(Imagem: Luisa Ortega Díaz em visita ao ministério público do Brasil- radiomundial.com.ve-estação do Governo da Venezuela)
Tende-se a pensar que o alto comando da promotoria de um país deveria ter uma prática retilínea que engrandecesse a justiça, aquela que valorasse a premissa de isenção e distância de interesse pessoal, que se põe a prova quando a força de domínar se aproxima do judiciário. O perigo se apresenta quando, dizendo servir a população, o burocrata toma de assalto o poder para gerir um objetivo individual.
Luiza Marvelia Ortega Diaz se especializou em direito penal pela universidade privada de Santa Maria, onde lecionou até poucos dias atrás. Foi consultora jurídica do canal 8, a Venezuela de Televisão, principal emissora estatal da Venezuela. Em abril de 2002 ingressou no Ministério Público e foi homologada como sua procuradora chefe em 2007. Dentre diferentes trabalhos em sua gestão, enumera-se a investigação e detenção de pequenos banqueiros por fraude de gestão e patrimônio; o requerimento de extradição do ex-presidente Carlos Andrés Pérez por repressão e mortes na revolta da população em 1989, chamado de ¨Caracazo¨. O seu processo de maior destaque foi a criminalização de Leopoldo López por 43 mortes no movimento golpista “la salida”, em 2014.
Todavia por outro lado, em relação ao importante problema de abastecimento de produtos no país, sua atuação foi de conivência com o empresariado, que recebiam dólares subsidiados para a cadeia produtiva, mas utilizavam no mercado de especulação cambial. No ano de 2014, a deputada de oposição e vice-presidente do partido “un nuevo tiempo”, Delsa Solórzon, solicitou sua exoneração por dar proteção a estas empresas.
Outro dado importante de abordagem é que sua escolha teve a indicação de seu marido, o deputado Germán Ferrer, que apesar de eleito inicialmente pelo PSUV (chavista), após sua reeleição em 2015, começa a criticar a política socialista, e defender o fim de subsídios(1) a população, como na questão do preço da gasolina. Neste contexto, o parlamentar inicia um processo de servir a oposição, formando um grupo independente do governo. A utilização privada do avião do Ministério Público por seu esposo, gerou uma ação de devolução da aeronave(2) . Ortega e Ferrer se dissociavam de vez do chavismo e partiam para uma carreira política junto a oposição.
No que tange a disputa aberta com o chavismo, sua maior vitória advém do caso do Tribunal Superior de Justiça, em determinar e substituir atribuições da assembleia nacional. Depois da eleição parlamentar de 2015, quando a MUD alcançou quase dois terços do congresso, o objetivo da frente oposicionista não era aprovar leis que fossem de encontro com seu programa, e sim derrubar o governo. Superado vários embates políticos, os parlamentares passaram a não colocar em votação medidas que autorizasse as novas empresas mistas tentando asfixiar economicamente o país, estas parcerias são base da atividade petroleira: projetos entre a PDVSA e o capital estrangeiro. Este fato praticamente paralisaria a arrecadação de novas atividades. O TSJ concluiu que, na falta de atividade do congresso, ele deveria legislar(3) . Luisa Ortega desempenhou um papel decisivo em apontar que esta prática estava em desacordo com sua análise constitucional(4) , levou o governo e o TSJ a recuar, presenteando a oposição uma vitória consistente.
Quando o presidente Nicolás Maduro convocou a Assembleia Constituinte pelo artigo 367 da constituição, Ortega tenta impedir, porém sem base legal é vencida. Neste momento, a procuradora é a oposição dentro do Estado e não uma representante da justiça. A imprensa internacional e o MUD retratavam ela como um força que pudesse romper o chavismo, uma análise que se distanciava da realidade e que nunca se concretizou.
Destituída por 8089320 pessoas que votaram na constituinte que tentou impedir, Luisa Ortega passou a ser investigada. A indagação da população da Venezuela era buscar razões que levaram a procuradora geral se abster de processar os terroristas das guarimbas, bem como os partidos que os financiavam. Segundo o novo chefe da promotoria, Tarek William Saab, e colega na Universidade Santa Maria, “Luisa Ortega é autora intelectual de todas as mortes ocorridas na onda de protesto que iniciou em abril”(5) . Não se demandou muito tempo para identificar uma rede de corrupção, para extorquir e vender proteção a possíveis processos. O auxiliar da fiscal, Luis Sánchez Rángel e Gérman Ferrer, seu esposo, teriam recebido em contas nas Bahamas do banco da Suíça, 7.118.321 dólares(6) entre março e abril de 2016, fruto de extorsão. Emitida ordem de prisão, Sánchez foi preso, mas Ortega e Ferrer fugiram para a Colômbia(18/8/2017).
Em meio estes conjunto de fatos, parte da comunidade internacional vai preferir a “convicção” que Luisa Ortega e Ferrer são exilados políticos. A justiça na América latina, que ficou próxima a elite, e distante dos mais humildes, agora sofre com alguns promotores que, em vez de servir a população, escolheram multiplicar seu patrimônio privado ou político.
FONTE:
1) Silva, Flávio T. R. A política de estado sobre recursos do petróleo, o caso venezuelano. São Paulo: Editora Pillares, 2016.
link
1) http://elcooperante.com/diputado-german-ferrer-reconoce-que-se-deben-hacer-cambios-en-el-seno-del-gobierno/
2) http://efectococuyo.com/politica/tsj-investiga-caso-de-avion-usado-supuestamente-por-la-fiscal-ortega-diaz
3) http://eldiario.es/internacional/Supremo-venezolano-competencias-Parlamento-desacato_0_627837250.html
4) http://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-39459905
5) http://www.venezuela.shafaqna.com/es/ve/989871
6) http://www.telesurtv.net/news/Exfiscal-venezolana-Luisa-Ortega-y-su-esposo-llegan-a-Colombia-20170818-0076.html