(Sem noção)
Por Pedro Breier, colunista do Cafezinho
“Hoje não é nada demais alguém trabalhar até os 65 anos”.
Esta frase foi proferida ontem pelo relator da reforma da Previdência, Arthur Maia (PPS-BA).
Ela é simbólica. Demonstra que o deputado e seus colegas que ainda apoiam a proposta estão completamente descolados da realidade.
Para quem trabalha com serviço pesado, como na construção civil, por exemplo, se aposentar aos 65 anos significa, na verdade, não se aposentar.
Para todos os trabalhadores significa menos anos para curtir a velhice, os netos, algum lazer. A vida, enfim. A vida das pessoas não é “nada demais” para esses senhores.
Os políticos, porém, dependem do voto para se elegerem. Se permanecerem completamente alheios à realidade e aos anseios da população passam a correr riscos – que o digam os presidenciáveis tucanos, em queda livre nas pesquisas de intenção de voto.
A direção nacional do PSB se deu conta disso e fechou questão contra a reforma da Previdência (e também a trabalhista). Não se trata de uma decisão ideológica, obviamente, uma vez que o partido apoiou Aécio Neves em 2014 e vinha votando com o Planalto no Congresso. O vice-presidente da legenda, Beto Albuquerque, deixou isso claro ao afirmar que as propostas do governo “são devastadoras para partidos que querem ter candidatos a presidente em 2018”.
Paulinho da Força também ameaça com a saída do seu partido, o Solidariedade, da base do governo, caso não seja alterada a reforma trabalhista.
Líderes governistas já pressionam Rodrigo Maia e o governo Temer para que a votação seja adiada mais uma vez. Cada adiamento joga a votação para mais perto da eleição de 2018, o que dificulta ainda mais a aprovação.
O Fernando Brito, do Tijolaço, definiu bem a situação: ficar ao lado das reformas draconianas de Temer é jogar uma espécie de Baleia Azul eleitoral e cometer suicídio político.
Para completar o quadro nada animador para o governo federal, a previsão é de que a greve geral da próxima sexta-feira seja maciça e coloque ainda mais pressão em cima dos deputados indecisos.
Metroviários, bancários, metalúrgicos, petroleiros, professores (até da rede particular!) já aderiram. Hoje e amanhã diversas categorias fazem suas assembleias para decidir sobre a adesão.
É grande a possibilidade de que pilotos de avião e comissários de bordo participem também. Um saudável caos nos aeroportos seria a cereja do bolo da greve.
A realidade é avassaladora. Quando acontece o despertar coletivo, não adianta fingir que nada está acontecendo.
João Doria, por exemplo, demonstra um descolamento da realidade ainda maior do que o do relator da reforma.
O cada vez mais provável candidato da direita em 2018 disse, na última segunda-feira, “não ter dúvidas” de que a maioria da população brasileira apoia as reformas da Previdência e trabalhista (todas as pesquisas apontam exatamente o contrário). Falou que quem é contra “pensa pequeno” e fez uma patética convocação: “O povo brasileiro tem coragem. O povo que foi às ruas para pedir o impeachment, que foi às ruas levantando bandeira verde e amarela, tem que ter a coragem agora de ir para as ruas defender as reformas”.
Doria parece pensar que o mundo é feito apenas de empresários – filiados ao Lide – e de coxinhas sem noção.
Não é.
E as perspectivas eleitorais não são nada boas para quem insistir em continuar na sua realidade paralela.