(Sintonia fina. Foto: Beto Barata/PR)
Por Pedro Breier
João Doria Jr. está, desde segunda-feira à noite, no centro dos holofotes – onde se sente muito à vontade – em virtude da ovada incrivelmente certeira que levou em Salvador.
Entretanto, quero comentar sobre uma outra atividade da qual o prefeito de São Paulo (nas horas vagas) participou horas antes do glorioso ovo na testa.
Foi em um evento na prefeitura de São Paulo, com a presença do muito bem quisto pela população Michel Temer. Se a noite da segunda-feira foi horrível para Doria, ao menos o dia começou com muito carinho e afeto.
Doria e Temer vêm formando a dupla mais afinada do Brasil desde Bebeto e Romário na copa de 94, com a diferença de que enquanto estes tinham fome de gol, aqueles querem engolir os parcos direitos da população trabalhadora.
Vejam que coisa mais linda os afagos mútuos.
De Temer para Doria: “Saio daqui mais animado ainda porque vejo aqui um parceiro, um companheiro, alguém que compreende como ninguém os problemas do país”. O trecho a seguir da reportagem da Folha sobre o evento é particularmente tocante:
“João Doria, meu velho amigo”, disse (Temer), ao que o prefeito sorriu assentindo com a cabeça. “Jamais o vi dividindo pessoas. Ao contrário, sempre agregou”.
Agora, de Doria para Temer: “Sempre a sua alma e a sua índole foram de conciliação. A minha também. Isso não nos tira do campo da defesa de princípios e da firmeza de posições, de caráter, de postura e de biografias”.
É isso mesmo que você leu. Doria disse que o homem que foi pego falando em propinas para manter Eduardo Cunha quieto na prisão e indicando um comparsa para receber uma mala de dinheiro, tudo isso em um encontro secreto na calada da noite com um megaempresário, está no campo da defesa de princípios e da firmeza de caráter e de postura.
Doria disse ainda que “a permanência de Temer é positiva para a economia” e que os quatro ministros tucanos “podem perfeitamente continuar o seu trabalho onde estão”.
A troca de carinhos quase pornográfica com um bandido que está usando o seu, o meu, o nosso dinheiro para comprar deputados e se manter no poder ocorreu poucos dias depois da IstoÉ brindar-nos com uma reportagem de capa constrangedora, para usar um eufemismo, na qual tenta emplacar o ex-pupilo do Alckmin como o “anti-Lula”.
O panfleto diz que “aos olhos dos brasileiros ele (Doria) tem se diferenciado por exibir um novo jeito de governar – mais em sintonia com os anseios de moralidade, eficiência e seriedade almejados pela população nos dias de hoje”. Entretanto, consta mais à frente na reportagem, como se fosse algo positivo e não completamente contraditório a qualquer ideia de moralidade, que Doria “posicionou-se contra o desembarque tucano da nau de Temer, defendeu as reformas, reclamou dos juros altos. Desde a eclosão do escândalo da JBS, Doria participou de mais de 20 encontros nacionais. Enfrentou os chamados “cabeças-pretas” do PSDB, jovens radicais que pregavam o rompimento puro e simples com o governo, sem plano alternativo.”
Não é difícil perceber os motivos pelos quais a direita não se cansa de perder eleições presidenciais. A cortina de fumaça da corrupção cai por terra pateticamente pelas mãos do próprio paladino da moral da vez e de seus veículos de propaganda.
Permanecer abraçado ao presidente-bandido em nome de reformas antissociais só torna Doria um furacão eleitoral nas cabeças completamente descoladas da realidade dos toscos estrategistas da direita brasileira.
Tiram o povo para burro, mas o povo não é nada bobo.
Só mais um golpe – parlamentarismo ou adiamento das eleições – é capaz de manter essa gente no poder após 2018.