Por Wellington Calasans, Colunista do Cafezinho, na Suécia
Acompanhei ontem, como faço praticamente todos os anos, a manifestação do (V) Vänsterpartiet (Partido de Esquerda) aqui em Estocolmo. Sou simpático e membro do (S) Socialdemokraterna (Partido dos Trabalhadores da Suécia), mas prefiro conhecer os caminhos mais à esquerda para evitar que a tentação do poder descaracterize o “S” e esta sociedade exemplar.
Na passeata, fui ao encontro dos brasileiros residentes aqui, mas que estão focados na denúncia do estado de exceção do ilegítimo Temer. Lá recebemos a solidariedade de alguns suecos preocupados com o regresso imposto ao Brasil e aos brasileiros, através da turma do golpe.
Impossível não admirar que o nível de debate político na Suécia é tão elevado porque os cidadãos resolveram um dia dar um basta aos privilégios dos políticos. Aqui os cidadãos acompanham diariamente cada passo dos políticos e exigem deles as melhores respostas para cada situação apresentada. “Um país sem excelências e mordomias”, diria Claudia Wallin.
O “V” teve como principal proposta nesta efeméride a luta por uma jornada diária de seis horas, sem prejuízo ao salário. Obviamente que isso em algumas atividades, pois em setores como a saúde, por exemplo, seria inviável. Para evitar a criação de privilégios de apenas alguns cidadãos, o debate girava em torno da busca de uma compensação para os trabalhadores que não podem ser contemplados por esta proposta. Uma aula de socialismo moderno.
Acompanhei pela imprensa local o pronunciamento do líder do “V”, Jonas Sjöstedt, que estava no ato do seu partido na segunda maior cidade sueca, Gotemburgo. São palavras que renovam as esperanças de quem, assim como eu, acredita que o Brasil e os brasileiros podem conquistar tudo o que desejarem.
– Este é o momento para uma próxima etapa. O que o Partido de Esquerda propõe hoje é uma iniciativa nacional por uma jornada diária de trabalho de seis horas. Queremos apresentar o projeto de três anos com esta jornada de seis horas em um local de trabalho de cada município e em todos os municípios da Suécia. Jornada diária de seis horas com o pagamento integral do salário. Estamos passando de ensaios individuais (Projeto piloto que já foi aplicado com sucesso em alguns municípios) para a jornada mais curta em muitos postos de trabalho em todo o país. Nós começamos a praticar a viagem a partir de um dia de trabalho de seis horas. É tempo agora (de ampliar a experiência), disse Jonas Sjöstedt em seu discurso.
Qualidade de vida e distribuição de riquezas são os dois argumentos que sustentam esta proposta. As consequências já identificadas são animadoras, pois os trabalhadores que fizeram parte do projeto piloto ficaram menos doentes, produziram mais e melhor e representaram uma grande economia com a redução de licenças por problemas de saúde ou acidente de trabalho. A vida social e a familiar também foi favorecida entre os “cobaias” do projeto piloto.
– A Suécia está mais rica do que nunca. Relatórios de grandes empresas mostram lucros recordes. Ao desenvolver a tecnologia de modo que precisamos cada vez de menos tempo para fazer o mesmo trabalho. Enquanto isso, a robótica e a digitalização continuam, o que irá afectar a nossa sociedade profundamente. Aqui nós temos uma escolha: podemos escolher um mercado de trabalho onde os lucros do desenvolvimento da tecnologia acaba nos bolsos dos proprietários da empresa, enquanto muitos trabalhadores estão perdendo seus empregos e menos funcionários podem manter a mesma produção. Ou nós escolhemos um mercado de trabalho onde são compartilhados os lucros e reduzidas as horas de trabalho. Um mercado de trabalho em que temos mais tempo para viver. Esta parece uma escolha óbvia. Concluiu o líder do partido de esquerda da Suécia.
É assim que os suecos fazem a Suécia ser o que é. É assim que os finlandeses, dinamarqueses, noruegueses e islandeses consolidam cada vez mais a democracia e os seus direitos. São cidadãos que escrevem os destinos do próprio país. Eleger “salvadores da pátria” é uma ilusão de quem acredita ser possível terceirizar o próprio destino. A Greve Geral deu aos brasileiros a certeza de que quando unido, ninguém será capaz de pedir “sacrifícios” ao povo, enquanto poucos lucram com esses sacrifícios. A luta por um Brasil melhor já começou. Os brasileiros aprenderam rápido com a dor. Que venham mais greves como aquela do histórico 28 de Abril.