Por Bajonas Teixeira
No Brasil a cor da pele atua em profundidade sobre o inconsciente e, pelos efeitos que produz, é usada como o mais poderoso argumento da mídia para convencer os leitores. Marcelo Odebrecht percorreu todas as cores da degradação desde sua prisão em 2015, foi preto, foi mulato e foi moreno. Mas, de forma muito interessante, quando a lista de Fachin e a liberação das denúncias da Odebrecht puderam ser usadas contra Lula, a partir da semana passada, o herdeiro da Odebrecht foi embranquecido pela mídia.
Evidentemente essa não é uma foto original, mas uma imagem de vídeo editada ao extremo para os fins do clareamento facial. A imagem que se vê ao lado dela, escurecida e amorenada, foi usada durante todo o tempo em que interessava à mídia pintar o personagem como um vilão. Observem o fundo, que é o mesmo nas duas imagens, tiradas dos depoimentos, mas que muda inteiramente conforme a edição aplicada.
A foto com um Marcelo Odebrecht branquinho e aleitado, foi estampada primeiro no UOL, no sábado dia 15, e, sem seguida, reproduzida no G1, espalhando-se depois por toda a mídia. A primeira imagem foi essa aqui:
Esse uso, no que se refere a imagem dessa figura, vêm de longe. Em 2015, logo após ser preso, e quando interessava associar Marcelo Odebrecht ao PT (diferente de hoje em que, como denunciante, a mídia quer dar a ele toda a credibilidade possível contra o PT), sua imagem apareceu como o oposto total, empretecida e bastante imersa em sobras. Esse Marcelo Odebrecht do Mal deveria ser demonizado para que o estofo de maldade que se conseguisse inserir nele comprometesse o capital político do PT, apressando o impeachment de Dilma. Dentro dessas coordenadas, era assim que aparecia na capa da revista Época, edição 889, em Junho 2015, o Marcelo Odebrecht do Mal:
A mídia já estabeleceu que existe uma cor da honestidade, da confiabilidade, da credibilidade e da pureza, que é o branco. E outra, que é a cor do crime, da bandidagem, da violência e do perigo, que é o negro. E esses princípios, de tão batidos, tornaram-se evidências compartilhadas por toda a classe média branca no país, de direita ou de esquerda, e pela maioria do público não branco.
Seria do maior interesse das forças que lutam pela democracia do país, que essa prática, com toda a carga de discriminação que carrega, fosse interditada no Brasil. É que ela serve, sobretudo, de veículo à propagação dos velhos estereótipos herdados da Colônia e do Império, de quatro séculos de escravidão. A sua reprodução e vigência hoje é completamente contrária aos preceitos democráticos e ao estado de direito.
Sua continuidade só serve a um biopoder que reconstrói, com as máscaras de uma sociedade democrática, as hierarquias, os preconceitos, as tremendas distorções judiciais incompatíveis com uma forma social baseada na cidadania. Como se poderá ter justiça se, com os preconceitos vigentes, o negro já é a cor do crime e o branco, a da inocência? E em que uma simples mudança de cor na edição de uma foto, significa uma radical mudança de caráter e de credibilidade?
O retorno tão radical, como se vê pela virada nas fotos de Marcelo Odebrecht nesta semana, aos ritos e obsessões raciais mais grotescos da sociedade brasileira, aponta claramente que vivemos uma fase de aguda regressão histórica. E o caso é mais grave quando se considera que a chamada “esquerda”, está tão afogada nesses preconceitos que, em geral, sequer percebe o jogo da mídia. E, portanto, não se ergue à altura necessária para combatê-los.
COMPARTILHE. Visite e curta a MÁQUINA CRÍTICA: www.facebook.com/MaquinaCritica
Salvar