Publicado no Viomundo
por Conceição Lemes
O entreguismo dos golpistas é sem limites e a jato.
Agora, de uma penada, querem entregar 36% da capacidade de refino de petróleo do Brasil.
Para barrar esse novo ataque à soberania nacional, o Partido dos Trabalhadores (PT) protocolou há uma semana (14/05) no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra o decreto nº 9.355, do presidente da República, Michel Temer (MDB-SP).
Diz a ementa do decreto, de 25 de abril de 2018:
Estabelece regras de governança, transparência e boas práticas de mercado para a cessão de direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos pela Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras, na forma estabelecida no art. 29, no art. 61, caput e § 1º, e art. 63, da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, e no art. 31 da Lei nº 12.351, de 22 de dezembro de 2010.
“O decreto 9.355/2018 ‘legaliza’ o Plano de Desinvestimento, da Petrobrás, já que as vendas dos ativos envolvidos estão sendo questionadas na Justiça”, expõe Raquel Sousa, um dos advogados subscritores da ADI.
“Na prática, ele ‘legaliza’ a destruição da Petrobras, pois permite a venda de empresas importantes e campos de petróleo valiosíssimos por preço vil e SEM LICITAÇÃO”, denuncia.
Desde 2017, o presidente da Petrobrás, Pedro Parente, vem patrocinando verdadeiro programa lesa-pátria com o ativos da estatal.
É devastador.
Atente aos dados de alguns já vendidos — todos sem licitação! — pela dupla Pedro Parente-Michel Temer:
* Campo de Carcará, no pré-sal da Bacia de Santos, entregue à estatal norueguesa Statoil por US$2,5 bilhões.
Carcará, segundo estimativas menos otimistas, possui reserva de 700 milhões de barris de petróleo.
Parêntese. O petróleo é uma commodity cujos preços são muito voláteis.
É comum, portanto, ter grandes altas e grandes baixas.
Nessa segunda-feira (21/05), o preço do barril estava em US$ 78,86.
Mas, na época, em que os ativos em questão foram vendidos, cada barril custava US$ 55.
“Vender os ativos em época de baixa é um dos piores crimes de Pedro Parente à frente da Petrobrás”, acusa o advogado Carlos Cleto, outro signatário da ADI contra o decreto o nº 9355. “O próprio Ministério Público Federal (MPF) já assinalou isso em parecer.” Fechando o parêntese.
Com o barril a US$ 55, a venda de Carcará representará perda de US$ 38,5 bilhões para Petrobrás.
Se considerado o valor do barril nessa segunda-feira, a perda atingirá US$55,2 bilhões.
*Participação da Petrobrás nos campos de Lapa (35%) e Iara (22,5%), vendida por US$ 2,225 bilhões à petroleira francesa Total.
Os dois campos ficam no pré-sal da Bacia de Santos.
Lapa possui reserva de mais de 1,6 bilhão de barris e Iara, cerca de 5 bilhões.
Os 35% de Lapa e os 22,5% de Iara representarão perda de US$ 280 bilhões para a Petrobras.
Curiosamente, a Total já foi condenada na Itália, nos Estados Unidos e na própria França por corrupção de agentes públicos para comprar campos de petróleo a preço de banana.
*Companhias Petroquímica Suape e Citepe – o chamado complexo PQS — entregue por US$ 385 milhões à mexicana Alpek.
O complexo PQS, construído no âmbito do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), custou R$ 11 bilhões. Ou seja, sete vezes o preço pelo qual a Petrobrás vendeu as duas empresas.
*Nova Transportadora do Sudeste (NTS), proprietária de todos os dutos que ligam os campos de petróleo das bacias de Santos e Campos ao continente.
No período 2013-2015, a NTS lucrou R$ 8,389 bilhões.
A Petrobrás vendeu-a por R$ 17 bilhões. Isso equivale a cinco anos de lucro líquido da NTS.
A previsão é de que até 2028 o lucro atinja R$ 49 bilhões.
Pior: com venda NTS, a Petrobrás da dupla Pedro Parente-Michel Temer passou a alugar os dutos que antes eram seus.
Não bastasse isso, bancará os R$ 49 bilhões de lucro da NTS!
Como?! Pagando para usar os dutos que vendeu!
“O ‘problema’ é que essas vendas são juridicamente frágeis e têm sido repetidamente declaradas ilegais em várias instâncias do Poder Judiciário”, observa Cleto.
“Além de estarem também sendo questionadas na Justiça por meio de diversas ações populares”, acrescenta o também advogado Bruno de Barros, o terceiro signatário da ADI.
Entretanto, “legalizar” o plano de Desinvestimentos não é o único propósito do decreto nº 9.355.
Ele visa também impedir ou, no mínimo, atrapalhar, a entrada em vigor dos dispositivos da lei nº 13.303/2016, que tratam das licitações em empresas públicas e sociedades de economia mista.
Em outras palavras: Temer decidiu usurpar a competência exclusiva do Congresso Nacional e produziu um “decreto” que é lei em tudo, menos no nome e na constitucionalidade.
“Na prática, o decreto pretende negar eficácia a uma lei federal que, regulamentando a Constituição, lhe impõe a OBRIGAÇÃO DE LICITAR”, salienta Raquel Sousa.
Segundo os advogados que assinam a ADI, o decreto nº 9.355 é incompatível com a Constituição Federal, agredindo os seguintes dispositivos:
a) Artigo 2º, vez que não é dado ao Poder Executivo expedir o Decreto nº 9.355, que não veio regulamentar Lei alguma, e cujo conteúdo seria típico de uma Lei;
b) Artigo 5º, Inciso II, vez que ofende ao Princípio da Reserva da Lei, ínsito naquele dispositivo, que o Decreto nº 9.355 venha a estabelecer todo um regramento de Licitações para a PETROBRÁS, criando Direitos e Obrigações;
c) Artigo 37, cabeça e Inciso XXI, vez que o Decreto nº 9.355 usurpa função reservada à Lei e ainda cria hipóteses de Dispensa de Licitação sem fonte legal válida;
d) Artigo 22, cabeça e Inciso XXVII c/c Artigo 48, cabeça e Inciso V, vez que a publicação do Decreto nº 9.355 representa a invasão de uma Competência Legislativa reservada ao Congresso Nacional;
e) Artigo 84, cabeça e Inciso IV, vez que a publicação do Decreto nº 9.355 constitui um abuso de poder, largamente excedendo o Poder do Presidente da República de expedir Decretos para fiel execução das Leis;
f) § 1º e seu Inciso III do Artigo 173, vez que o Decreto nº 9.355 usurpa função reservada à Lei e ainda cria hipóteses de Dispensa de Licitação sem fonte legal válida.
Por tudo isso, o PT quer que o decreto nº 9.355 seja declarado inconstitucional.
“Em 27 de abril, dia seguinte à publicação desse malfadado decreto, a Petrobrás pôs à venda 36% da capacidade nacional de refino em duas operações denominadas Cluster Sul e Cluster Nordeste”, observa Carlos Cleto.
Cluster significa conjunto.
O cluster Sul abrange: 2 refinarias — a Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, e a Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul; 7 terminais de óleo e gás; e 736 quilômetros de oleodutos. Representa 17% da capacidade brasileira de refino do petróleo.
O cluster Nordeste envolve: 2 refinarias – Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco, e Landulfo Alves (RLAM), na Bahia; 5 terminais de óleo e gás e 770 quilômetros de oleodutos. Representa 19% da capacidade brasileira de refino.
Ou seja, a venda de 4 refinarias, 12 terminais de óleo e gás e 1.506 quilômetros de oleodutos, com impacto direto na soberania do País e na vida de milhões de brasileiros, pois:
1) aumentará a nossa dependência da importação de combustíveis para suprir a necessidades internas;
2) produzirá alta ainda maior nos preços de combustíveis e gás de cozinha.
“É a continuidade da política colonial”, atenta Raquel Sousa.
Se antes exportávamos açúcar e pau-brasil em troca de produtos manufaturados, hoje é óleo bruto a preço de amigo, ou de pai para filho, para as grandes petroleiras multinacionais.
— E nós, depois?!
Bem, nós…depois, vamos comprar os derivados de petróleo que as petroleiras estrangeiras refinam e nos vendem por preços nas alturas.
Tanto que, desde 2016, os preços da gasolina e do gás de cozinha não param de subir, provocando grande retrocesso na vida das famílias pobres do Brasil.
Apenas em 2017, mais de 1,2 milhão de famílias foi obrigada a trocar o uso de gás de cozinha pelo carvão ou lenha. Um imenso retrocesso social!
“Assim, a verdadeira razão do decreto nº 9.355 é permitir que o governo Temer prossiga com a sua política devastação da Petrobrás sem ser incomodado pelo Judiciário”, salienta a advogada Raquel Sousa.
Daí, a ADI ajuizada pelo PT, cujo objetivo é justamente impedir que a dupla Temer/Parente tenha sucesso na empreitada de destruir um dos maiores patrimônios do Brasil, a Petrobrás.
No STF, por sorteio eletrônico, a ADI caiu para o ministro Marco Aurélio.
Ao analisá-la, ele deferiu o pedido dos advogados de que fosse adotado o rito de urgência do artigo 12 da lei nº 9.868/1999; ela trata, especificamente, do processo e julgamento de ADIs.
O artigo 12 diz:
“o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação”.
A decisão do ministro Marco Aurélio significa que ele entendeu a relevância da questão e colocou a ADI em regime de urgência. Portanto, ela pode ir ao plenário do STF para julgamento em cerca de dois meses.
Em tempo 1. Essa ADI é parte da luta realizada por entidades, sindicatos, partidos e personalidades que integram o coletivo da campanha Petróleo é do Brasil, lançada em 9 de maio de 2018, em Brasília. Ideli Salvatti, do PT, coordena-o. Ex-deputada federal e ex-senadora por Santa Catarina, Ideli foi ministra do governo da presidenta Dilma Rousseff.
Em tempo 2. Se depender dos advogados subscritores, sindicatos e movimentos sociais, Michel Temer e Pedro Parente não terão trégua. “O petróleo e a Petrobrás são do Brasil e do povo brasileiro!”, frisam.
Em tempo 3. Eles esperam que a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, não procrastine, como fez com o julgamento da prisão após a 2ª instância, que poderia beneficiar muita gente, inclusive o ex-presidente Lula.
A participação da ministra em jantar com executivos de grandes petroleiras estrangeiras aumenta ainda mais a preocupação.
Em tempo 4. A subida do petróleo no mercado internacional — o barril está em US$78,86 — acaba de vez com a farsa da “crise na Petrobrás”, tão propalada por Pedro Parente e a grande mídia brasileira.