Impossível observar a foto, publicada em O Globo nesta sexta-feira, 21/07/2017, colhida pelo fotógrafo Givaldo Barbosa, durante mais um evento fake, montado pela assessoria de Michel, para passar a ideia de “normalidade” – quando tudo em volta nada tem de corriqueiro, regular, normal – sem nos lembrarmos imediatamente do magistral “clique” de Erno Schneider, para a Agência Estado, prêmio Esso de 1962.
“Foi um só também”, recordaria Erno, anos mais tarde, ao falar da fotografia que traduzirá para sempre o governo Jânio Quadros, e aquele momento político.
Em matéria produzida pela Agência Senado, em 25 de agosto de 2011, às 17h48, a situação em que a foto foi tirada é descrita assim:
Capturada na ponte que liga Uruguaiana (RS) a Libres, na Argentina, em 21 de abril de 1961, quando Jânio se encaminhava para um encontro com o presidente Argentino Arturo Frondizi, a imagem do político brasileiro com as pernas em direções opostas mostra, involuntariamente, o quanto havia de divisão de personalidade em Jânio – e o grau de contradição das forças que então lutavam pelo poder.
A faísca geradora da foto foi um tumulto ocorrido próximo ao local, segundo relato de seu autor, o fotógrafo gaúcho Erno Schneider, ao programa Fantástico, da TV Globo:
“Enquanto o Jânio ia encontrar o Frondizi na ponte, no meio da ponte, ele resolveu ir a pé. E tava andando, eu acompanhando ele do lado. De repente, deu um tumulto. Um tumulto muito grande. O Jânio levou um susto e se virou. Na hora, eu vi que ele tava todo estranho, todo torto. Eu senti que tinha uma foto diferente. Aí, eu dei um clique. Foi um só também”.
Hoje, se perguntássemos para Givaldo, é provável que a descrição fosse semelhante. Esses insights têm segundos para acontecer. É apertar o dedo, ou perder para sempre a imagem que tão bem resumiu o momento de Michel.
Enquanto o rosto é uma máscara, misto de Coringa do Batman e do personagem Amigo da Onça, num esforço visível de passar descontração, o corpo fala. As mãos, que normalmente gesticulam descoordenadas, irritantes, nervosas, estão agarradas às pernas, como num ensaio para uma fuga. Michel parece prestes a dar um pique, levantar-se. Sair de cena.
Enquanto isto, os pés… Os pés empreendem uma espécie de diálogo. Ao contrário de Jânio, que os tinha desencontrados, na foto de Erno Schneider, os de Michel parecem travar um diálogo, do tipo: “vamos?” Os sapatos se olham, se indagam. Os bicos não tocam o chão, traduzindo toda a tensão disfarçada da cintura para cima, e no sorriso falso. O pé do lado direito está mais elevado e retesado, (numa posição mais inquiridora), enquanto o esquerdo, também voltado para dentro, reforça a certeza de que nada naquele corpo está em harmonia, assim como não estão os poderes, os partidos, o país, enfim. Infelizmente, porém, não devemos esperar de Michel o mesmo gesto do ex-presidente Jânio Quadros. Michel só tem olhos para governar a própria crise. E não vai renunciar.