(Alckmin mostrando trecho do Eclesiastes a Doria. Foto: Alexandre Carvalho/A2img)
Por Pedro Breier
Eclesiastes, capítulo 1:
Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade.
Atentei para todas as obras que se fazem debaixo do sol, e eis que tudo era vaidade e aflição de espírito.
João Doria chutou o balde. A disputa com Geraldo Alckmin pela indicação do PSDB à presidência em 2018 passou de guerra fria a guerra aberta.
Depois de Alckmin afirmar, na semana passada, que quer ser “o candidato do povo brasileiro”, Doria subiu o tom, abandonando as dissimuladas loas ao padrinho que sempre fazia publicamente:
Geraldo tem todo direito de anunciar que vai disputar a Presidência da República, mas os tempos caminham. Aprendi com Geraldo Alckmin e Fernando Henrique Cardoso que a melhor decisão referente à candidatura vem do povo.
“Os tempos caminham” acrescenta um toque de sadismo à escancarada trairagem com o padrinho, aquele que bancou Doria contra o PSDB paulista inteiro na eleição de 2016.
Alckmin mandou a sua réplica ontem, definindo o que é o “novo na política” com uma indireta bastante direta a Doria, no estilo daquelas clássicas de redes sociais: “Primeiro, é falar a verdade. Olhar nos olhos e as pessoas poderem acreditar.”
A tréplica de Doria, em entrevista ao Estadão, deixa claro que em matéria de ataques venenosos o picolé de chuchu é amador perto do seu ex-pupilo, que sabe, como uma víbora, inocular veneno em cada palavra dita:
O sr. disse que o fator povo será importante para definir o candidato do PSDB…
Importante não, definitivo. Não se pode imaginar a decisão do PSDB sobre o nome que vai disputar a Presidência da República ou o Estado de São Paulo se você não ouvir o povo. Não há como imaginar que alguém possa ser indicado sem que seja pelo povo.
Isso significa que as pesquisas terão um papel importante na escolha do candidato do PSDB?
Ao meu ver, sim. Se alguém tiver dúvida em uma pesquisa, que faça duas. Se tiver dúvida em duas, que faça três. Não ouvir o povo pode ser um erro fatal para o PSDB.
Doria pisoteia nos números medíocres de Alckmin nas pesquisas, apesar de não estar tão em vantagem assim. João, como o chama(va?) Alckmin, tem a frieza de um Cristiano Ronaldo na cara do gol para fazer seus movimentos e não deve sentir o mínimo remorso ao esculhambar com o seu criador.
Entretanto, Doria possui também outra característica marcante do artilheiro português do Real Madrid: a vaidade. Como a política é diferente do futebol – não adianta jogar bem o jogo político se você não convencer o povo de que é o melhor candidato – a vaidade pode acabar derrubando as suas pretensão presidenciais.
O fato de simplesmente abandonar São Paulo para construir seu nome nacionalmente com apenas 8 meses completos de governo (no seu primeiro cargo público!) não pegou nada bem e fatalmente será explorado na campanha.
A presunção do prefeito viajante é tanta que ele sai anunciando reunião reservada com o primeiro-ministro da França quando este nem estava na cidade e chama de reunião um encontro de poucos segundos com o presidente francês em um evento. Patético.
Questionado sobre suas viagens, Doria se saiu com esta pérola:
Viajo e continuarei a viajar. São Paulo é uma cidade global, eu sou um prefeito global… acabou o tempo acabou o tempo do século 20, do século 19. Quem gosta de fazer política miúda, pequena, personalista é o PT. Eu prefiro fazer a política mais ampla, plural e que atende ao interesse da população de forna global
Faz algum sentido? Claro que não, mas o importante é falar mal do PT no meio do nonsense.
Hoje, a Folha afirma que partidos aliados dos tucanos, como PMDB e DEM, ameaçam retirar o apoio ao PSDB se Doria não for o candidato. Segundo a matéria, “a ideia dos principais auxiliares de Doria é trabalhar de fora para dentro, conquistando a simpatia do mercado financeiro, do mundo político e do eleitorado para convencer os dirigentes de sua legenda a ungi-lo como postulante ao Planalto”.
E se tudo der errado e o PSDB escolher Alckmin? Não tem problema, Doria muda de partido. Ele já falou também, como quem não quer nada, que, além de DEM e PMDB, recebeu convite de outros dois partidos. Afinal, trata-se de um projeto pessoal de poder, e tão somente isso. Ideologia, projeto partidário? Isso é coisa de petista, esquerdista, etc…
Diz o Eclesiastes que tudo é vaidade debaixo do sol e Doria confirma espetacularmente o livro bíblico. Contudo, se não tomar cuidado, acabará tropeçando no próprio ego e, só então, cairá em si.