“O Processo” invade almas e exibe emoções

Denise Assis

Venho de ver “O Processo”, um filme de Maria Augusta, que nos esfrega na cara o passo a passo do golpe de 2016, que jogou o país no caos. (Não por falta de aviso). Quem tem dúvidas a respeito do que se passou em Brasília deve ver o filme com atenção, pois só não entende quem não quer. Maria Augusta desenhou. Impossível sair ileso do cinema.

Ver este filme, hoje, em plena paralização de caminhoneiros, um locaute orquestrado pelos empresários do ramo, diante de uma política equivocada e perversa do aumento de combustíveis, ganha ainda mais significado e torna o assistir mais doloroso. Sim, porque estamos diante do resultado prático, do que aquela farsa representou. Daí o título, que não poderia ser mais apropriado.

O Processo remete à obra de mesmo nome, (no original em alemão Der Prozess) do escritor checo Franz Kafka, que conta a história de Josef K.  Funcionário exemplar, um dia ele acorda e se vê enredado em um longo e incompreensível processo por um crime não especificado.

Quem estabelece a comparação, é o senador Lindbergh Farias, quando, durante os trabalhos na Comissão Especial do Impeachment, percebe que a defesa não tem espaço de fala, os argumentos são interrompidos e, indignado, protesta fazendo referência ao livro. Talvez tenha sido a sua fala, a dar título ao filme. Talvez, porque elementos não faltaram à diretora para concluir o mesmo que o senador Lindbergh. O que estava acontecendo ali era um patético desfile de situações, tão nonsense quanto o descrito pelo escritor, em seu romance.

Maria Augusta não usa música. (Atrapalharia, com certeza). Sua câmera treme, enquanto caminha lado a lado com a senadora Gleisi Hoffmann, trazendo para muito perto a tensão do personagem.  Ou capta respirações, ríctus, sentimentos. É isto. O filme invade a alma daquelas pessoas, envolvidas numa trama em que não estão à vontade, porque a grande maioria (da oposição), de alguma forma, aponta o dedo para desviar de si outros tantos dedos que poderiam denunciá-las. Janaína Paschoal provoca risos sempre que aparece, porque este foi o seu papel: patético. Outro que provoca reações é Aécio Neves, hoje desmascarado em sua performance de salvador da pátria.

Ver a empáfia e a frieza de Eduardo Cunha, ainda investido do cargo de presidente da Câmara, quando agora sabemos do seu destino, também causa burburinho. Os maxilares de Romero Jucá, o que tramou com “o supremo e com tudo”, são significativos, quando se observa suas contrações. Sim, senhores. A câmera de Maria Augusta não perdoa, mostra.

Em compensação, ela não deixa escapar a firmeza e a convicção com que Dilma defende o seu mandato, a sua reputação. Não precisou muito tempo (apenas dois anos), para que as situações retratadas no filme saltassem para a história. De final infeliz, é verdade. Mas quem disse que esta história já terminou? A sessão, sim, acaba sob aplausos e lágrimas, mas a história, está por ser escrita.

 

Denise Assis: Denise Assis é jornalista e autora dos livros: "Propaganda e cinema a Serviço do Golpe" e "Imaculada". É colunista do blog O Cafezinho desde 2015.
Related Post

Privacidade e cookies: Este site utiliza cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com seu uso.