Por Tadeu Porto*, colunista do Cafezinho
Posso tecer diversas críticas ao historiador Leandro Karnal, personagem da polêmica efêmera da segunda semana de Março, mas não posso deixar de reconhecer uma grande qualidade nele: a maneira de se expressar (tanto na fala, quanto na escrita).
Quem domina a linguagem tão bem como Leandro, obviamente, sabe muito bem as consequências de um conjunto de palavras bem agrupadas e posicionadas, afinal, uma vírgula pode mudar o entendimento dos leitores e leitoras de maneira a arruinar ou salvar todo um argumento.
Por exemplo, li agorinha a resposta que Karnal deu a famigerada foto como Moro e falo com tranquilidade que o professor ergueu um muro de concreto entre ele e o magistrado.
Sobre a resposta em si, já adianto que o historiador recuperou meu respeito (a minha curtida ainda não, pois vou fazer um charminho). Ele poderia ter exaltado Moro – tem a mídia tradicional para o acobertar caso escolhesse tamanha bobagem – mas não o fez e ainda reconheceu o erro admitindo, inclusive, a pitada de vaidade que o fez pagar pra ver a reação dos seus seguidores ao estar com alguém que, teoricamente, brilha mais que ele (isso é raro e, portanto, louvável).
Ademais, o melhor do conjunto da obra é que Karnal esculhambou Moro, e isso qualquer entendedor mediano – daqueles que letra é só letra do alfabeto romano – consegue enxergar.
Primeiro, pois o palestrante gastou um parágrafo inteiro para explicar que o “inteligente” da foto deletada era direcionado ao juiz Furlan, o que nos faz abstrair que Moro só apareceu no elogio por pura educação.
Em segundo lugar, pois se referiu a Moro como “personagem da história” se abstendo de qualquer juízo de valor sobre o magistrado (nem mesmo de combatente da corrupção). Karnal não quis mais se arriscar, assim fica nítido que esse silêncio é a cara do consenso sobre o papel que o juiz do Paraná tem no neofascismo brasileiro.
Por último, e sim mais importante, bom mesmo foi o quase post script que Karnal lançou em seu post, praticamente deixando para o papel de fechar com chave de ouro uma frase que resume bem o que o palestrante quis deixar claro: “eu paguei o vinho”.
[Aqui eu chamo a atenção para algo que eu poderia ter escrito nos primeiros parágrafos, mas esqueci e estou mandando aqui mesmo por preguiça de rearranjar o meu texto. A explicação foi postada no fim da tarde, ou seja, Karnal teve muito tempo para pensar com carinho o tom da resposta que ia dar e os diabos que iria escolher para habitar nos detalhes textuais.]
Leandro não escreveu: “dividimos o vinho” ou “paguei o meu vinho”, ou mesmo deixou pra lá esse detalhe e encerrou o texto sem o “por fim”. Karnal quis deixar claro para os amigos e interessados (que aqui completo com amigas e interessadas, acho legal tentar abranger todos os gêneros na escrita) que ele “pagou o vinho”.
E o quê isso quer dizer?
Bom, na cultura ocidental, pão e vinho são símbolos majoritários de partilha. Portanto, Karnal simplesmente desenhou uma linha entre ele e Moro para não deixar dúvidas do seu distanciamento desse conservadorismo ultrapassado.
Eu até aceitaria o argumento de que Leandro quis simplesmente dizer que “pagou o vinho” porque é responsável pelas suas escolhas e que os pobres do Sérgio e Furlan não tem nada a ver com isso. Mas penso, honestamente, que isso não vem ao caso pois o professor gaúcho hora nenhuma em seu texto fez alguma defesa de Moro. Pelo contrário, o silêncio de Leandro sobre qualquer característica positiva do juiz significa, claramente, que esse o abandonou em praça pública, sem escudo algum, para que este continuasse a ser apedrejado pelos seguidores de sua página.
Confesso que minha decepção ainda continua, contudo ela ganhou certa armadura de alívio. Como esse texto de desculpas, para mim, Karnal se levantou, escolheu se equilibrar novamente na corda bamba da isenção, mas sinalizou que se cair novamente, dessa vez vai escapar do aconchego fascista que está esperando seu tombo.
Espero não estar errado, mas se eu estiver, sem problemas… Vou procurar amigos e amigas para dividir alguns vinhos comigo, assim afogo minhas mágoas e fica tudo de boa.
Tadeu Porto é diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense. Sigam-o no Facebook! ;)