Por Pedro Breier
A condenação de Lula por Sérgio Moro era mais do que previsível. Era um fato consumado muito tempo antes de ser redigida a sentença, o que, por si só, demonstra o quão absurda é.
Mesmo assim, não deixa de ser chocante.
A direita brasileira, através de seus grandes representantes do momento, a velha mídia e o velho judiciário, consuma sua mais ousada jogada.
Condenar à prisão, sem provas, o presidente mais popular da história do Brasil desde Getúlio Vargas não é qualquer coisa. Mesmo para quem vive de golpes e mais golpes na nossa incipiente democracia.
Mas por que Lula é perseguido dessa forma?
Até o início dos anos 1990 a resposta era óbvia. Seu discurso se encontrava muito mais à esquerda, intolerável para o status quo. Contudo, depois de seus governos de conciliação de classes, quando banqueiros e megaempresários nunca tiveram tanto lucro e a Globo continuou enchendo suas burras de dinheiro público, por que tudo isso? A elite brasileira precisava mesmo dar mais um golpe, jogar o país no caos e condenar o seu grande líder popular?
A resposta para essa pergunta é complexa. São muitos fatores, mas vejo dois principais, um prático e um simbólico.
A “reforma” trabalhista aprovada ontem, que transforma os trabalhadores em mercadorias de baixo valor, é a pista para encontrarmos o fator prático. O grande problema dos governos petistas, para os que sempre mandaram no Brasil, é que os filhos da classe baixa começaram a ingressar no ensino superior. Quando os filhos dos pobres passam a ir para a faculdade, quem vai ser o peão? Quem vai fazer o serviço pesado e ganhar uma miséria sem reclamar, pois se não quiser tem uma multidão implorando por qualquer coisa parecida com um emprego?
A escassez de mão de obra encarece o valor do trabalho. Imagina ter que pagar um salário digno para o peão da fábrica, para o operário da obra, para a faxineira, e diminuir a margem de lucro! Que horror!
Mesmo não tendo feito nenhuma reforma estrutural, mesmo não tendo diminuído a renda do andar de cima para aumentar a do andar de baixo, a singela ideia de que os pobres possam cogitar serem engenheiros, professores, médicos, cineastas, advogados, jornalistas ou arquitetos é impensável para aqueles que têm a convicção (mas não provas) de que alguns nasceram para servir e sobreviver como der, enquanto alguns poucos iluminados vieram ao mundo para exercerem o poder e aproveitarem do bom e do melhor.
O motivo simbólico para a perseguição doentia a Lula é a sua origem. A imagem de um trabalhador que nasceu e cresceu na miséria; chegou a presidência da República; melhorou a vida de milhões de brasileiros; e por fim rodou o mundo para apresentar as políticas públicas que implementou no seu país – e ainda ser bajulado por líderes mundiais – é poderosa e perigosa demais.
O povo sofrido, a gente humilde de Chico Buarque, não pode ter uma referência dessas para se identificar, pois pode acabar esquecendo do lugar subalterno para o qual foi designado pela aristocracia moderna. Prenda-se o herói dessa gente.
De qualquer forma, a ganância insana da elite nacional acaba de produzir um mártir.
A narrativa – corretíssima – que irá para os livros de história do futuro será, sem sombra de dúvida, a do presidente que era um líder popular e foi preso sem provas após um massacre midiático sem precedentes.
É inevitável bater a tristeza em um momento tão dramático da história do nosso país.
Portanto, tentando transmitir a força que precisamos ter para seguir lutando, encerro este artigo com uma frase esperançosa do jurista Marcio Sotelo Felippe sobre a reforma trabalhista, mas que se encaixa perfeitamente também para a condenação de Lula:
É fruto de uma elite selvagem, capaz de chegar aos limites da insanidade. Vai chegar o ponto da virada, o momento em que brota a consciência de que não se tem mais nada a perder. Quando e como não sei. Mas vai chegar.