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Em entrevista exclusiva para O Cafezinho, João Pedro Stédile defende que o ex-presidente Lula busque registro de sua candidatura, com apoio das forças sociais

Denise Assis* Líder do MST e da Frente Brasil Popular, João Pedro Stédile acredita que a saída para a atual crise enfrentada pelo Brasil – “a mais grave das já vividas em 1930, 1960 e 1980 -, depende de uma ampla articulação das forças sociais. Unidas, elas ajudariam a traçar um novo projeto para o […]

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Denise Assis*

Líder do MST e da Frente Brasil Popular, João Pedro Stédile acredita que a saída para a atual crise enfrentada pelo Brasil – “a mais grave das já vividas em 1930, 1960 e 1980 -, depende de uma ampla articulação das forças sociais. Unidas, elas ajudariam a traçar um novo projeto para o país”, defende.

A Frente Brasil Popular é uma espécie de frente ampla, composta por 88 movimentos populares e correntes partidárias. Juntas, essas correntes têm o papel de fazer uma análise constante da conjuntura e traçar cenários buscando soluções.

Em sua opinião, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve buscar o registro de sua candidatura em 15 de agosto, como já anunciou o PT e, mesmo preso, concorra. Embora não acredite que Lula vá ser preso, neste caso, ele é favorável à desobediência civil. “A ideia de que todo povo pode rebelar-se contra leis ou governos que não expressem a vontade da maioria ou que aplicam procedimentos claramente injustos e desumanos não é nenhuma novidade política”, argumenta. “Ela tem sua origem na Igreja”.

O líder do MST vê, porém, grande dificuldade para que isso aconteça no Brasil. “É que a imensa maioria do povo ainda está desorganizada. Então, precisamos unir dois esforços: explicar para ele (o povo) quem são os culpados, seus verdadeiros inimigos de classe, as injustiças do poder judiciário, e ao mesmo tempo organizá-lo para a rebeldia”.

Stédile fala com a autoridade de quem lidera um movimento presente em 24 estados das cinco regiões do Brasil, composto por cerca de 350 mil famílias que conquistaram a terra por meio da luta e da organização dos trabalhadores rurais.

Além de conquistá-las, o MST tratou de utilizar as terras que ocuparam – em geral latifúndios improdutivos – com a produção, nos últimos dois anos, de alimentos saudáveis, cultivados segundo as tradições e costumes do povo, cuidando para o uso racional da água. O resultado já pode ser encontrado em feiras e gôndolas de supermercados, com o selo de produtos orgânicos.

– O momento atual é de muita indefinição na política. Ao mesmo tempo, os movimentos sociais, tanto o MST, quanto o MTST parecem, aos olhos da sociedade, bastante fortalecidos e organizados. A que se deve isto?

– O Brasil vive uma grave crise econômica, que trouxe como consequência uma crise social, com aumento da desigualdade social, do desemprego e da desesperança.  Daí resultou numa crise política, pois a burguesia brasileira deu um golpe midiático-jurídico-parlamentar, para ter o controle absoluto dos quatro poderes, e assim pode jogar todo peso da crise econômica sobre a classe trabalhadora.

O país viveu crise tão grave, antes,em 1930, 60 e 80.   Todas elas nos ensinaram que a saída é de longo prazo, e depende de uma ampla articulação de forças sociais, para aglutinar-se em torno de um novo projeto. Nesses períodos de crise, os setores menos organizados, as massas, ficam “desbaratinadas”.  As organizações políticas que não fizerem a leitura correta da conjuntura, também perdem relevância. Temos aí várias figuras públicas e partidos que não têm o que dizer, ou só dizem bobagem que ninguém leva em conta.

Nós temos enfrentado muitas dificuldades como MST, porque a reforma agrária está paralisada há quatro, cinco anos, sem conquistas reais.  Por isso, também, colocamos energia em construir a FRENTE BRASIL POPULAR, como uma espécie de frente ampla, composta por 88 movimentos populares e correntes partidárias, para nos aglutinarmos, analisarmos permanentemente a conjuntura e decidirmos juntos o que fazer.  É isso que temos feito nos últimos dois anos.

As saídas para essa crise histórica dependerão, ainda, de uma FRENTE maior, que aglutine a maior parte das forças populares, sobretudo as desorganizadas. Por ora, essas forças populares desorganizadas não estão atuando. Porém, já identificaram o Lula como seu símbolo de mudança. Também precisamos conseguir atrair para um projeto de nação, forças sociais que estão ainda isoladas.

Esperamos que nos próximos meses e ano, as massas se ponham em movimento, por indignação e por vontade política de construir um novo projeto de país.   Aconteceu em outros períodos de nossa história. Tenho certeza, voltará a acontecer em breve no Brasil.

 – Em discursos tanto em Porto Alegre, quanto em São Paulo, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e o senador Lindberg Faria pregaram a desobediência civil e o enfrentamento, como ações próprias para o momento. Qual a sua opinião a respeito, e de que forma isto se daria?

– O termo desobediência civil, vem da doutrina da igreja, e defende a ideia de que todo povo pode rebelar-se contra leis ou governos que não expressem a vontade da maioria ou que aplicam procedimentos claramente injustos e desumanos.   Portanto, não é nenhuma novidade política.

Porém, a maior dificuldade para que isso aconteça no Brasil, é que a imensa maioria do povo ainda está desorganizada. Então, precisamos unir dois esforços: explicar para o povo quem são os culpados, seus verdadeiros inimigos de classe, as injustiças do poder judiciário, e ao mesmo tempo organizá-lo, para a rebeldia. E a rebeldia social não advém de nossa vontade política, de nossos discursos, ela depende de fatores psicossociais que regulam o comportamento das massas.  Mas uma hora dessas, ela vai se levantar.

– Depois da condenação em segunda instância, a candidatura do ex-presidente Lula está concretamente ameaçada. Há pouca margem de recursos jurídicos a serem disponibilizados para viabilizá-la. Qual a sua análise sobre este cenário e de que forma, em sua opinião, ela poderia ser garantida?

– A candidatura Lula está assegurada pela lei em vigor no país. Ele tem todo direito a registrar sua candidatura em 15 de agosto, como já anunciou o PT. Ele poderá ser candidato mesmo preso. O que espero, não aconteça.  Já temos jurisprudência de candidatos que disputaram eleições estando na prisão, e ganharam.

Porém, a política, o poder, depende da correlação de forças.  A burguesia e seus paus mandados usam o poder judiciário, como um poder discricionário, monárquico, que a sociedade não tem nenhum controle. Eles rasgaram a Constituição para poder alcançar seus objetivos.  A classe trabalhadora só tem um espaço para exercer seu poder político: a mobilização de rua.  Eu acredito que daqui até as eleições as mobilizações populares aumentarão e exigirão a candidatura do Lula. E a legalidade da candidatura do lula, ao final das contas vai se dar pelo número de votos que ele conseguir.  Se ele tivesse apenas 10% de intenção de votos já estaria esquecido e abandonado pelos partidos. Acontece que o povão, pela via indireta, da pesquisa de opinião, está dizendo que ele seria a única salvação, para reconstruir um projeto de país.  Falta agora esse povão ir para as ruas.

Do ponto de vista jurídico, bastaria que os senhores juízes – aqueles hipócritas que se locupletam com altos salários, auxílios-moradias e puxadinhos de todo tipo para burlar o teto máximo de salário do servidor público, e inclusive sonegar imposto de renda, como já foi calculado – seguissem a Constituição. Os juízes sonegaram mais de 300 milhões de reais.

– Há caminhos, em sua opinião?

Acredito que há muitos instrumentos, e inclusive a possibilidade de um decreto legislativo aprovado pelo congresso, que colocasse ordem na casa… Impedir Lula de concorrer, será jogar o país numa crise ainda mais grave por mais quatro anos. Até as pedras sabem disso.

– Um pouco antes do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em entrevista, o senhor disse que em caso de desfecho desfavorável, o MST poderia se transformar em um exército que bloquearia as estradas federais, paralisando o país. Isto não aconteceu. O que os fez mudar de ideia? No dia da votação do impeachment na Câmara, havia em Brasília um contingente de mais de cinco mil sem-terra acampados na capital, para acompanhar o resultado. Esperava-se que, terminada a votação, com placar desfavorável à linha do movimento, e das alas à esquerda e progressistas vocês saíssem em passeata pela cidade, para demonstrar a indignação pela deposição da presidente. O que os impediu?

– Acontece que nem sempre nossa vontade política se realiza apenas porque temos vontade. Tudo depende da correlação de forças. No caso do impeachment, minha leitura pessoal é de que o povão, não se mobilizou, não quis defender a Presidenta. Primeiro porque achou que era apenas um problema entre os políticos, distante dele, lá em Brasília. Segundo, porque a política econômica do governo Dilma estava errada, e penalizava os trabalhadores. E, portanto, os trabalhadores não viram sentido em defendê-la. Terceiro, porque houve uma avalanche midiática da Globo e da pequena burguesia verde-amarela nas ruas, que assustou o povão.

Por isso não se mobilizaram, e só nós ficamos na vanguarda, os setores mais conscientes. Agora, felizmente o povão está começando a se dar conta de que o golpe não foi contra a Dilma, foi um golpe para a burguesia jogar todo o peso da crise econômica sobre as costas da classe trabalhadora. E ela está pagando a conta, com o desemprego, baixos salários. Temos precarização do trabalho e falta de recursos para educação, creche, professores, saúde, aumento da gasolina e do gás. Daí sua reação, como disse, em favor do Lula.

– O MST se deslocou praticamente em peso para Porto Alegre, para a manifestação de apoio ao ex-presidente Lula. Quais seriam as próximas orientações ao movimento, que sempre o apoiou?

– Primeiro defendemos o direito de Lula ser candidato.  Nós nos mobilizaremos para denunciar sua eventual prisão, como querem o poder judiciário e setores da burguesia brasileira. Ainda que seja contra a Constituição.  A Constituição é clara. Nenhum cidadão pode ser preso, a não ser em fragrante delito, se não for julgado até a última instância, para ele provar sua inocência.  O STF se arvorou do direito de legislar, e disse que ele pode ser preso na segunda instância, mas o Supremo não é a Constituição.  Ele não tem poder nenhum.  A Constituição diz: todo poder emana do povo.   Que juiz foi eleito pelo povo?

E a quem recorrer, se esses juízes não obedecem à Constituição? Espero que os ministros do STF revejam urgentemente esse equívoco.  E a situação é tão ridícula e anticonstitucional, que alguns deles têm dito nas entrelinhas, na imprensa burguesa, que trocariam a liberdade do Lula, desde que ele não concorra.  Francamente… Diria nosso querido Brizola!

Agora, em relação às mobilizações, o MST atua sempre em conjunto coma FRENTE BRASIL POPULAR. Na plenária da FBP tiramos várias atividades, como a jornada nacional contra a reforma da previdência.  Espero, sejamos vitoriosos. A mobilização nacional em torno do dia 8 de março. A mobilização em defesa de o Lula ser candidato como uma questão democrática. E, ainda, em março, teremos o Fórum Mundial alternativo das águas, que provocará muitas mobilizações em todo país em defesa da água para o povo brasileiro, e contra a desnacionalização e apropriação pela Vale, Nestlé, Coca-Cola e empresas mineradoras.

E também tiramos um calendário de pedagogia de massas, que chamamos de CONGRESSO DO POVO.  Nos meses de abril a julho, vamos realizar assembléias de todo o povo, no maior número possível de municípios.  Para ouvi-lo sobre quais são os seus problemas, quem são os culpados e quais as saídas?  Serão tiradas sugestões e propostas de um programa de mudanças. Em junho, faríamos congresso do povo em cada estado e, finalmente, em julho faremos um congresso nacional do povo, em pleno Maracanã, com cem mil delegados de todo o país, para construirmos esse programa unitário de propostas de mudanças.

– Fala-se na participação do senhor nas negociações com vários segmentos da sociedade, para encontrar uma saída que viabilize a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. Como estão esses encontros, e como o senhor tem sido recebido em setores mais conservadores, por exemplo, o das Forças Armadas?

Como membro da frente Brasil Popular me envolvi em muitas articulações com diversos setores da sociedade brasileira. Tanto pelo direito de Lula ser candidato, de termos eleições democráticas, como pela necessidade de construirmos um projeto para o Brasil. E no intuito também de construir uma frente ampla pelas mudanças que o Brasil precisa.  Não tem sido fácil, mas estamos avançando. Temos duas grandes dificuldades: como disse antes, o povão que é ampla maioria de nossa população, não tem representações formais, com quem possamos construir pontes.  Repito: o povão transferiu apenas para o Lula a representação simbólica da política.

A segunda dificuldade são os empresários.  Infelizmente o capitalismo globalizado controlado pelas empresas transnacionais e pelo capital financeiro, destruiu também o que tínhamos ainda de empresariado nacional. Agora é difícil encontrar interlocutores deles. É difícil encontrar entre eles, pensadores, que estejam comprometidos com projetos de desenvolvimento da Nação.  A ampla maioria das empresas, ainda quando são brasileiras, são geridas por CEOs, contratados, que não têm nenhuma visão de país. Apenas pensam em lucros e na porcentagem que será acrescida aos seus polpudos salários. Está aí o nosso querido Bresser Pereira, andando pelo Brasil, pregando a necessidade de um projeto de Nação, sem encontrar interlocução entre os empresários.  Cada vez mais desnacionalizados, rentistas, preferem viver de royalties e de juros, do que pensar o futuro.  Triste. Muito triste!

– Que notícias o senhor tem de setor militar, frente ao quadro atual?

Não sou nenhum especialista em Forças Armadas, mas tenho procurado entender, estudar e tenho lá meus interlocutores, ainda que discretos.   Acho que as Forças Armadas brasileiras na ativa reproduzem a complexidade da sociedade brasileira. Ou seja, eles não têm uma unidade programática, não discutem projeto para o país. São regidos por uma disciplina de guerra, em que todos obedecem aos superiores e os superiores não podem expressar posições políticas. No comando maior temos o ministro do Exército, que apesar do sacrifício de sua saúde, tem se mantido coerente, procurando respeitar a Constituição e compreendendo a gravidade da crise nacional. Um exemplo, quando disse que a sociedade brasileira parecia um navio afundando e sem comando… (escreveu isso no Valor Econômico!). Mas ninguém reagiu.

Acho que eles têm consciência que os golpistas são corruptos e que a burguesia rentista não quer saber de projeto de Nação e do papel histórico das Forças Armadas. Essa classe dominante é colonizada, vende-pátria, e sonha apenas em se locupletar com a venda de nossas riquezas naturais, entregando o petróleo, os minérios, a água, a biodiversidade, nossas terras. E para as Forças Armadas destinam apenas a missão rebaixada de ser capitães-do-mato, Polícia, cuidando de pobre e bandido nas periferias. Precisamos de Forças Armadas altivas, que pensem a segurança nacional, a partir de um projeto de país, em defesa do povo brasileiro e não do lucro das empresas transnacionais.

Acho que a maioria das Forças Armadas na ativa é contra as ideias do Bolsonaro.  Eles sabem que o melhor governo para o projeto de país e para as Forças Armadas foi o governo Lula. Ainda que sejam muito influenciados pela Globo e pela mídia, eles têm juízo e enxergam a realidade do país.

– O senhor acredita na realização de eleições em outubro? Caso elas não saiam, como vocês, do MST, reagirão?

Claro, as eleições acontecerão em outubro.  O sonho da burguesia é ter eleições sem Lula, mas impedir a realização das eleições ou adotar fórmulas esdrúxulas como o Parlamentarismo, seria jogar o país na ilegalidade total.  No caos!

– A candidatura de Lula tem recebido apoios importantes fora do país. Que peso o senhor daria a esses apoios, do ponto de vista do nosso cenário interno?

– Acho que a solidariedade internacional e também as reações da própria imprensa burguesa internacional, ajudam a revelar as “maracutaias” e a insensatez do Poder Judiciário brasileiro.  Isso é muito importante, mas em definitivo o que altera o rumo da historia, é a correlação de forças interna, e para isso o povão precisa entrar em campo.

– O senhor acha possível a união de todas as esquerdas em torno da candidatura do Lula?

Esquerda é um termo genérico. São todas as pessoas que querem mudanças para construir uma sociedade justa e igualitária, onde todos tenham os mesmos direitos e oportunidades. Portanto, esquerda não se resume aos partidos, ditos de esquerda. Os partidos seguem seus ritos eleitorais, e seus interesses de acumular forças para os membros da sigla, nas instituições.  E isso é legítimo, porém, nem sempre representam acúmulo de forças para mudar a sociedade. Acho que a esquerda partidária tem todo o direito, e terá, de ter seus candidatos a presidente. A esquerda como povão que quer mudanças já, está unificada em torno do Lula, que provavelmente vai ganhar as eleições no primeiro turno.

– O ex-ministro Ciro Gomes não quis assinar o manifesto em apoio ao Lula, embora tenha se pronunciado em sua defesa. É possível trazê-lo para uma aliança em prol da candidatura Lula? Como o seu nome seria visto pela militância petista e de esquerda, depois desse episódio?

Ciro deve ser candidato pelo PDT.  Faz bem para democracia e para o debate de projeto para o país. Ele é um homem inteligente, sabe debater ideias, e é importante para a democracia que se candidate a presidente. Não será isso que impedirá a unidade de quem quer mudanças na sociedade. Acho que será um bom ministro das Comunicações do Lula, para enfrentar com coragem a rede Globo, seguindo a tradição deixada pelo saudoso Leonel Brizola.

– O senhor acredita que Ciro Gomes possa ser apoiado pela direita, como uma opção “mais ao centro”?

De jeito nenhum.  As ideias do Ciro são de mudanças. A direita quer ter um candidato que apareça como centro, sendo de direita, mas felizmente não está conseguindo, porque todos os nomes que apresentaram: Alkmin, Hulk, Meirelles, Bolsonaro, não conseguiram enganar o povo. A direita continuará buscando um nome que possa uni-los, mas será difícil. Como analisou o comentarista assumidamente de direita, Reinaldo Azevedo, eles são apenas os tiriricas da burguesia. O problema deles é que o governo golpista que eles criaram não conseguiu enganar o povo.

Em toda história republicana esse foi o governo mais rejeitado. Tem apenas 5% de apoio popular. E, por outro lado, eles se fiavam na GLOBO, e a Globo não consegue mais sozinha controlar os corações e mentes.  Até porque, a Globo não é apenas a reprodutora ideológica da burguesia. Ela se tornou uma das maiores empresas e age em torno do lucro para si.

Dois exemplos para os dois casos.  No primeiro, a maior festa popular do Brasil, o carnaval, que sempre foi influenciado pela Globo. Neste ano tivemos centenas de blocos com temas críticos à burguesia, e o desfile maravilhoso da corajosa Tuiuti, desnudando a própria Globo, como manipuladora dos bate-panela. No segundo caso, a Globo é a maior pressionadora para aprovar a reforma da Previdência, porque ela é sócia de um banco num fundo privado de Previdência, que defende a reforma para atrair os trabalhadores de maior salário para a Previdência privada.  Ou seja, age apenas em proveito próprio.

– Em 1984, os trabalhadores rurais que protagonizavam as lutas pela democracia da terra e da sociedade, no 1° Encontro Nacional, em Cascavel, no Paraná, decidiram fundar o MST, para lutar pela reforma agrária e por mudanças sociais. Desde então, vocês vêm cumprindo esses propósitos à risca, realizando ocupações, mas perdendo muitos quadros importantes. Como evitar tantas perdas?

Os conflitos sociais são resultado de uma sociedade extremamente desigual. O Brasil é a sociedade mais injusta e desigual do mundo, onde apenas seis bilionários concentram mais riqueza do que 104 milhões de brasileiros. O MST se organiza para lutar contra a desigualdade que se expressa na sociedade e na propriedade da terra.  Ninguém em sã consciência tem cem mil hectares, dizendo que foi fruto de seu trabalho. No Brasil temos, segundo cadastro do INCRA (2014), cerca de 370 latifundiários que são proprietários de áreas superiores a cem mil hectares cada um, começando pelo ministro da agricultura, (Blairo Maggi), ou pelo Presidente do senado! Eles controlam 138 milhões de hectares. Isso seria suficiente e sobraria terra para os quatro milhões de famílias sem terra. Ou seja, para uma reforma agrária no Brasil bastaria desapropriar apenas 365 famílias com mais de cem mil hectares, e teríamos terra e trabalho para todas as quatro milhões de famílias sem-terra no país.

A violência sempre foi praticada pelo latifúndio, para manter seus privilégios e usar seus capangas. Isto começou com os capitães-do-mato, depois jagunços, pistoleiros, e quando esses não funcionam usam a Policia Militar. Às vezes até como testa-de-ferro, como fez o Sr. Michel temer, que usou um coronel da PM de São Paulo para ser o seu laranja de fazenda, de mais mil hectares. E nenhum deles tem renda suficiente ou salário para comprovar a compra.

O MST apreendeu com as lutas históricas de nosso povo que a principal forma de evitarmos a violência contra os trabalhadores é atuarmos sempre de forma coletiva e com muita gente, com as massas. Na nossa luta pela reforma agrária, infelizmente, quem brincar de liderzinho ou de vanguarda solitário, acaba sempre no cemitério.

– Além das ocupações e a luta no campo, o MST tem expandido um importante trabalho pela produção de comida saudável, e já se vê em feiras e mercados os produtos orgânicos produzidos por vocês. Quais são os números desta produção? Ela já é significativa?

O MST em seus mais de trinta anos de luta e de construção coletiva, foi apreendendo com o povo brasileiro, foi mudando suas táticas de luta, e foi ajustando seu programa doutrinário. No último congresso nacional do MST (o sexto) construímos um programa que chamamos de reforma agrária popular.

Por quê? Porque agora, no atual estágio do capitalismo, não interessa mais para a burguesia industrial e seus governos realizar a reforma agrária clássica, feita na maioria dos países industrializados, no hemisfério norte. Aqui no Brasil chegamos mais próximo dessa reforma agrária, com a proposta de CELSO FURTADO, no projeto de lei apresentado em março de 1964.  E, mesmo assim, fomos derrotados.

Agora, é preciso mudar os paradigmas. Não basta dividir a terra do latifundiário.  É preciso ter como princípio, objetivo maior, o uso da terra para produção de alimentos saudáveis e para todo o povo. O agronegócio, o capital, não quer produzir alimentos. Eles querem produzir apenas commodities para exportação e lucro. E usam intensamente veneno e expulsam a mão-de-obra do campo.

Nosso projeto tem como meta produzir alimentos saudáveis, com a matriz de agroecologia, sem venenos, utilizando muita mão-de-obra e levando para o interior a agroindústria. Única forma de conservar os alimentos e aumentar a renda dos camponeses.

Queremos, portanto, um novo modelo de agricultura que respeite o meio ambiente, e não afete o clima, a água, como está acontecendo agora. Queremos um programa colado com a universalização da educação. Todos os camponeses e seus filhos têm direito à escola, em todos os níveis.  E a escola precisa ir ao campo, sem que o povo tenha que vir para a capital para estudar.

Queremos um programa que valorize a nossa cultura, a nossa música, nossa culinária, como queriam Câmara Cascudo, Darcy Ribeiro e tantos outros.  Por tanto, não é mais uma reforma agrária camponesa, agora deverá ser uma reforma agrária popular, que interesse e beneficie a todo povo.

*Jornalista e colunista de O Cafezinho

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Denise Assis

Denise Assis é jornalista e autora dos livros: "Propaganda e cinema a Serviço do Golpe" e "Imaculada". É colunista do blog O Cafezinho desde 2015.

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Ilma Cordeiro de Macedo

15/02/2018 - 13h36

Ainda temos muitos brasileiros que valem a pena. Temos que apoia-los e nos engajarmos nessa luta que é nossa. Parabéns ao Stédile e ao MST.


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