Rodrigos Rocha Loures, pai e filho
Foto: Divulgação/Fiep
Por Luiz Francisco Guil, escritor e jornalista
Entre outras de 2014, vi uma rua tomada, de esquina a esquina, em espaços de 2 a 3 m, com cavaletes (plaquetas duplas móveis, com cerca de 50 cm x 1 m) do candidato a deputado federal Rodrigo Santos da Rocha Loures. Aquele que você já conhece do noticiário, da mala semanal de R$ 500 mil, do Temer, do Cunha, do Joesley.
Sim, eram uns 30 ou 40 cavaletes de uma esquina a outra, em várias quadras do Centro de uma cidade na qual Rocha Loures provavelmente jamais colocou os pés.
Somente um gigantesco financiamento empresarial pode possibilitar que esses candidatos ausentes estejam presentes em todos os municípios.
Em 2014 Ratinho Júnior contava com 4 cavaletes em cada esquina do centro da minha cidade. Um em cada canto de esquina, o que somava cerca de 30 cavaletes, numa cidade de 50 mil almas. Considerando que o Paraná tem 11,2 milhões de habitantes, e usando a população da minha cidade como base, Ratinho deve ter usado cerca de 6,6 mil cavaletes. Sem contar o grande volume de placas, banners, cartazes, folhetos e santinhos distribuídos por todo canto do Paraná. Obteve uma giga-votação, que lhe possibilitou levar consigo para a Assembleia Legislativa meia dúzia de candidatos desconhecidos. São pessoas sem nenhuma expressão comunitária, mas que auxiliam Ratinho Jr. na sustentação ao desastroso e violento governo Beto Richa (PSDB).
Porém não são somente as peças publicitárias que elegem os candidatos de bolsos cheios e cabeças vazias. Eles também pagam os líderes políticos (prefeitos e vereadores, que coordenam a compra de votos nos municípios), além dos cabos eleitorais e de suas respectivas “formiguinhas”. E mesmo quando tais candidatos não compram votos, o grande volume de campanha garante suas vitórias.
Políticos deste naipe passam décadas ditando as regras da Câmara Municipal, da Assembleia, do Congresso. Cada vez mais ágeis e eficientes nas tramas, tecendo e amarrando a massa que lhes fornece os valiosos sufrágios. E aqui da plateia ficamos aguardando o dia em que a Natureza vencerá. Cedo ou tarde eles sairão da arena e darão lugar aos jovens. Será um alívio! Cabeças novas, sangue novo, ideais renovados, uma geração mais preparada. Mas preparada para que?
Veja nos programas eleitorais os filhotes de raposas que vêm chegando ao cenário estadual e nacional. Dá para acreditar que aqueles rostos cheios de saúde trazem algo de podre como herança? Seu discurso é sedutor, escrito por marqueteiros bem pagos. Sorrisos brancos, cabelos alinhados, perfume de talco Johnson e lavanda. O eleitor acredita na renovação. E o sobrenome que o candidato carrega ajuda na propaganda, paradoxalmente. Embora o eleitor esteja sempre sedento de mudanças, há um germe conservador que o atrai aos patronímicos conhecidos, e acaba votando no jovem Beltrano, filho de Sicrano, neto de Fulano, que teve uma vida dedicada à política… ao bem-comum de sua esposa e de seus herdeiros! Os esquemas de compra de votos, armados desde décadas, garantem a felicidade do clã. Enquanto o filhote sorri para as câmeras, o pai cuida do esquema. Ele sabe quais são os cabos eleitorais confiáveis. O negócio é regionalizar, um curral em cada município, doces para as crianças, botijões de gás, uma semente de milho para cada bode.
O mais intrigante é que os filhos das raposas parecem acreditar que há algo de nobre em sua condição. Sou filho da Raposa de Tal! A história dos antepassados parece justificar uma continuidade, um destino de família. E os opositores, leitores de Marx, Freud e Darwin, debatedores ardentes da sociedade neo-capitalista, aspirantes ao neo-socialismo, continuam acreditando que boa vontade vence o combate.
Os jovens de cabeças velhas vêm renovar o antigo discurso, feito escudos do rei nesta briga secular, travada pelo povo contra as corporações. A renovação das matilhas deveria ser analisada com esmero pela universidade, tornando-se disciplina obrigatória nos cursos de ciências humanas. Há ingredientes específicos na formação das quadrilhas eleitoreiras, com elementos suficientes
para se criar uma nova ciência. Não se trata da velha e glamourosa disciplina “Política”, que nada diz sobre a nossa realidade. A universidade deveria confrontar os elementos — partidos, compradores de votos, churrascadas, presentes de campanha, rasteiras, ameaças, empurrões, traições, emboscadas, maquinações de toda espécie — buscando respostas para a cura desse câncer que se alastra cada vez mais, inclusive sobre os remanescentes homens de bem. Mas aos poucos vamos percebendo que a universidade não tem o propósito de transformar coisa alguma. Pelo contrário, encontra-se bem fincada no coração da cidade, solidamente estruturada em sua espinha conceitual, um verdadeiro monumento à estagnação. Ela também é uma corporação, a quem muito interessa deixar tudo como está para que os grandes que elas representam tornem-se cada vez mais gordos e robustos.
Jovens promessas de futuro luminoso ilustram a galeria dos velhos gladiadores. São esses filhos da raposa que dão sustentação legal aos impérios comerciais, que há séculos escravizam e matam. São eles que fazem os acertos, fecham os conchavos, aprovam as leis contra o patrimônio público, dignamente disfarçados em promotores da modernidade.
O poder será sempre um anagrama do podre, sejam quais forem os seus perfumes. Algumas tradições orientais referem-se ao “despoder”. O desprendimento, o despojamento. Talvez a administração pública não será mais um “poder”, da forma como o temos concebido, quando a coragem e a generosidade vencerem o medo e a vaidade.