(Ludwig Von Mises, o ídolo máximo dos liberais; eles precisam da sua ajuda!)
Por Pedro Breier
O economista sul-coreano Ha-Joon Chang sustenta, no livro Chutando a Escada: A Estratégia do Desenvolvimento em Perspectiva Histórica, que “a evolução econômica dos países atualmente desenvolvidos difere extraordinariamente dos procedimentos que eles agora recomendam às nações mais pobres”, como consta na sinopse da obra.
Enquanto recomendam que os países periféricos desregulem suas economias, abram seus mercados e mantenham o tamanho do Estado no menor patamar possível, eles próprios tornaram-se ricos a partir de uma forte atuação estatal na econommia.
No célebre debate entre Ciro Gomes e Rodrigo Constantino – a maior sova argumentativa que este colunista já assistiu – Ciro demonstra com facilidade que o que os EUA e Europa pregam como boas práticas econômicas ao resto do mundo só vale da porta para fora: em 2006, ano do referido debate, os EUA já tinham torrado mais de 1 trilhão de dólares na guerra do Iraque. Uma guerra com fins puramente econômicos, já que até hoje ninguém achou arma de destruição em massa no país que foi destruído pelo Tio Sam.
Uma bela cifra para quem arrota aos quatro ventos a importância da austeridade, não?
E este é apenas um exemplo. A economia chinesa, outro exemplo, é fortemente estatizada e o país mantém as maiores taxas de crescimento do mundo há muitos anos.
Uma análise histórico-econômica apenas superficial deixa evidente que nenhum país do planeta desenvolveu-se adotando o receituário econômico liberal.
Entretanto, como a mídia mundial é a porta voz dos interesses do capital, a historinha de que a abertura dos mercados é a chave para o crescimento dos países periféricos encontra eco em milhões, quiçá bilhões de desavisados mundo afora.
Diante deste quadro, o Cafezinho está lançando, neste exato momento, por meio desta exata coluna, a campanha “Ajude um amigo de direita”!
Explique para aquele amigão, tio, brother, camarada que se diz liberal na economia, com todo o carinho, que ele está sendo enganado.
Mande para a sua conhecida que vive sendo ludibriada pelos seguidores do deus Mises textos de economistas que não repetem, como papagaios, o samba de uma nota só liberal.
Presentei-o(a) com o livro de Ha-Joon Chang.
Afinal, pressupõe-se que a maioria das pessoas que acreditam nas balelas liberais o fazem de boa fé.
Em geral não devem ser gente como o milionário Armínio Fraga, economista de estimação da direita brasileira, que afirmou esta semana em um artigo na Folha que a ONU, o Banco Mundial, o FMI, a OMC e a Otan são todas entidades boazinhas que “tinham por compromisso a difusão do Estado de Direito, a democratização, a preservação de mercados abertos e a promoção de pactos de segurança coletiva, prevenindo a eclosão de guerras catastróficas e reprimindo o nacionalismo econômico que as inspira.”
Fraga e sua canalhice intelectual (ele sabe os verdadeiros objetivos destas instituições) foi devidamente destruído por Gilberto Maringoni. A Folha não quis publicar a resposta de Maringoni mas a Fórum publicou.
O economista Paulo Nogueira Batista Jr., que foi representante do Brasil no FMI por 8 anos e no banco dos BRICS por 2, deu uma entrevista incrível no Barão de Itararé, ontem. Recomendo vivamente que vocês assistam (aqui).
A última pergunta do dia foi a do Cafezinho: indaguei Nogueira sobre as perspectivas de superação do pensamento único liberal em matéria de economia. Em sua resposta, ele sugeriu que abandonemos a expressão “pensamento único”
porque não é pensamento. É único, mas não é pensamento. (…) Nós temos uma cultura econômica criada nos Estados Unidos no pós guerra que é um desastre. É um descaminho de décadas. (…) Esse chamado pensamento único é estruturalmente incapaz de lidar com problemas concretos. Então os economistas americanos, quando descem do Olimpo, das torres de marfim para a realidade econômica abandonam as doutrinas econômicas ensinadas nas universidades.
Nogueira, exímio orador e contador de causos, relatou um episódio para demonstrar como funciona o pensamento único na prática.
Antes de uma reunião da cúpula dos BRICS em 2017, Nogueira foi instado, já que era responsável pela área de pesquisa do banco dos BRICS, a fazer um trabalho que contribuísse para a formação de uma visão dos BRICS sobre a economia internacional.
Ele apresentou o trabalho em uma reunião realizada em Washington, na qual estavam integrantes do 3º e 4º escalões dos ministérios e bancos centrais dos países dos BRICS. O primeiro a pedir a palavra após a apresentação do trabalho foi um delegado brasileiro, representante do ministério da Fazenda, que passou 20 anos nos EUA e foi trazido para trabalhar com Henrique Meirelles. A inacreditável manifestação do cidadão, segundo Nogueira:
Não vejo por que o banco tem que trabalhar nesses temas. Porque, afinal, nós já temos o relatório do FMI, que já é mais do que suficiente.
O brasileiro representante do nosso banco central, economista formado nos EUA, seguiu a mesma linha: “nós temos também os relatórios dos bancos centrais, porque o banco dos BRICS vai se meter nisso?”
Em sua réplica, Nogueira teve que explicar o óbvio ululante:
Eu trabalhei 8 anos nesse prédio aqui (nós estávamos no prédio do FMI). Os relatórios do FMI são bons, são úteis, mas eles têm um viés, que nós, diretores dos BRICS, inclusive combatemos aqui, discutimos aqui.
Após contar o episódio, Nogueira arrematou: “É constrangedor ter que dizer o óbvio, não é? Olha o nível a que caiu o governo brasileiro.”
De fato, é constrangedor ter que dizer o óbvio. Mas o óbvio, nestes tempos alucinados em que vivemos, pode ser libertador.
Portanto, tentemos abrir os olhos dos que acreditam na papagaiada liberal e participemos da campanha Cafezinhística “Ajude um amigo de direita”!
Pouco a pouco faremos com que o pensamento único, que já não é pensamento, deixe também de ser único.