O judiciário aderiu a uma agenda conservadora e autoritária com uma euforia tão pouco sensata, que nada parece capaz de sensibilizá-lo.
O único juiz do Supremo que, pelo jeito, se manifestou contra as decisões jurídico-policiais por trás do suicídio do reitor, foi Gilmar Mendes, justamente aquele que, nesses anos todos, mais abusou da própria autoridade, para investir, sempre com apoio entusiástico da mídia, contra o governo popular, partidos de esquerda e movimentos sociais.
Durante o julgamento do mensalão, Gilmar foi um dos dragões mais ferozes em defesa da condenação sem prova, um dos que mais usou, sem nenhum pudor, o ódio político como critério de justiça, e que mais soube explorar a falta de caráter e a venalidade da mídia corporativa para corroborar suas próprias decisões jurídicas.
E hoje, quando, num salto mortal triplo-escarpado de casuísmo político, Gilmar Mendes se arvora defensor do garantismo penal, pede limites para o arbítrio judicial e se posiciona contra esse regime exceção instaurado pela aliança da mídia com o judiciário, o establishment que ele mesmo, Gilmar, ajudou a construir, se volta contra o próprio criador.
No entanto, quem está certo, neste momento, é Gilmar Mendes, e não o establishment fascista-midiático!
É o mesmo caso dos eleitores de Bolsonaro que fazem críticas a Globo.
Não são apenas os filhos se rebelando contra o pai, ou criaturas se voltando contra o criador, são irmãos xipófagos disputando qual das cabeças vai dar as ordens!
Desde que o establishment imperialista, bancado pelo Departamento de Estado, petroleiras e fundos abutres continuem distribuindo prêmios e os convidando para seminários no Wilson Center, os juízes brasileiros estão determinados a levar o país a mergulhar em abismos cada vez mais profundos.
O deputado Wadih Damous resumiu a situação numa frase trágica: o Supremo não é mais guardião da Constituição e sim do Estado de Exceção.
O país está sendo sufocado com a quantidade crescente de casos de autoritarismo judicial. E o pretexto de que era para “combater a corrupção” se desfaz na realidade: aumentaram as vendas de sentença. E uma das operações judiciais onde há mais corrupção, abuso de poder e extorsão contra empresários é justamente a Lava Jato, transformada numa “instituição” à parte na sociedade brasileira.
O ministro Luiz Edson Fachin, do STF, participou ontem de um evento no Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF4), aquele mesmo que julgará Lula em segunda instância e que poderá decretar (pela enésima vez, nos últimos tempos) o fim da nossa democracia: porque condenar sem provas o principal candidato presidencial apenas para inviabilizá-lo politicamente nada mais é do que mais um golpe sujo contra o direito político de todos os brasileiros.
Pois bem, e o que disse Fachin? Levou alguma palavra de conforto aos milhares de brasileiros que estão preocupados com o avanço do fascismo, incluindo o fascismo judicial, que, historicamente, sempre veio antes do fascismo político propriamente dito?
Na vizinha Santa Catarina, na aprazível e bucólica Florianópolis, um reitor querido pela comunidade acadêmica, amigos e familiares, foi “suicidado” pelo regime de exceção, que decretou sua prisão arbitrária, cautelar, sem provas, sem direito à defesa, e depois proibiu-lhe, igualmente sem nenhum escrúpulo, que adentrasse a universidade que era toda a sua vida.
Os togados em Porto Alegre, presentes ao VI Fórum Nacional de Juízes Federais Criminais (Fonacrim), promovido pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), trouxeram alguma palavra de solidariedade aos milhares e milhares de brasileiros, que, assim como o reitor, são presos e perseguidos injustamente por um judiciário classista, reacionário e midiático?
Não.
Ao contrário, o representante do STF, o ministro Luiz Edson Fachin, que poderia jogar um pouco de luz naquele ambiente envenenado de hipocrisia e egoísmo corporativo, chegou lá disposto a jogar o seu punhado de livros na fogueira do autoritarismo.
O que disse Fachin, e o que disseram as principais “autoridades” presentes, como os desembargadores do TRF4 e membros da Ajufe, organizadora do congresso?
Na página do TRF4, há uma matéria sobre o evento, que reproduzimos abaixo.
Voltamos em seguida.
No site do TRF4
Ministro Fachin: a extinção do foro privilegiado urge!
09/10/2017 17:52:05
VI Fonacrim reuniu ministros e magistrados federais na sede do TRF4
Juiz Roberto Veloso (E), presidente da Ajufe, falou sobre os 45 anos da entidade
Deputado Federal Rodrigo Pacheco (D), que preside a CCJ da Câmara dos Deputados, participou do evento
Antes da abertura do Fonacrim, os desembargadores Thompson Flores, presidente do TRF4, Ricardo Pereira, corregedor da 4ª Região, e Fernando Quadros receberam os ministros Fachin, do STF, e Joel Paciornik, do STJ, e o presidente da Ajufe, juiz Roberto VelosoO ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Edson Fachin esteve hoje (9/10) no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) participando do VI Fórum Nacional de Juízes Federais Criminais (Fonacrim), promovido pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
Fachin, que é o relator dos processos da Operação Lava Jato no STF, afirmou que cabe ao Poder Judiciário fazer valer a Lei Penal igual para todos. “O foro privilegiado é uma exceção não justificada no sistema republicano e sua extinção urge!”, declarou o ministro.
Fachin apontou a seletividade do Direito Penal brasileiro como uma característica que precisa ser combatida. “Em regra, temos um sistema injusto, seletivo e desigual entre o segmento social mais abastado e aquele dos cidadãos desprovidos de privilégios”, analisou Fachin.
O ministro defendeu com veemência que a Lei Penal deve ser igual para todos, chamando a atenção para os excessivos recursos utilizados pelas defesas das classes privilegiadas, “que acabam por perpetuar as causas penais e levar os processos à prescrição”.
Ele reconheceu que cabe às cortes superiores firmarem o entendimento de que a execução da pena deve ocorrer já em segunda instância. “A inefetividade da Justiça em certos segmentos sociais tem a causa mais evidente na morosidade da prestação jurisdicional, com um sistema recursal irracional”, afirmou.
Fachin reafirmou a importância da liberdade de expressão e da imprensa livre e referiu o fim da invisibilidade do juiz como uma herança do século vinte. “Atualmente, o magistrado precisa prestar contas à sociedade e à ordem jurídica do país”. Ele reconheceu que muitos avanços recentes na prestação jurisdicional se devem à persistência dos juízes de primeiro grau, acompanhados pelos julgadores da segunda instância.
O ministro concluiu dizendo que os avanços na aplicação da Lei Penal são visíveis e que o aprimoramento do sistema está sujeito a altos e baixos até atingir um balizamento. Ele frisou que a Constituição escolheu o Direito Penal como instrumento de tutela e proteção dos direitos fundamentais e apontou a importância da independência do Ministério Público e de institutos como o da colaboração premiada, que definiu como um “importante meio de produção de prova”.
Fachin finalizou conclamando os colegas a seguirem com determinação e persistência: “cabe a nós, magistrados, impor resposta aos que tiverem seus crimes comprovados. Devemos estar conscientes que a parcela privilegiada pela seletividade do sistema penal se empenha em fazer crer que estamos colocando em perigo garantias individuais, mas devemos seguir adiante, ainda que falhas possam ocorrer. Os tempos de agora são íngremes e precisamos seguir agindo com ousadia, temperança, confiança, serenidade e firmeza”.
VI Fonacrim
O desembargador federal do TRF4 Fernando Quadros da Silva é coordenador do VI Fonacrim. O evento é promovido pela Ajufe e objetiva debater e propor soluções práticas para os rumos da Justiça criminal brasileira. Quadros abriu o fórum apontando a relevância do Direito Penal na situação atual do país.”É imprescindível que nós, juízes, façamos um debate sobre o tema, mantendo a distância de paixões político-partidárias”.
O presidente do TRF4, desembargador federal Carlos Eduardo Thompson Flores, falou que é um orgulho para a corte sediar esse evento, ressaltando a importância de os magistrados debaterem e contribuírem nas reformas dos códigos, por serem eles “os que usam, atualizam e dão vida aos textos legais”. Thompson Flores criticou a falta de participação dos juízes na confecção do novo Código de Processo Civil, dizendo que sem a experiência daqueles que aplicam a legislação, existe a possibilidade de que as leis nasçam mortas.
O presidente da Ajufe, juiz federal Roberto Carvalho Veloso, lembrou que o VI Fonacrim homenageia os 45 anos da Ajufe, sendo a entidade uma defensora do Poder Judiciário. “O Judiciário é um dos pilares da democracia e seu enfraquecimento só interessa àqueles que tramam em segredo contra a Justiça do país”, declarou Veloso.
É tudo tão grotesco que não sei nem por onde começar. Vamos começar pelo final. O presidente da Ajufe, o juiz federal Roberto Carvalho Veloso declarou que o “judiciário é um dos pilares da democracia e seu enfraquecimento só interessa àqueles que tramam em segredo contra Justiça do país”.
Esses juízes parecem saídos de um romance barato do século XIX. A sua capacidade de produzir clichês hipócritas e cínicos é realmente assombrosa.
Que o judiciário é um dos pilares da democracia, não tenho dúvidas. O problema é que a recíproca não é verdadeira. A democracia não parece ser um dos pilares do judiciário.
É um caso de amor não correspondido. A democracia pode até amar o judiciário – embora disso eu tenha sérias dúvidas. Mas definitivamente o judiciário não ama a democracia. Se amasse, o judiciário, ou para ser mais exato, os juízes que se arvoram “donos” do judiciário, deveriam defender que o judiciário experimentasse um banho de democracia: que mais juízes fossem eleitos, que o Conselho Nacional de Justiça tivesse mais membros eleitos pela sociedade civil, e que os concursos para juiz fossem, da mesma forma, profundamente democratizados.
Em outras palavras, o judiciário só poderá ser um “pilar para a democracia” se ele também for democrático, o que não é o caso.
No caso brasileiro, o judiciário é o coveiro da nossa democracia, e não um “pilar”. Juízes tem derrubado, prendido, suspendido, perseguido, prefeitos, governadores, presidentes, deputados, senadores, vereadores, reitores, empresários e cidadãos comuns, com uma leviandade de fazer corar o comandante máximo da Coréia do Norte.
Quanto à acusação, pelo presidente da Ajufe, contra “aqueles”, sinistros homens das sombras, que “tramam em segredo contra a justiça do país”, eu gostaria de me incluir nessa. Visto a carapuça alegremente. Só não concordo com essa história de tramar “em segredo”. Eu falo abertamente, em vídeos diários, posts, entrevistas, na rua, nos bares, em casa.
Entretanto, o que o presidente da Ajufe chama de “enfraquecimento do judiciário”, eu chamaria de fortalecimento da democracia, das garantias do cidadão, de seus direitos políticos e jurídicos, contra os arbítrios dos judiciário.
A frase de Veloso embute um terrível vício de origem: ele, assim como boa parte dos juízes, se confunde com o próprio judiciário, como se a instituição lhe pertencesse.
O judiciário não pertence a Ajufe, Veloso. O Judiciário pertence ao povo. E quando um juiz viola o direito de um cidadão, rico, pobre, sem-terra, grande empresário, um político desconhecido ou o maior líder popular do país, ele está violando o direito do povo.
A sua frase, Veloso, pode ser facilmente voltada contra si mesmo. Você e seus pares, bêbados de mídia e autoritarismo, é que “tramam em segredo” pelo enfraquecimento do judiciário.
Cada vez que um juiz se corrompe com prêmios, elogios na imprensa, afagos da comunidade privilegiada que ele frequenta, ele está “enfraquecendo” o judiciário.
Não são os críticos do judiciário que o enfraquecem, e sim os seus áulicos! A crítica que, nós, cidadãos, fazemos ao judiciário é para, ao contrário do que pensa o presidente da Ajufe, fortalecê-lo, porque o autoritarismo judicial em curso é que vem minando o prestígio que o judiciário ainda possuía.
O judiciário é nosso, Veloso! Não é de Sergio Moro, não é de Fachin, não é do TRF4, não é do juízes. O judiciário, assim como a democracia, pertence exclusivamente ao povo e a cada um dos cidadãos!
Mas vamos ao assunto principal do post: a presença de Fachin no seminário promovido pela Ajufe no TRF4. Todas as suas frases, ao menos aquelas recolhidas pela assessoria de imprensa do TRF4, são bizarras.
Para não me perder, eu vou reproduzir o texto de novo, mas desta vez fazendo comentários intercalados, entre colchetes e em negrito.
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Fachin, que é o relator dos processos da Operação Lava Jato no STF, afirmou que cabe ao Poder Judiciário fazer valer a Lei Penal igual para todos. “O foro privilegiado é uma exceção não justificada no sistema republicano e sua extinção urge!”, declarou o ministro.
[Primeira cretinice do ministro. Diante de um STF acovardado e submetido aos ditames da grande mídia, o “foro privilegiado”, cujo nome certo é foro especial, só é privilegiado quando o cidadão é do PSDB ou vem protegido por essa capa invisível tecida, nas sombras, pela grande mídia. Se o sujeito estiver no caminho de uma estratégia qualquer de lawfare chancelada pela mídia, o “foro privilegiado” se converte, automaticamente, numa armadilha, porque ele estará em mãos de juízes obedientes às forças inimigas e não terá chance de recorrer a mais ninguém. Que o diga José Dirceu, Genoíno e todos os publicitários condenados no julgamento da Ação Penal 470].
Fachin apontou a seletividade do Direito Penal brasileiro como uma característica que precisa ser combatida. “Em regra, temos um sistema injusto, seletivo e desigual entre o segmento social mais abastado e aquele dos cidadãos desprovidos de privilégios”, analisou Fachin.
[Segunda cretinice, tingida de um populismo barato, autoritário e profundamente hipócrita. A Lava Jato inaugurou, de fato, um novo tipo de democracia judicial, que é: barbárie para todos. Ao invés de revisar as violências cometidas pelo Judiciário contra as camadas mais humildes da população, a instituição passou a usar o mesmo tipo de violência contra alvos seletos das elites empresariais e políticas, desde que estas violências fossem defendidas pela mídia, naturalmente. Prisões cautelares por tempo indeterminado e negação sistemática de habeas corpus foram usadas como forma de coação para que réus fizessem as delações “premiadas” exatamente nos termos que procuradores e juiz desejavam. Um senador foi preso, de maneira ilegal, também neste sentido: para coagi-lo a delatar e “mudar de lado”. Vazamentos ilegais foram feitos com objetivo explicitamente político de comover a opinião pública. O próprio TRF4, num de seus despachos favoráveis aos crimes de Sergio Moro, decretou o estado de exceção, ao dizer que a Lava Jato tinha direito a tomar medidas “excepcionais”. A condução coercitiva, não prevista no código do processo penal, a menos que realizada após recusas sistemáticas e injustificadas do réu em comparecer em juízo, passou a ser adotada como um novo “normal”. Centenas de importantes juristas, inclusive alguns com grande projeção internacional, como Luigi Ferrajoli, se manifestaram duramente contra essas medidas, mas como isso não saiu na Globo, então os excelentíssimos ministros do STF, como Luiz Edson Fachin, fingem que não existiram. O discurso de Fachin, além disso, traz o insuportável fedor da hipocrisia: o tal “sistema injusto” criticado por ele vem sendo sustentado, fundamentalmente, pelo judiciário, principal sustentáculo do latifúndio, da violência policial e do golpe. O povo votou numa presidente que lutava contra injustiça e que foi derrubada por um golpe jurídico-midiático-judicial que implementou um regime voltado exclusivamente em favor dos ultrarricos. Fachin e todo STF, e boa parte do judiciário, foram cúmplices desse crime.]
O ministro defendeu com veemência que a Lei Penal deve ser igual para todos, chamando a atenção para os excessivos recursos utilizados pelas defesas das classes privilegiadas, “que acabam por perpetuar as causas penais e levar os processos à prescrição”.
[Aí o ministro Fachin espeta em sua própria toga o brochinho do fascismo judicial, que, como todo fascismo, precisa se pintar de cores populistas. Dizer que a “Lei Penal deve ser igual para todos” é apenas uma maneira doentia de praticar exatamente o contrário do que diz a frase: primeiro por se tratar de uma frase idiota e sem sentido. A razão de ser de qualquer processo penal é justamente aplicar, de maneira individualizada e humana, penas diferenciadas e originais, a depender de uma avaliação criteriosa do próprio juiz, após ouvir atentamente acusação e defesa. A Lei Penal não pode ser igual para todos porque os casos penais são inteiramente diferentes entre si. Condenar uma pessoa paraplégica, como já vimos acontecer, a anos de regime fechado, porque foram encontrados algumas gramas de maconha em seu quarto, é apenas um exemplo caricatural desse “lei penal igual para todos”. Os brasileiros não querem que o judiciário purgue seus crimes de violência estendendo-os a alguns bodes expiatórios da classe política e do empresariado, como fez na Lava Jato. Os brasileiros pedem uma justiça branda, ágil e justa, como preconizava Cesare Beccaria. Quanto aos “excessivos recursos”, eles apenas são “excessivos” para os juízes preguiçosos, que aparentemente querem continuar recebendo seus gordos salários sem precisar trabalhar, porque, para os réus ainda não condenados, e que, portanto, ainda são inocentes até prova em contrário, cada recurso é uma oportunidade de fazer a luta sagrada por sua honra e liberdade. No caso de um homem inocente, os recursos nunca serão excessivos. Além do mais, Fachin sabe muito bem que os “recursos” podem ser julgados rapidamente, desde que os magistrados assim o desejem. Se prescrevem, é porque interessa que prescrevam. A demora do julgamento dos recursos não interessa aos réus, porque a espera por uma decisão final do judiciário é, muitas vezes, um longo calvário de angústia para o cidadão. Que maldição carregam essas togas sombrias que parecem eliminar, do coração dos juízes, toda imaginação, toda solidariedade, todo sentimento humano em relação aos cidadãos que aguardam, ansiosos, culpados ou não, por uma decisão que poderá significar o pior castigo possível: o fim da liberdade?]
Ele reconheceu que cabe às cortes superiores firmarem o entendimento de que a execução da pena deve ocorrer já em segunda instância. “A inefetividade da Justiça em certos segmentos sociais tem a causa mais evidente na morosidade da prestação jurisdicional, com um sistema recursal irracional”, afirmou.
[Reparem só: “inefetividade da justiça em certos segmentos sociais”. Fachin fala como se o judiciário fosse “efetivo” em relação aos mais pobres. Todo o seu raciocínio se ancora na convicção fascista de que a justiça apenas se materializa na prisão, e jamais na liberdade, quando deveria ser exatamente o contrário. O ato mais nobre da justiça não é, certamente, encarcerar outro ser humano, culpado ou não. O ato mais nobre da justiça é conceder a liberdade, seja através da comprovação da inocência, seja através do perdão da culpa. A filosofia penal humanista aceita a prisão não como “castigo” e sim como uma decisão, difícil, dolorosa, de reeducar um determinado cidadão para o convívio social, ou então para salvaguardar a segurança de outras pessoas, no caso de assassinos e estupradores. Ao chamar o sistema recursal de “irracional”, Fachin ofendeu todos os juristas e representantes do povo, que fizeram essas leis. O sistema recursal não é irracional. Irracional, Fachin, é o juiz que condena sem provas. Provavelmente, o sistema de recursos, como se dá no Brasil, foi criado justamente como um anteparo do cidadão contra um judiciário historicamente autoritário, fechado em si mesmo, corporativo, que entende o processo penal como um “jogo” que ele, juiz, só ganha se condenar. ]
Fachin reafirmou a importância da liberdade de expressão e da imprensa livre e referiu o fim da invisibilidade do juiz como uma herança do século vinte. “Atualmente, o magistrado precisa prestar contas à sociedade e à ordem jurídica do país”. Ele reconheceu que muitos avanços recentes na prestação jurisdicional se devem à persistência dos juízes de primeiro grau, acompanhados pelos julgadores da segunda instância.
[Como assim “reafirmou a importância da liberdade de expressão e da imprensa livre?”. Por que não defendeu também, então, uma imprensa mais democrática, mais plural, e livre da herança da ditadura? É fácil entender a frase de Fachin: é um salamaleque servil à única força social que o judiciário respeita: a grande mídia corporativa. Fachin não ficou sabendo que um juiz condenou Luis Nassif por “ofender” a moral de Eduardo Cunha, ao mesmo tempo em que todas as ofensas cometidas contra lideranças petistas são aceitas e perdoadas pelo judiciário? Isso é “liberdade de expressão e imprensa livre”.
Quanto à necessidade do magistrado “prestar contas à sociedade e à ordem jurídica do país”, trata-se de mais uma daquelas enjoativas manifestações de hipocrisia. Que sociedade? Que ordem jurídica? O judiciário brasileiro prestou contas para os 54 milhões de eleitores que tiveram seus votos roubados pelo golpe? O judiciário brasileiro prestou contas à ordem jurídica aos milhares de juristas que vem protestando contra o regime de exceção implementado pelo próprio… judiciário? Quanto aos “avanços recentes na prestação jurisdicional”, devidos a “persistência de juízes de primeiro grau”, isso parece uma piada macabra. Que avanços? Que juízes de primeiro grau? Trata-se de um elogio criminoso a juízes de primeira instância que praticam crimes, que promoveram um profundo retrocesso na “prestação jurisdicional” do país, segundo a opinião de inúmeros juristas importantes. Como esses juristas raramente são entrevistados no Jornal Nacional, então Fachin, competente representante do regime de exceção e obediente lacaio da Globo, finge que eles não existem. Os “julgadores da segunda instância”, por sua vez, tem se mostrado, há tempos, burocratas que raramente destoam das condenações de primeira instância, sobretudo quando as decisões de primeira instância, por mais ilegal que sejam, vem acompanhadas de chancela midiática ou fazem parte de narrativas e conspirações que não podem ser obstruídas.]
O ministro concluiu dizendo que os avanços na aplicação da Lei Penal são visíveis e que o aprimoramento do sistema está sujeito a altos e baixos até atingir um balizamento. Ele frisou que a Constituição escolheu o Direito Penal como instrumento de tutela e proteção dos direitos fundamentais e apontou a importância da independência do Ministério Público e de institutos como o da colaboração premiada, que definiu como um “importante meio de produção de prova”.
[Fachin mente. Não há nenhum “avanço” na aplicação da Lei Penal. O Brasil vive um dos mais sombrios períodos de exceção de sua história. Todos os índices de violência explodiram depois do golpe judicial: homicídios, estupros, assaltos, etc. A violência contra lideranças rurais, contra sem-teto, contra qualquer representante do povo, nunca foi tão grande, e o judiciário não é mais um anteparo. Ao contrário, o judiciário tem se aliado, cada vez mais, às mais violentas e sórdidas elites, com a cumplicidade de magistrados como Luiz Edson Fachin. A maneira como a expressão “proteção aos direitos fundamentais” foi jogada no meio de um parágrafo, sem qualquer preocupação de ordem sintática ou de coerência textual, é bastante emblemática. A presença na mesma frase de expressões como “direitos fundamentais” e “colaboração premiada” reflete a degeneração de caráter dos nossos juízes. Ora, a colaboração premiada tem sido visivelmente deturpada. Ao invés de ser um “importante meio de produção de prova”, a colaboração premiada tem sido um importante meio de produção de mentiras. Fachin sabe disso. Como é possível ser tão desonesto?]
Fachin finalizou conclamando os colegas a seguirem com determinação e persistência: “cabe a nós, magistrados, impor resposta aos que tiverem seus crimes comprovados. Devemos estar conscientes que a parcela privilegiada pela seletividade do sistema penal se empenha em fazer crer que estamos colocando em perigo garantias individuais, mas devemos seguir adiante, ainda que falhas possam ocorrer. Os tempos de agora são íngremes e precisamos seguir agindo com ousadia, temperança, confiança, serenidade e firmeza”.
[O texto da assessoria do TRF4 termina com uma incitação de Fachin ao justiçamento. O ministro não pede aos juízes que trabalhem em defesa dos réus perseguidos pelo Estado e pela mídia. Não, isso não. Provavelmente porque, na cabeça desse Fachin midiático pós-Lava Jato, isso não existe. É paranoia. O Executivo, o Legislativo, os partidos e a comunidade jurídica não-punitiva é que são corruptos. O judiciário é perfeito! É o símbolo da justiça universal!
As críticas ao judiciário são postas de lado como vindas da “parcela privilegiada pela seletividade do sistema penal”. A quem Fachin se refere? Aos petistas, não creio, porque seria um tanto ridículo, mesmo para um juiz, dizer que os petistas fazem parte da “parcela privilegiada pela seletividade do sistema penal”. A menos que Fachin considere que ser preso por Sergio Moro, em prisão cautelar por tempo indeterminado, ter habeas corpus negados, e ser condenado sem provas, seja um “privilégio”. Fachin está chamando as centenas de juristas que tem manifestado preocupação com o avanço do fascismo judicial de insanos? E que história é essa de que “devemos seguir adiante”? Seguir para onde? Para o abismo? O judiciário não admite críticas? As violências sistemáticas contra a família Lula, contra o reitor suicidado, contra movimentos sociais, contra o regime democrático brasileiro, violentado por um golpe urdido por Eduardo Cunha, Michel Temer, empresários corruptos e Globo, não representam perigo para as garantias individuais?]
***
Conclusão: a Ajufe promoveu um evento no TRF4, com presença de Fachin, com objetivo pouco disfarçado de preparar o terreno para o avanço do autoritarismo judicial, que inclui a confirmação da condenação de Lula, a blindagem de Sergio Moro e a defesa judicial de todas as políticas de desmonte de Estado promovidas pelo governo Temer.
O texto do TRF 4 termina com uma citação ao discurso de Fachin em que ele fala de “ousadia, temperança, confiança, serenidade e firmeza”.
Ora, é mais uma piada sinistra, porque essas virtudes são justamente aqueles que não vemos no judiciário. Quer dizer, talvez ele seja ousado, porque, de fato, é ousado destruir um país dessa magnitude em tão pouco tempo e humilhar tanta gente através da perseguição injusta e obsessiva a seus representantes.
É como se toda aquela síndrome de impunidade, que o próprio judiciário gosta tanto de apontar na sociedade e nos “poderosos”, tivesse sido transferida para o juiz. O juiz brasileiro não tem medo de nada, porque se sente impune. Que diferença para os juízes da antiga Atenas, que eram sorteados entre os cidadãos, tinham mandatos de apenas um ano, ao cabo dos quais eram, por sua vez, julgados por todos os cidadãos! Se alguma de suas decisões fosse considerada negativa para a coletividade, os juízes eram duramente punidos. Tomar uma decisão judicial, na democracia original, implicava em risco, e por isso o juiz tinha de considerar, com muito cuidado, as consequências de todos os seus atos.
Agora… falar em temperança, serenidade, firmeza para um judiciário completamente enlouquecido como o nosso? Rá!