Temer na Noruega: fiasco e humilhação
por Redação — publicado 23/06/2017 10h35, última modificação 23/06/2017 11h30
Acossado por denúncias, presidente buscou agenda positiva, mas encontrou protesto, cometeu gafe e viu governo estrangeiro cortar financiamento ao Brasil
Fotos: Haakon Mosvold Larsen / NTB scanpix / AFP
Michel Temer e Solberg
Acossado pela iminente denúncia de corrupção que será feita pela Procuradoria-Geral da República, o presidente Michel Temer fez nesta semana uma viagem internacional na tentativa de criar uma “agenda positiva”. Após uma passagem inócua pela Rússia de Vladimir Putin, Temer chegou na quinta-feira 22 à Noruega. A empreitada pessoal terminou em fiasco e humilhação internacional para o Brasil.
Nesta sexta-feira 23, em compromisso oficial em Oslo, capital da Noruega, Temer se confundiu duas vezes na mesma frase e cometeu uma gafe. Ao agradecer a hospitalidade das autoridades locais no nome da primeira-ministra Erna Solberg, Temer afirmou que a visita, apesar de rápida, iria estreitar os laços entre os dois países, e mencionou que visitaria o “parlamento brasileiro” ao lado do “rei da Suécia”, outro país escandinavo. Na realidade, Temer visitaria o parlamento norueguês ao lado do rei da Noruega, Harald V.
Um pouco antes, Erna Solberg não se constrangeu em recriminar o Brasil pelos casos de corrupção. Após reunião com Temer, a premiê norueguesa afirmou a jornalistas que conversou com o colega brasileiro sobre o tema. “Estamos muito preocupados com a Lava Jato. É importante fazer uma limpeza”, disse Erna Solberg, citando o momento de “turbulência” pelo qual passa o Brasil. Após a gafe sobre o monarca local, Temer afirmou que “as instituições funcionam com regularidade extraordinária e liberdade”.
A premiê da Noruega fez os comentários apesar de uma empresa norueguesa, a Sevan Drilling, ter aparecido na Lava Jato. Segundo reportagem publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo em janeiro de 2016, a Sevan Drilling pagou cerca de 140 milhões de reais em propina para corromper funcionários da Petrobras.
Meio ambiente
Na quinta-feira 22, o encontro de Temer com as autoridades norueguesas provocou um episódio de humilhação internacional ao Brasil. Em novembro, dados oficiais do governo brasileiro mostraram que entre agosto de 2015 e julho de 2016, o País destruiu quase 8 mil quilômetros quadrados da floresta amazônica, um aumento de 29% em relação ao levantamento anterior.
Os dados preocuparam o governo da Noruega, principal país financiador do Fundo Amazônia, com repasses que chegam a 2,8 bilhões de reais. Antes da chegada de Temer, em entrevista à Deutsche Welle, parceira de CartaCapital, o ministro do Meio Ambiente na Noruega, Vidar Helgesen, fez críticas abertas ao Brasil e lembrou que o programa de doação à preservação da Amazônia “é baseado em resultados”. “O dinheiro é repassado se o desmatamento é reduzido, e foi o que vimos nos últimos anos. Isso significa que se o desmatamento está subindo, haverá menos dinheiro”, afirmou Helgesen.
Na quinta-feira, veio o resultado. Com Temer no país, o governo da Noruega anunciou o corte de metade do repasse anual ao Fundo Amazônia. Serão cerca de 170 milhões de reais a menos para a proteção da floresta brasileira. Helgesen falou sobre o caso em Oslo, ao lado do ministro do Meio Ambiente brasileiro, Sarney Filho (PV). Em entrevista coletiva, Sarney Filho culpou o governo Dilma Rousseff pelo desmatamento e não deu garantias de que haverá mais preservação da Amazônia. “Apenas Deus poderia garantir isso. Mas eu posso garantir que todas as medidas para reduzir o desmatamento foram tomadas. Nossa expectativa e esperança é que diminua”, afirmou.
“É uma decisão humilhante para os brasileiros. O país pediu dinheiro para reduzir o desmatamento, mas o que está acontecendo é o contrário”, disse à Folha de S.Paulo Jaime Gesisky, da organização não-governamental ambientalista WWF. Nesta sexta-feira, manifestantes ambientalistas brasileiros e noruegueses protestaram contra Temer.
Uma das bases de sustentação do governo Temer é a bancada ruralista na Câmara e no Senado. O Congresso aprovou nas últimas semanas alterações nas medidas provisórias 756 e 758 que reduzem a proteção em unidades de conservação na Amazônia e estuda um projeto de lei que afrouxa as regras do licenciamento ambiental. Em carta enviada a Sarney Filho (PV), Helgesen já havia manifestado preocupação com essas medidas.
Diante da pressão, inclusive internacional, Temer vetou totalmente a MP 756 e sancionou com vetos a MP 758. As medidas irritaram os ruralistas e há rumores de que o governo, tentando se salvar diante das denúncias de corrupção, pode enviar um projeto de lei ao Congresso nos mesmo teor da MP 756.
Para completar o calvário de Temer na Noruega, sua visita está sendo em grande medida ignorada pela imprensa local. Segundo o jornalista Jamil Chade, correspondente do Estadão, o primeiro discurso de Temer em Oslo foi acompanhado por apenas um jornalista local, que estava em sua “terceira cobertura desde que se formou na universidade”.