Denise Assis
(com reprodução de texto do site Tutaméia)
“Deus é brasileiro”! Quantas vezes já ouvimos esta frase?
Pois vamos reafirmá-la. Um dia depois do general Vilas Boas, comandante do Exército, evocar o papel da Comissão da Verdade, para alertar – agora se sabe, pois até então a sua fala causou polêmica – sobre os riscos da intervenção no Rio resultar em tantos abusos quanto foram cometidos na ditadura, eis que um laboratório na Bósnia reafirma o que todos já suspeitavam. É mesmo de Dimas Antônio Casemiro, umas das mais de mil ossadas encontradas na década de 1990, em uma vala clandestina no Cemitério de Perus, em São Paulo.
Ao cruzar dados genéticos da ossada, com os dos parentes de Casemiro, o laboratório pôde constatar que sim, era dele a ossada que por todos esses anos, por manobras políticas e falta de vontade, também política, ficou trancada no Departamento de Medicina Legal, da Unicamp.
É como se eles, os ex-guerrilheiros, continuassem na luta. Agora, para restabelecer a verdade mencionada pelo general. Aos poucos, eles voltam à cena para “assombrar” os que não permitiram punições, esconderam os seus restos mortais e tentaram encobrir as suas histórias.
A notícia da identificação de Dimas foi dada por Ivan Seixas ao site “Tutaméia”, dirigido e alimentado por Eleonora e Rodolfo Lucena, em matéria que passo a reproduzir:
“Os restos mortais acabam de ser identificados por um laboratório da Bósnia, segundo disse Ivan Seixas, cofundador do Núcleo Memória, em entrevista exclusiva ao TUTAMÉIA, O exame revelou compatibilidade genética dos ossos analisados com sangue de parentes de Casemiro.
A partir disso, os especialistas fizeram uma comparação entre o esqueleto encontrado e as características físicas do militante desaparecido durante a ditadura militar.
Os restos mortais dele e de outros combatentes pela democracia foram enterrados sem identificação em vala comum naquele cemitério da zona norte de São Paulo (SAIBA MAIS CLICANDO AQUI)
DIMAS ANTÔNIO CASEMIRO militou no movimento estudantil em Votuporanga (SP), onde nasceu em seis de março de 1946.
Foi corretor de seguros, vendedor de carros e tipógrafo.
De Votuporanga, mudou-se para São Paulo, passando a atuar na Ala Vermelha e, mais tarde, na Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares) e no Movimento Revolucionário Tiradentes, do qual foi dirigente.
Em 1971, Dimas Casemiro foi acusado de ter comandado o justiçamento do industrial Henning Albert Boilesen, presidente da Associgás e da companhia Ultragaz, empresas que financiavam a Operação Bandeirante (Oban) que atuava junto aos órgãos de repressão do Estado.
Não há comprovação da acusação, diz Ivan Seixas, que contou na entrevista ao TUTAMÉIA detalhes da convivência com Casemiro.
Dimas morreu aos 25 anos de idade, em ação perpetrada por agentes do Estado, afirma relatório da Comissão Nacional da Verdade. “Foi fuzilado em uma emboscada”, disse Seixas.
Em 14 de maio de 1996, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) reconheceu a responsabilidade do Estado brasileiro pela morte de Dimas Antônio Casemiro deferindo o seu caso, que foi publicado no Diário Oficial da União em 17 de junho de 1998. Seu nome consta no Dossiê ditadura: mortos e desaparecidos políticos no Brasil (1964-1985), organizado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos.
Segundo relato publicado pela CNV, Dimas Antônio Casemiro morreu em São Paulo (SP) em abril de 1971. De acordo com a narrativa apresentada pelas forças de segurança do Estado durante o regime militar, Dimas Casemiro teria morrido no dia 17 de abril de 1971 atingido por disparo de arma de fogo após ter resistido à voz de prisão dada por agentes do Estado. O confronto teria sido travado em um “aparelho” do MRT, localizado no bairro Água Funda em São Paulo.
A certidão de óbito de Dimas Casemiro, registrada no dia 28 de abril de 1971, apresenta a versão de que ele teria sido morto em via pública no dia 17 de abril de 1971, tendo como causa da morte “choque hemorrágico”.
O documento para requisição de exame de necropsia feito pelo Instituto Médico Legal (IML) confirmou a versão de que Dimas teria morrido durante uma troca de tiros com agentes da repressão.
Pesquisas documentais não localizaram nenhum registro sobre o local onde o corpo de Dimas esteve durante os dois dias que transcorreram desde seu óbito, amplamente noticiado pela imprensa como tendo ocorrido no dia 17 de abril, e a data de solicitação do exame necroscópico pelo IML, no dia 19 de abril.
O laudo do exame necroscópico, assinado pelo médico-legista João Pagenotto no dia 19 de abril, registrou quatro ferimentos causados por arma de fogo no pescoço, braço, mão e coxa. Segundo o documento, o corpo de Dimas teria sido encaminhado para o cemitério de Perus no dia 20 do mesmo mês. Entretanto, seu corpo nunca foi localizado ou identificado.
De acordo com o Dossiê dos mortos e desaparecidos políticos a partir de 1964, elaborado em 1984 pela seção Rio Grande do Sul do Comitê Brasileiro pela Anistia, Dimas foi fuzilado ao chegar a sua casa, corroborando a informação oficial.
No entanto, no livro “Direito à memória e à verdade”, a CEMDP concluiu que Dimas foi preso e o corpo somente deu entrada no IML depois de ter sido publicada a notícia de sua morte nos jornais do dia 18/04/1971. A requisição de exame ao IML, assinada pelo delegado do DOPS, Alcides Cintra Bueno Filho, informa que a morte se deu na rua Elísio da Silveira, 27, no bairro Saúde, às 13 horas do dia 17 de abril. Entretanto, o corpo de Dimas, ainda de acordo com a própria requisição de exame, só deu entrada no IML às 14 horas do dia 19 de abril, tendo sido enterrado às 10 horas do dia 20.
A CEMDP concluiu que Dimas foi torturado entre os dias 17, data em que foi supostamente alvejado, e o dia 19, data do exame da necropsia desmentindo a versão oficial de “morte em tiroteio”.
As fotos do corpo de Dimas mostram lesões na região frontal mediana e esquerda, no nariz e, principalmente, nos cantos internos dos dois olhos, não descritas no laudo necroscópico e indicativas de tortura. As datas mencionadas acima, portanto, não seriam apenas erros ou mera confusão, segundo o relatório da CEMDP, mas uma tentativa de encobrir sua morte sob torturas enquanto esteve sob custódia do Estado brasileiro.”