(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Temer mantém Brasil refém do seu medo de ser preso
Por Laurez Cerqueira*
21 de Junho de 2017
A Esplanada dos Ministérios, em Brasília, parece em escombros. O cenário é de fogo de monturo queimando as entranhas do golpe de Estado que levou o Brasil a uma das maiores tragédias política, econômica e social da história da República.
Para não ser preso, Temer mantém o Brasil refém do seu medo, o governo paralisado, a economia afundando ainda mais na recessão, com perda de mais de 10%, o desemprego estrutural se alastrando, com 14,7 milhões de desempregados, a soberania nacional se dissolvendo com a entrega de tecnologias, informações estratégicas a estrangeiros, e as relações perigosas do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, General Sérgio Etchegoyen, com a CIA, em episódio recente revelado em reportagem do The New York Times, a fome voltando nas regiões mais pobres do país, com previsão para este ano de cerca de 3,6 milhões de pessoas jogadas abaixo da linha da pobreza, segundo estudo do Banco Mundial, os ratos saqueando os cofres e o patrimônio públicos, e os ministros do Supremo Tribunal Federal envoltos em suas capas pretas a olhar a Praça dos Três Poderes e a Esplanada dos Ministérios, talvez alheios à gravidade da situação do país, como quem olha, do alto, uma paisagem com tudo no seu devido lugar.
O relatório da Polícia Federal é conclusivo: Michel Temer é corrupto e praticou crimes incontestes. Mas parece que estão em compasso de espera, provavelmente por ainda não terem um candidato viável à sucessão de Temer. Enquanto isso, ele usa e abusa da estrutura do Estado e do poder de governo para proteção própria e de seus asseclas.
O governo mais parece uma imensa agência de negócios, estendida ao Congresso Nacional, de maioria corrupta e sem escrúpulos, com denúncias quase que diárias de manobras de autoproteção e chantagens, favorecimentos aos aliados mais próximos, como o perdão da dívida de R$ 25 bilhões do Banco Itaú, entrega a grupos privados de gigantesca reserva de ouro e pedras preciosas, numa área de 46 mil quilômetros, na Amazônia, entre muitas outras ações, fatos tratados pela imprensa, rotineiramente, como outro qualquer, misturado ao turbilhão do noticiário que desaparece todos os dias no túnel do tempo.
Os ministérios se transformaram em grandes cabides de empregos, com gente trazida dos mais variados rincões do país, a grande maioria sem as qualificações mínimas para os cargos que ocupam, como o deputado André Filho, do PMDB/PB, de 26 anos, com curso superior incompleto, o quarto ministro, escolhido para a pasta da Cultura, muitos deles a carrear recursos públicos, sabe-se lá para onde e para quem, nos estados e municípios.
Temer não é mais sustentado por apoio político, mas por barganhas de recursos e cargos públicos com a enorme banda podre do Congresso Nacional.
Não há mais nenhuma dúvida sobre a organização criminosa que deu o golpe de Estado e se instalou no poder. Os gatunos estão agindo à luz do dia, como quem não se importa mais com o que dizem deles.
Temer aposta nos ouvidos moucos de uma parte do povo fatigado, tenta passar ares de normalidade institucional, vira as costas para o país, viaja por céus azuis de verão, da Rússia, da Noruega, mesmo sendo recebido por autoridades de terceiro escalão, e outros movimentos na cena política.
A usurpação do poder, a degradação moral, a gravidade dos crimes em flagrante delito e as medidas de Temer, que colocam em risco a soberania nacional, subtrai direitos, conquistas sociais históricas, avilta garantias constitucionais civilizatórias, sob protestos da imensa maioria da população, requer do Ministério Público, do STF e da fatia do Congresso Nacional que não se alinha com o governo, a inclusão na pauta de debate, com prioridade máxima, de providências imediatas para conter as ações e a escalada do grupo político que domina as mais importantes instâncias do Estado brasileiro.
É consenso entre eminentes juristas que debatem a situação do país, que o afastamento, por medida cautelar, de Michel Temer e dos ministros e parlamentares ligados ao núcleo de comando do governo é perfeitamente respaldado pela Constituição.
Não há notícia de situação semelhante à do Brasil, entre países de democracias maduras e instituições consolidadas, com governantes a cometer delitos tão graves no exercício de suas funções públicas, sem que as autoridades competentes tomem a devida decisão de afastar imediatamente os envolvidos.
O STF tem em seu poder um pedido de anulação do impeatchment da Presidenta Dilma, mas o ignora. Além disso, deixou de cumprir com suas obrigações de fazer respeitar a Constituição e proteger a sociedade das negligências às garantias do Estado democrático de direito, para que o atual governo se estabelecesse e frutificasse. Eis os frutos podres e a responsabilidade do STF, por omissão, inscrita na história do país.
O que a sociedade brasileira deseja saber do STF é o que será feito agora para deter os criminosos no poder.
Segundo pesquisas recentes, 90,6% da população quer eleições gerais e o direito sagrado de escolher o destino do país. E isso não pode ser negado ao povo.
* autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes – vida e obra; Florestan Fernandes – um mestre radical; e O Outro Lado do Real
Artigo publicado no site Brasil 247