A tentativa de impeachment do governador Fernando Pimentel é a repetição, como farsa a nível local, da tragédia nacional que foi o golpe de Estado contra a presidenta eleita Dilma Rousseff.
É uma farsa porque faltam apenas seis meses para as eleições para governador. Um impeachment neste momento é absolutamente ridículo. Nem dá tempo!
Ademais, no meio de uma crise tão dramática vivida em todo país, criar um foco de instabilidade política num estado com 21 milhões de pessoas é uma irresponsabilidade criminosa!
Pimentel foi eleito no primeiro turno em 2014 com números impressionantes: 5,4 milhões de votos, ou 53% do eleitorado. Obteve uma vantagem superior a 1 milhão de votos sobre o segundo colocado, o tucano Pimenta da Veiga. É um governador altamente aprovado pelos mineiros e o seu impeachment acrescentaria mais um trauma ao país.
Eu reproduzo abaixo a análise do Nassif, que resume bem a questão. É um golpe feito pelos mesmos delinquentes políticos que protagonizaram o golpe contra a presidenta Dilma, um golpe que resultou numa enorme desgraça econômica para o país, com aumento da miséria, da fome e do desemprego.
Essa farsa, por outro lado, tem tudo para ser um tremendo tiro no pé dos golpistas (tantos os mineiros quanto nacionais), porque o ambiente hoje é totalmente diferente daquele em que se deu o impeachment de Dilma no início de 2016.
O governo nascido do golpe de 2016 é o mais impopular da história. O PT e a esquerda em geral cresceram vigorosamente. A esquerda está mais unida do que nunca e os ataques golpistas a Pimentel farão com que os setores progressistas de Minas ponham de lado os defeitos (que são muitos) de seu governo e do próprio governador (maiores ainda), e engrossem as fileiras para freiar mais essa tentativa de violar o sufrágio universal.
Será a chance, além disso, do próprio Pimentel mostrar a que veio e superar aos vícios burocráticos de seu governo e seus próprios, e passar a acreditar no poder da política.
Se Pimentel imitar Dilma e achar que irá resolver o problema simplesmente entregando espaços para a direita reacionária, sacrificando sua dignidade e perdendo apoio popular, terá o mesmo destino da presidenta petista. Será deposto melancolicamente.
É preciso enfrentar os golpistas com energia e altivez, de cabeça erguida, de frente!
Um dos erros mais primários de Dilma, por exemplo, foi a pusilanimidade com que tratou a contaminação golpista dentro dos orgãos de segurança do governo federal. A polícia mineira parece ir pelo mesmo caminho. O governo do estado tem prerrogativas sobre a polícia e tem de usá-las com inteligência, impondo sua autoridade. Para isso, é preciso também comunicação e política.
Pimentel precisa fazer política, e só há uma forma de fazer isso, nos dias de hoje: comunicação, comunicação, comunicação. E comunicação é uma via de mão dupla (cansei de falar isso, em meu blog, ao governo Dilma). Para que o povo ouça o governo, é preciso ouvir o povo.
O governador tem de aparecer à população não apenas como um engomadinho de terno, igual a todos os políticos, mas como um político com o qual seus próprios eleitores se identifiquem. Para isso, precisa descer à superfície, vestir as sandálias da humildade e conversar com os movimentos sociais, a classe trabalhadora, as rádios comunitárias, a mídia alternativa, o povo enfim.
E, sobretudo, tem de resistir à tentação de acreditar no canto de sereia da Globo! Se a Globo lhe fizer um gesto de simpatia, será apenas para lhe esfaquear por trás em seguida!
Se agir corretamente, alinhando-se aos setores sociais que lhe defendem, transformará esse episódio numa alavanca política de seu governo: sairá muito mais forte, e ainda ajudará a consolidar este grande movimento de Reconstrução Democrática que a luta contra o golpe vem transformando, aos poucos, num dos maiores movimentos já vistos na história do país.
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No Jornal GGN
Xadrez do golpe do impeachment em Minas Gerais, por Luis Nassif
QUI, 26/04/2018 – 21:47
ATUALIZADO EM 27/04/2018 – 08:38
Luis Nassif
O golpe tentado contra o governador Fernando Pimentel é da mesma natureza do que foi aplicado contra a presidente Dilma Rousseff. Os motivos são os mesmos, os personagens, os mesmos, e os álibis são os mesmos.
O golpe está sendo articulado a partir de Brasília, com a coordenação de Michel Temer e Romero Jucá, em cima da tecnologia de golpe desenvolvida por Eduardo Cunha, avalizada pelo Supremo Tribunal Federal, incorporada pelo PMDB, comprovando que a Lava Jato conseguiu entronizar no poder o maior sistema de corrupção política da história.
Para entender:
Peça 1 – o PMDB mineiro
Até agora, o PMDB mineiro estava dividido em duas turmas, uma apoiando o governo Pimentel, outra tentando o golpe. A primeira era liderada pelo presidente da Assembleia Legislativa, Adalclever Lopes; a segunda, pelo vice-governador Antônio Andrade, o Michel Temer de Fernando Pimentel. O PMDB era mantido sob relativo controle graças às divergências entre ambos.
O que levou à aproximação, foram três pontos de interesse:
Interesse 1 – a candidatura ao Senado Federal. Haverá duas vagas em votação. A ideia do PMDB era ter Dilma Rousseff como candidata a deputado federal, aumentando a votação da coligação PT-PMDB e abrindo espaço para a eleição do próprio Adalclever pelo PMDB. As pesquisas dão 20% de preferência a Dilma no Senado. Aparentemente, não se chegou a um acordo e Dilma se candidatará à vaga de senadora.
Interesse 2 – Abriu-se uma vaga no Tribunal de Contas do Estado (TCE), com a morte da conselheira Adriene Andrade. O PMDB pretende ocupar a vaga.
Interesse 3 – dos próprios cardeais do PMDB, Temer e Jucá, apostaram no rompimento da aliança com o PT em Minas para fortalecer a própria bancada. A decisão do impeachment foi tomada por Adalclever após um encontro com Romero Jucá.
Peça 2 – a tecnologia do golpe
A partir daí consolidou-se a tentativa de golpe, em tudo similar à estratégia posta em prática por Eduardo Cunha.
Monta-se a comissão do impeachment. Cada bancada indicará seus representantes para votar a admissibilidade do impeachment. Depois, o caso irá a plenário.
Aprovando a admissibilidade, Pimentel será obrigado a se afastar e o PMDB ficará com o controle da máquina pelo tempo que falta até as eleições. E aí pretende se impor contando com os impolutos de Brasilia associados aos impolutos de Belo Horizonte. E o Ministro Luís Roberto Barroso entendendo que tudo foi dentro dos parâmetros da democracia.
Peça 3 – a chantagem do legislativo
O álibi para o impeachment são os atrasos nos pagamentos do Estado, imerso em grave crise fiscal herdada do governo Anastasia (leia aqui), agravada pela crise da economia brasileira.
Anos atrás, a Câmara de Vereadores tentou golpe semelhante com o então prefeito Márcio Lacerda, devido a atrasos nos repasses. Este reagiu ameaçando divulgar os gastos dos vereadores – cada gabinete custa cerca de R$ 5,5 milhões anuais. A Câmara recuou.
Agora, se levanta novamente a questão orçamentária para tentar repetir o golpe de Eduardo Cunha e Antonio Anastasia, o relator do impeachment no Senado.
O sucesso ou não do jogo dependerá dos grupos independentes da Assembleia, já que o PMDB rompe com o governo.
Peça 4 – a questão fiscal
Pimentel herdou o Estado com um rombo orçamentário da ordem de R$ 7,5 bilhões, deixado por Anastasia – que, na comissão do impeachment, procurou de todas as maneiras criminalizar meros atrasos nos pagamentos do governo.
Segundo levantamento no artigo “O Xadrez de Anastasia, o conseglieri do poderoso chefão”, desde 2013 Anastasia reocrreu a um jogo pesado de adulteração das contas fiscais do Estado, antes mesmo do desaquecimento da economia em 2014.
A maneira de Dilma enfrentar a crise foi atrasando os repasses para os bancos públicos e editando decretos de remanejamento de despesas, que não implicaram no aumento de um centavo em relação à LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias).
As manobras de Anastasia foram um verdadeiro estupro na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF):
- Ampliação da folha em R$ 2,7 bilhões anuais no último ano de governo, 2014.
- Proposta orçamentária inflada com previsão de R$ 4,8 bilhões de dividendos da Cemig, contra média de R$ 2 bi dos anos anteriores.
- Financiou gastos da Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, com recursos obrigatórios da saúde.
- Liquidou com o Fundo Previdenciário, que tinha saldo de R$ 3,5 bilhões e garantiria o equilíbrio para 60 mil servidores novos do Estado. Os servidores foram incorporados à folha, arrebentando de vez com o equilíbrio fiscal precário do Estado. Minas ficou inadimplente junto ao INSS. E só não foi declarado insolvente devido a uma medida liminar do Supremo Tribunal Federal, em um quadro precário.
- Esvaziou o caixa do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais, R$ 350 milhões que impediram o custeio dos hospitais.
O resultado foi um déficit da ordem de R$ 7,3 bilhões no primeiro ano do governo Pimentel, e um inchaço na folha de aposentadoria, liquidando o fundo criado na gestão Itamar Franco. Em condições normais de temperatura e de funcionamento do Judiciário, provavelmente Anastasia seria expulso da vida pública pelas irresponsabilidades fiscais cometidas.
A bomba ficou para seu sucessor. Em vez de denunciar o estado de calamidade fiscal recebido, Pimentel preferiu contemporizar, seguindo o manual de republicanismo ingênuo do próprio Lula e de Dilma. Agora, a bomba explodiu.
Mas, por outro lado, o aecismo – que governou o Estado até 2014 – está em seus estertores. Por aí se explica a ofensiva do PMDB contra Pimentel.
Peça 5 – a questão política
O pano de fundo são as próximas eleições.
Desde o golpe o governo Temer tem atuado para desestabilizar a gestão Pimentel. As razões são óbvias. Trata-se do maior estado brasileiro em mãos da oposição, em termos de economia, população e localização.
Nas últimas eleições, Minas teve papel decisivo, praticamente decidindo as eleições, inclusive em 2014, tendo Aécio como candidato.
Com o fim do aecismo, a situação do PSDB ficou periclitante nos dois maiores colégios eleitorais do país. Geraldo Alckmin está fraco em São Paulo, e Aécio tende a desaparecer em Minas, O movimento visa, em última instância, impedir uma derrota arrasadora para o PSDB, principal partido aliado do PMDB de Temer.
De qualquer modo, o jogo ainda não está jogado. Nos próximos dias, haverá uma ofensiva do governo Pimentel em cima dos independentes e do próprio PMDB.