Além de alterar números, ex-presidente esconde a maior intervenção do governo federal feito sobre empresa pública desde sua fundação
Por Gésio Passos*
Publicado em CartaCapital, aqui.
Ao contrário do que foi alardeado pela matéria Sob comando de Rimoli, EBC consegue zerar déficit, veiculada no jornal Valor Econômico no dia 2 de maio, Laerte Rimoli deixa, após 20 meses de mandato, a presidência da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) de forma desastrosa, implementando uma asfixia econômica e editorial da comunicação pública. A matéria publicada é marcada pela ausência de apuração e do contraditório, servindo de mero release para o ex-presidente da EBC.
O discurso de Rimoli encobre o corte brutal nos repasses de recursos para a comunicação pública previstos na lei orçamentária federal. Enquanto em 2017, o orçamento aprovado na LOA para a EBC foi de 708 milhões de reais, o governo contingenciou quase 150 milhões de reais, sendo executado pela empresa pública apenas 560 milhões de reais.
Em 2016, o contingenciamento foi menor, cerca de 62 milhões de reais, para um orçamento aprovado de 657 milhões de reaos. Isso para uma empresa que tem 4 bilhões de reais contingenciados de uma contribuição criada especificamente para financiar a EBC em 2008.
O ex-presidente da EBC apresentou ao jornal Valor Econômico mais números duvidosos sobre a empresa. Ainda de acordo com o Portal da Transparência, em 2017, os investimentos da EBC não chegaram nem perto dos 27 milhões de reais vendidos na matéria. Os investimentos reais foram de apenas 7 milhões de reais, o menor desde 2008, representando a menor relação de investimento pela execução do orçamento da história da empresa.
Além do mais, não há no Plano de Trabalho da EBC para 2018, ao contrário do que afirma Laerte Rimoli, recursos previstos para a cobertura das eleições de 2018. Pior do que ocorreu nas eleições municipais de 2016, a cobertura dos veículos da empresa pública neste ano se dará apenas no Rio, Brasília, São Paulo e Maranhão, locais onde a EBC tem sede, já que a gestão Rimoli fez questão de acabar com o pequeno programa de correspondentes que realizavam a cobertura em outras cinco capitais.
Ao contrário do que diz a matéria do Valor, também não foram destinados recursos para a cobertura da Copa do Mundo na Rússia. No Plano de Trabalho da empresa, só houve dinheiro para a compra dos direitos de transmissão para a Rádio Nacional, sendo que a cobertura será feita integralmente dos estúdios no Brasil.
Laerte Rimoli ainda vende um crescimento na audiência no Carnaval 2018 como recorde da empresa. Mas o número foi próximo da transmissão dos carnavais de 2016 e 2017, quando a gestão passada adquiriu os direitos dos desfiles das campeãs do Rio de Janeiro e São Paulo. Os picos de audiência da TV Brasil são comuns em eventos especiais, como o desfile de Sete de Setembro ou nas transmissões de futebol da Série C, especialmente nos jogos finais – cobertura essa que foi abandonada na gestão de Rimoli.
A verdade é que esta última gestão da EBC, comandada por Laerte Rimoli, representou uma intervenção do governo até então nunca vista nos 10 anos de existência da empresa pública, transformando em rotina a censura e a perseguição a jornalistas e radialistas.
A gestão de Rimoli ainda será marcada pelas mudanças da lei da EBC, realizadas por medida provisória editada por Michel Temer, que atacou diretamente a autonomia da comunicação pública frente ao governo e cassou os espaços de participação da população na empresa, com o fim do Conselho Curador.
* Gésio Passos é jornalista da EBC, mestre em Comunicação pela UnB e coordenador geral do Sindicato dos Jornalistas do DF