Novas provas reforçam acusações de cobrança de propina contra homem de confiança de Temer

Informações publicadas no El País:

E-mails obtidos pelo EL PAÍS mostram “urgência” de empreiteiro em obter 1 milhão para coronel Lima. Militar é acusado pela Polícia Federal de arrecadar dinheiro em nome do presidente.

E-mails inéditos obtidos pelo EL PAÍS mostram o empenho, em um pedido de “urgência” do empreiteiro José Antunes Sobrinho, sócio da empresa Engevix, para conseguir um pagamento de 1,1 milhão de reais, destinados a um dos principais homens de confiança do presidente Michel Temer (MDB), o coronel João Baptiista Lima Filho. As mensagens reforçam e detalham a versão que Antunes apresentou em proposta de delação premiada: de que esse pagamento era um repasse de propina ao coronel Lima. Segundo Antunes, o destinatário final era o próprio Temer. A comprovação do pagamento e detalhes da negociação começam agora a aparecer em um processo no Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

Como EL PAÍS revelou em outubro, uma empresa tenta provar na Justiça que foi induzida por Antunes e um comparsa a fazer um pagamento de 1,1 milhão de reais ao coronel reformado João Baptista Lima, amigo de Temer e investigado como o mais antigo operador de propinas do presidente. A companhia Alúmi Publicidades diz que não sabia que esse pagamento fazia parte de um ajuste de propina e se diz usada involuntariamente como “testa de ferro”. À Justiça, a Alúmi relatou que foi induzida a contratar o amigo de Temer, porque essa foi uma condição imposta por Antunes enquanto sócio da Engevix para que a empresa conseguisse assinar um contrato de exploração de mídia externa no Aeroporto de Brasília. Antunes comandava na época a concessionária da operação do aeroporto, Inframérica, um consórcio de que a Engevix fazia parte.

Primeiro, a Alúmi anexou no processo comprovantes bancários dos pagamentos. Depois, em um novo desdobramento, a Alúmi apresentou também e-mails enviados pelo sócio da Engevix, pelo amigo de Temer e por outro empresário, Rodrigo Castro Alves Neves, sócio da companhia EPS, que funcionou na época como um intermediário entre Antunes e a Alúmi. Pela versão da Alúmi, a empresa tentou por vários meses conseguir o direito de explorar painéis e portais de propaganda no Aeroporto de Brasília, sem sucesso. Até que um dia ela foi procurada por Alves Neves, que disse ser capaz de conseguir a assinatura do contrato. Para trabalhar no aeroporto, mesmo concedido à iniciativa privada, seria preciso pagar um preço, que era contratar o coronel Lima por 1,1 milhão de reais, um pagamento que seria uma “espécie de luvas para a Inframérica”, de acordo com a argumentação da Alúmi apresentada à Justiça. Até hoje, não existem registros ou documentos na Justiça nem nos Conselhos de Arquitetura e de Engenharia de que Lima tenha prestado algum tipo de serviço para a Alúmi ou para o Aeroporto de Brasília em troca desse pagamento

Nas mensagens entregues à Justiça, é possível ver como parte da trama se desenrolou. O contrato entre a Alúmi e o aeroporto, que garantia a exploração da mídia externa na principal via de acesso, só foi assinado em 11 de setembro de 2014, mas os e-mails mostram que, antes disso, o coronel Lima já estava preocupado com os frutos do negócio. Em 4 de setembro, ele enviou um e-mail para Antunes, em que cobra: “Alguém poderia entrar em contato comigo ou com a arquiteta Rita Fratezi para acertar a formatação do contrato?”.

Lima não se satisfaz com uma resposta de Antunes e escreve novamente em tom de cobrança: “Precisamos concluir a proposta de comunicação visual. Aguardo providências”. Pouco depois da cobrança do coronel, Antunes reage e pede urgência de Neves, que funcionou como uma espécie de intermediário na negociação do aeroporto com a Alúmi. “Por favor, eu não tenho condição de gerenciar pessoalmente a matéria e por isso eu os coloquei em contato direto; apreciaria que o Rodrigo faça urgente contato com o doutor Lima visando fechar e realizar o contrato” (veja a imagem abaixo).

Procurados, advogados de Lima e de Antunes não quiseram comentar. No processo, Neves diz que não conhece o coronel reformado e que não teve participação no contrato dele com a Alúmi.

A evolução da negociação não aparece inteiramente nos e-mails, mas o amigo de Temer conseguiu os repasses de dinheiro pouco depois das cobranças. A Alúmi depositou 469.200 reais em uma conta bancária do coronel no HSBC no dia 17 de outubro daquele ano e outros 622.200 reais em 3 de novembro. Nos e-mails, também não é possível ver nenhum documento de estudo de Lima ou de suas empresas (Argeplan e PDA Projeto). A PDA Projeto emitiu notas fiscais com a justificativa de que fez estudos para a Alúmi. Isso nunca se comprovou.

Só a proposta de delação premiada de Antunes revelou o que, segundo ele, era o verdadeiro motivo dos pagamentos da Alúmi para o amigo de Temer. Na tentativa de delação, o empresário disse que esse repasse foi a solução que encontrou para disfarçar uma propina de um milhão de reais que Lima pediu para Temer durante a campanha eleitoral de 2014. O sócio da Engevix declarou que, pela influência de Lima e Temer, tinha conseguido um contrato de 162 milhões de reais em obras da Eletronuclear na usina Angra 3. Antunes contou também aos membros do Ministério Público que Lima chegou a procurá-lo para oferecer a devolução do dinheiro depois do avanço da Operação Lava Jato, mas nada foi reembolsado.

Entre novembro de 2015 e abril de 2016, Antunes teve negociações e conversas com três procuradores da República, em que revelou crimes pelos quais estava disposto a fazer confissões e apresentar provas em troca de uma punição mais branda da Justiça. O empresário não tinha entregado esses e-mails, nem os comprovantes bancários dos pagamentos para Lima — fornecidos só agora pela Alúmi em um processo cível. O acordo de Antunes acabou recusado pelo trio que representava o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nas discussões. Janot já foi criticado por integrantes do Ministério Público Federal pela recusa do acordo e pela demora em investigar Temer.

Mas o caso voltou à tona recentemente por dois novos caminhos. Primeiro, pela tentativa da Alúmi de limpar o seu nome e de dissolver um contrato com Neves, o intermediário que ganhou o direito de faturar 10% de toda a receita líquida da empresa com a exploração da mídia externa no Aeroporto de Brasília. A disputa da Alúmi com Neves caminha para a fase de produção de provas na 18ª Vara Cível de Brasília. A companhia quer que a Justiça determine que Antunes preste um depoimento no processo para narrar como induziu-a a fazer pagamentos para o amigo de Temer. A Alúmi pede também que a Procuradoria-Geral da República envie uma cópia da proposta de delação do empresário e que o Ministério Público seja intimado no processo para que avalie o assunto.

“Existiu uma negociação entre Neves e Antunes, representante da Inframérica, que nós não sabíamos e não nos parece muito ética. O Ministério Público tem interesse na persecução criminal. Se ele verificar que existe indício de ato criminoso, é decisão dele intervir ou não”, afirmou o advogado da Alúmi, Eduardo Silva Freitas, a este jornal.

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