(Morto-vivo)
Por Pedro Breier, colunista do Cafezinho
Analisar a conjuntura política brasileira – com a qual “tá difícil competir”, segundo o perfil oficial de House of Cards no twitter – é fazer mais ou menos como John Nash (Russell Crowe) em Uma Mente Brilhante: buscar padrões e explicações lógicas no absoluto caos.
Mãos à obra.
Na última quinta-feira, dia 18, Mônica Bergamo divulgou em sua coluna que “um amigo que conversou com o presidente” relatou que Michel Temer falou para Joesley Batista manter seus pagamentos a Eduardo Cunha por “razões humanitárias”, pois a família de Cunha estaria passando dificuldades financeiras por estar com os bens bloqueados.
Essa conversa provavelmente foi vazada por orientação do próprio Temer e não foi desmentida.
No seu depoimento de hoje Temer simplesmente mudou a versão.
Disse que a frase “tem que manter isso, viu” foi falada após Joesley dizer que está de bem com Cunha e, portanto, se referiria a este fato.
Leiam a transcrição do trecho:
JOESLEY BATISTA: Dentro do possível, eu fiz o máximo que deu ali, zerei tudo, o que tinha de alguma pendência daqui para ali, zerou tudo. E ele foi firme em cima e já estava lá, veio, cobrou, tal, tal, tal. Pronto. Acelerei o passo e tirei da fila. O único companheiro dele que está aqui, porque o Geddel sempre estava [inaudível] Geddel é que andava sempre ali, mas o Geddel eu perdi o contato, porque ele virou investigado e eu não posso também …
MICHEL TEMER: É complicado
JOESLEY BATISTA: … não posso encontrar ele.
MICHEL TEMER: [inaudível]
JOESLEY BATISTA:: O negócio dos vazamentos, [inaudível], o telefone do Eduardo com o Geddel. Volta e meia citava alguma coisa meio tangenciando a nós, a não sei o que. Eu tô lá me defendendo. Como é que eu dei mais ou menos dei conta de fazer até agora: eu estou de bem com o Eduardo
MICHEL TEMER: Tem que manter isso, viu.
A versão de Temer não se sustenta.
Primeiro porque segundos antes Joesley fala que Cunha cobrou e foi “tirado da fila”, ou seja, foi pago para ficar quieto.
Segundo porque o presidente insepulto não desmentiu a informação de que havia falado em manter uma “ajuda humanitária” para Cunha.
Essa desculpa esfarrapadíssima foi vazada para a Folha antes da divulgação do áudio pelo STF. Temer ouviu a gravação e de repente se lembrou de que não falou mais em ajuda nenhuma a Cunha?
A cada pronunciamento Michel Temer torna sua situação ainda mais insustentável.
O (ex-) presidente chamou o sócio da JBS de falastrão por dizer que tinha comprado juízes e um procurador. Disse que “não acreditou”.
Que presidente da República é esse que ouve de um empresário que este comprou funcionários públicos, reage naturalmente e não toma nenhuma providência porque “não acreditou”? No mínimo cúmplice de um gângster.
Temer alegou também que uma perícia concluiu que o áudio foi editado. Segundo o Estadão, entretanto, um técnico que analisou o material afirmou que não houve fragmentações no trecho em que Eduardo Cunha é citado.
O momento comédia do pronunciamento foi a indignação de Temer por lhe atribuírem “palavras chulas” que ele “jamais pronunciaria”.
“Atentaram contra o meu vocabulário!”, bradou o capitão mesóclise. Bizarro.
A fala de Temer demonstra que o presidente sem votos vai tentar adiar o inevitável de todas as maneiras.
Uma empreitada fadada ao fracasso.