O socialismo avança no centro do imperialismo

Quando algum coxinha lhe perguntar em que país o socialismo deu certo, você pode facilmente responder: Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, França e Japão…

Todos esses países tem (ou tiveram) programas de governo profundamente socialistas. Os EUA, por exemplo, chegaram a ter, por décadas, o maior imposto sobre herança do planeta, de 77%, o que é evidentemente uma lei socialista. O problema é que eles querem o bem estar socialista apenas para si mesmos, e que se dane a parte pobre do mundo.

A reportagem do DW, uma autarquia pública alemã (socialista, portanto), sobre o avanço socialista nos EUA está em linha com artigo que publicamos há pouco no Cafezinho.

Se eu fosse um pouco menos modesto, poderia até acreditar que a gente pautou o DW…

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No DW

Sob Trump, socialismo avança nos Estados Unidos

Enquanto aprovação a republicanos e democratas cai, socialistas experimentam aumento de popularidade. Eleição de Trump e ícone Bernie Sanders impulsionaram tendência, sobretudo entre jovens eleitores.

No fim do primeiro ano de mandato, apenas 39% dos americanos aprovavam o trabalho feito pelo presidente Donald Trump. Isso é menos do que obteve qualquer outro presidente americano, nesse mesmo momento, em ao menos 40 anos. Seus oponentes, os democratas, não estão muito melhor. Segundo uma pesquisa do fim de 2017, apenas 37% dos americanos têm uma opinião favorável sobre os políticos do partido.

Para encontrar uma corrente política que não teve baixas no ano que passou é necessário dar uma olhada para a esquerda política americana. Organizações socialistas, há muito relegadas às margens da popularidade e influência ou até mesmo perseguidas pelas suas posições, estão experimentando um considerável aumento de popularidade desde a chegada de Trump à Casa Branca.

Uma organização em especial viu um salto no seu número de filiados. Fundada em 1982, a Socialistas Democráticos da América (DSA) manteve cerca de 6 mil membros pagantes ao longo de sua história. Hoje afirma ter cerca de 25 mil filiados de carteirinha, triplicando de tamanho em apenas um ano. Isso significa que ela é a maior organização socialista, em número de filiados, desde o fim da Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos.

“Depois da eleição de Trump, explodimos em tamanho”, afirma a diretora nacional, Maria Svart. Ela atribui o crescente interesse pela DSA não apenas à reação adversa a Trump como também ao fracasso do Partido Democrata em oferecer uma oposição ao presidente republicano. “Nossa organização é uma alternativa para setores há muito negligenciados pelos democratas”, diz Svart.

Espectro amplo

A DSA não é um partido político, mas uma organização com membros pagantes, muitos dos quais são voluntários que apoiam políticos de esquerda, sindicatos ou campanhas, como a que pressiona por um sistema de saúde estatal. A organização usa a expressão “socialismo democrático” para se distanciar de governos socialistas autoritários, como a antiga União Soviética.

Entre os membros famosos da DSA estão os filósofos Cornel West e Noam Chomsky e a escritora Barbara Ehrenreich. A DSA se considera uma organização socialista de espectro amplo, o que significa que seus membros incluem desde pessoas que simpatizam com a esquerda democrata até leninistas.

Nas eleições de novembro de 2017, 15 candidatos apoiados pela DSA conquistaram mandatos em governos estaduais e municipais em todo o país. Alguns concorreram pelo Partido Democrata, outros como independentes. Em alguns casos, a DSA apoia candidatos do Partido Democrata, mas isso não significa que haja algum tipo de relação formal entre as duas organizações. Membros da DSA dizem que os democratas são reticentes no apoio a socialistas em geral. Questionado, o Partido Democrata não comentou.

A DSA também não é a única organização de esquerda a ver seu número de filiados aumentar. Brian Bean, da Organização Internacional Socialista, diz que sua instituição cresceu 40% no ano passado. Duas mil pessoas participaram da conferência anual socialista da organização em julho de 2017, uma alta de 30% em relação ao ano anterior.

“Principalmente os jovens estão vendo o socialismo de maneira mais positiva”, comentou Bean. A Organização Internacional Socialista é bem menor que a DSA – e também bem mais à esquerda.

O ícone Bernie Sanders

Poucos políticos nos Estados Unidos se intitulam socialistas, com uma notória exceção: o senador Bernie Sanders. Ele se lançou à presidência como um democrata, em 2016, desafiando Hillary Clinton nas primárias do Partido Democrata e descrevendo a si mesmo como um “socialista democrático”.

O rótulo não parece tê-lo prejudicado: uma pesquisa de outubro de 2017 apontou Sanders como o político mais popular dos Estados Unidos, com 53% de aprovação – o único político de alcance nacional visto de maneira favorável por uma maioria de americanos.

Apesar de ele nunca ter sido membro da DSA, Sanders reivindica fazer parte de sua tradição. Segundo Margaret McLaughlin, presidente do escritório de Washington da DSA, Sanders – intencionalmente ou não – levou milhares de jovens para a organização desde a vitória de Trump.

“Acho que apenas a associação com o nome – a similaridade entre a forma como Bernie se refere a si mesmo e a nossa organização – levou muitas pessoas que estavam entusiasmadas com o que Bernie dizia a se unirem a nós”, comenta.

Popularidade entre os jovens

Os Estados Unidos tiveram uma relação tensa com o socialismo ao longo da sua história. Em 1920, o candidato do Partido Socialista Eugene Debs ganhou cerca de 1 milhão de votos – o único porém é que ele estava na cadeia. Nos anos 1950, o Congresso, liderado pelo senador Joseph McCarthy, levou socialistas americanos à Justiça por causa de suas relações reais ou inventadas com a União Soviética. Desde então, os socialistas não têm uma presença política significativa na política dos Estados Unidos.

Para alguns analistas, a popularidade de Sanders e o recente crescimento da DSA representam uma nova era de aceitação do socialismo nos Estados Unidos.

“Eu cresci nos anos 1980, quando não havia palavrão pior na política americana do que ‘socialismo'”, comenta o professor de história Jason Martinek, da New Jersey City University. “Agora não é mais assim. A geração do milênio, que não tem a bagagem de Guerra Fria de seus pais ou avós, parece mais aberta às ideias socialistas.”

De fato, 51% dos americanos entre os 18 e os 29 anos de idade disseram que preferem viver numa sociedade socialista ou comunista do que numa capitalista ou fascista, segundo uma pesquisa de 2017.

O historiador Eric Foner, da Universidade Columbia, confirma que há um interesse maior pelo socialismo entre os jovens. Mas, segundo ele, o socialismo de Sanders tem mais a ver com a social-democracia europeia do que com o socialismo histórico.

“Hoje em dia, quando as pessoas falam em socialismo, elas costumam ter em mente uma versão melhorada do New Deal,” explica Foner, referindo-se à onda de investimentos em infraestrutura e serviços sociais ocorrida depois da Grande Depressão, nos anos 1930, e impulsionada pelo presidente – democrata – Franklin Delano Roosevelt.

Muitos socialistas acreditam que seu maior apoio está na nova geração de eleitores. “Muitos dos comunistas no Twitter têm menos de 18 anos porque eles não associam nada à União Soviética”, diz McLaughlin.

Para a direita, pode parecer assustador que, para muitos jovens americanos, a palavra “socialista” não tenha uma conotação negativa. Para a esquerda, é uma boa notícia. “Estamos saindo aos poucos da Guerra Fria”, comenta McLaughlin.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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