A ginástica da Folha para esconder a resiliência de Lula nas pesquisas, mesmo após sua prisão, é admirável. O principal dado a esconder é a forte queda na rejeição ao ex-presidente, que era de 36% ao final de setembro do ano passado, caiu em dezembro, subiu um pouco em janeiro e voltou a cair agora, para 31%.
É uma rejeição baixa para um político extremamente conhecido, sobretudo Lula, massacrado dia e noite pela mídia, o que revela uma postura insurgente, rebelde, por parte dos eleitores.
A Folha inventa uma teoria sem pé nem cabeça de que houve queda nos “grupos extremos” (?), ou seja, nos grupos que apoiam e rejeitam Lula. Nosso colunista Bajonas Teixeira, que é professor de filosofia na UFES, já fez alguns comentários sobre a falta de lógica desse raciocínio.
Mas deixemos a confusão da Folha de lado e analisemos a pesquisa com objetividade.
A primeira lição para se analisar uma pesquisa é entender o seu contexto.
E o contexto aqui, naturalmente, é o impacto da prisão de Lula na opinião pública mundial.
A grande mídia brasileira, como é característico de um regime de exceção, falseia a realidade e tem um comportamento monolítico. Nenhum jornal ou revista tem dado destaque, por exemplo, à enorme onda de solidariedade internacional a Lula surgida após sua prisão.
A esquerda do mundo inteiro, incluída a brasileira, se uniu em defesa de Lula. Até Ciro Gomes, que preferiu reagir discretamente a prisão do petista, passou a sinalizar positivamente na direção do ex-presidente, divulgando publicamente um pedido para visitá-lo.
Um ganhador de prêmio Nobel, Adolfo Perez Esquivel criou um abaixo assinado em favor do ex-presidente, que atingiu 228 mil assinaturas em poucos dias. Outro Nobel, o egípcio Mohamed El-Bardei, que em 2005 recebeu o prêmio por sua atuação à frente da Agência Internacional de Agência Atômica, seguiu seus passos e também apoiou Lula.
Isso significa que, independente de oscilações na pesquisa, o nome de Lula ganhou força junto aos núcleos progressistas nacionais e internacionais.
Sua prisão tem sido vista como política por grande parte da população. O próprio Datafolha identificou que metade da população quer quer Lula participe das eleições. Esse fato, por si só, prejudica qualquer candidato de oposição ao ex-presidente, cuja legitimidade de uma eventual vitória ficará sempre arranhada.
Não podemos esquecer que essa metade apoia Lula na contramão da mais sórdida e agressiva campanha midiática já vista no mundo, de maneira que não se trata apenas de uma postura de apoio ao ex-presidente, mas uma postura também de resistência altiva à mídia e ao golpe.
Temos aqui algumas situações.
A força de Lula nas pesquisas obriga a mídia e os setores partidários da justiça a continuarem sua campanha de destruição do petista. Fazer isso sem girar a metralhadora para os tucanos vai aumentar a sensação de injustiça, gerando crescente insegurança jurídica e desconforto político. A sensação opressiva de estarmos vivendo uma ditadura vai aumentar – e isso é péssimo para as forças políticas identificadas com o governo, como o PSDB.
Se girarem para cima dos tucanos, por outro lado, vão pavimentar o caminho para Bolsonaro, e gerar reação dos setores liberais que fazem um esforço hercúleo para fechar os olhos para os arbítrios judiciais cometidos contra petistas. A “virada” de Reinaldo Azevedo e Gilmar Mendes, que se tornaram garantistas e defensores da Constituição após a Lava Jato ameaçar tucanos, pode se estender para outros setores.
O tipo de prestígio adquirido por Lula não tende a diminuir. As campanhas internacionais em sua defesa apenas começaram. Sua prisão, não podemos esquecer, se sucede a um impeachment considerado golpe por muitos intelectuais importantes. Para azar dos golpistas, ainda houve a morte de Marielle pouco tempo antes da prisão de Lula, de maneira que todos os atos em defesa da liberdade do ex-presidente incluem também manifestações contra a execução da vereadora.
Todos esses fatos se encadeiam e pressionam a opinião pública mundial a olhar o Brasil com desconfiança. A presidenta derrubada por um impeachment sem crime era de esquerda. A vereadora assassinada era de esquerda. O ex-presidente preso sem provas é de esquerda. O presidente atual é de direita e faz um governo radicalmente neoliberal, disposto a privatizar tudo e a destruir todos os direitos sociais. O principal beneficiado pela retirada de Lula do pleito é um candidato de extrema direita. Não é preciso ser um gênio de análise política para ligar os pontos: há interesses poderosos, e profundamente antidemocráticos, agindo com violência para impedir que a esquerda volte a governar o Brasil.
A história da América Latina, por sua vez, também ajuda a explicar o que está acontecendo, porque os fatos se repetem. Nas décadas de 60 e 70, os mesmos setores econômicos, aliados aos mesmos grupos de mídia, e sempre com apoio do governo americano, também adotaram ações antidemocráticas para impedir a população de eleger representantes de ideias progressistas e nacionalistas.
Em suma, todos os fatos conspiram para esclarecer a opinião mundial de que o Brasil enfrenta hoje, por mãos da direita, e com apoio da mídia, problemas muito sérios de ordem democrática. E isso é mais uma fato para ajudar a esquerda nas eleições deste ano.