2014 e o impeachment em 2016,  vai encontrar dificuldades cada vez maiores para manter a sua força no Nordeste.

Alvaro Dias ficou em segundo lugar no Sul, onde alcançou 14 pontos, o que está em linha com as pesquisas tradicionais, e mesmo com a notícia, divulgada na Veja há poucos dias, de que Dias é o candidato preferido de Sergio Moro e dos procuradores da Lava Jato, nativos do Paraná.

No Nordeste, todavia, Alvaro tem apenas 1%, um percentual que, a se manter assim, o inviabiliza nacionalmente. No último Ibope, Alvaro também pontua 1% no Nordeste.

Na divisão por gênero, uma boa notícia para Ciro Gomes: ele está em primeiro lugar, com 12%, entre o eleitorado feminino, um ponto à frente do capitão da reserva. Marina Silva tem apenas 6% entre mulheres.

Bolsonaro sofre forte rejeição entre mulheres em função de suas declarações machistas e sua defesa de soluções de força para problemas sociais.

Entre homens, todavia, Bolsonaro tem 26%, Ciro 11%, Alckmin 10% e Haddad 3%.

Rejeição 

Segundo o DataPoder 360, o percentual de eleitores que responderam que não votariam “de jeito nenhum” em Lula atingiu 62%, ao passo que 24% afirmaram que votariam “com certeza” no ex-presidente. Esses números me parecem muito exagerados. No último Ibope, a rejeição a Lula foi estimada em 31%, e no último Datafolha, em 36%.

Quem Lula deveria apoiar

A pesquisa perguntou quem Lula deveria apoiar, no caso de não concorrer à eleição neste ano. No geral, 14% escolheram Ciro e 11% Haddad.

Quando se põe de parte os eleitores que responderam “votar com certeza” em Lula, um total de 27% respondeu que o candidato apoiado pelo ex-presidente deveria ser Ciro Gomes, contra 14% que preferem Haddad.

Conclusão

A Datapoder 360 ainda traz números exagerados em algumas tabelas estratificadas. A principal dificuldade encontrada pelo instituto, aparentemente, é uma correta ponderação dos dados.

Como eu disse no início do post, a pesquisa vale como pretexto para o debate. É uma oportunidade interessante, por exemplo, para considerarmos a migração de votos do lulismo para outros candidatos.

É evidente que o ex-presidente Lula, quando apontar seu sucessor, conseguirá transferir uma quantidade muito grande de votos. Mas é igualmente claro que essa transferência será mais fluida, mais fácil, se o ex-presidente escolher como o substituto aquele que for mais desejado pelo eleitor. Esta sempre foi, aliás, a maior qualidade de Lula, e principal motivo de sua popularidade: a de identificar e respeitar a vontade popular.

Outro ponto a ser considerado pelos estrategistas é a rejeição. Embora os números do DataPoder360 sejam um tanto exagerados neste sentido, todas as pesquisas apontam um grave problema eleitoral de Lula no Sudeste, no Sul e entre eleitores mais instruídos e de renda média.

As mesmas pesquisas mostram que Ciro Gomes é um dos candidatos com melhor desempenho na classe média e junto aos eleitores com ensino superior. Ou seja, Ciro é forte justamente onde Lula é fraco.

Fernando Haddad é um bom candidato, mas seu desempenho eleitoral ainda é modesto e tem dificuldade de penetrar no Nordeste e junto ao eleitorado de renda mais baixa – problema que outras pesquisas também detectaram.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
Related Post

Privacidade e cookies: Este site utiliza cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com seu uso.