(Foto: Henri Cartier Bresson)
Primeiramente (além de fora Temer, claro), peço, humildemente, um reconhecimento por parte do internauta: há muito tempo que eu não caio nas armadilhas da Lava Jato.
Ah, Temer é denunciado na Lava Jato.
Oh, Aécio é denunciado na Lava Jato.
Ih, delator menciona R$ 100 milhões para Dersa, do Paulo Preto.
Não mordi nenhuma dessas iscas. Até porque não concordo com os métodos usados. Sou radicalmente contra a delação premiada, ainda mais da maneira como é aplicada no Brasil, de maneira caótica, com vazamentos seletivos, publicidade opressiva na mídia, uso da prisão como tortura.
Cedo percebi que estávamos diante de manipulações monstruosas, que não poupam nem mesmo os deputados do “acordo nacional”.
Aliás, identifiquei que uma das estratégias da Lava Jato foi justamente usar delações e inquéritos para ameaçar e aterrorizar deputados que até então ocupavam o centro do espectro político, empurrando-os bruscamente para a direita, conduzindo-os, sob chicote, na direção do impeachment, numa tentativa desesperada de se blindarem (o que funcionou, para a maioria deles).
A Lava Jato joga o tempo inteiro iscas para opinião pública, mas o resultado é o mesmo: a narrativa explode sempre no colo do PT e blinda o “acordo nacional”.
Não caio mais nessa.
Para mim, a Lava Jato é uma operação midiática, imperialista, que destruiu a economia brasileira, subsidiou o golpe de Estado e ajudou o setor mais corrupto da política e do empresariado a assaltar o poder da república.
A Lava Jato prefere investigar a morte do prefeito Celso Daniel, ocorrida em 2002, e já investigada várias vezes por outras instituições policiais, a investigar a morte do ministro Teori Zavaski, ocorrida no momento mais dramático da crise política do governo Temer.
Não apenas não investiga, como seus operadores ainda apoiam o substituto de Teori indicado pelo governo Temer, diretamente beneficiado pelo “acidente”.
O resultado da Lava Jato está aí, para todos verem, e comprovado pelo PIB divulgado ontem: maior recessão da história, desemprego recorde, estados e municípios falidos, indústrias destruídas, um governo profundamente antidemocrático, que não apenas despreza a opinião da sociedade em qualquer tema, como ainda se gaba – num gesto ousado de desafio à democracia – de ter baixa aprovação popular.
Observem que tudo aconteceu de repente. Não houve um fator externo que justificasse uma queda tão súbita da economia, como tivemos em 1930, cuja crise sucedeu ao crash da bolsa de nova york e a queda nos preços do café.
Os únicos fatores que explicam o desastre econômico são: a Lava Jato e o golpe.
Suas prisões e delações foram e são calculadas pelo efeito midiático, pelo “timing”, conforme já confessou um de seus delegados, ao ser perguntado se a operação iria prender Lula.
A denúncia contra Aécio, por exemplo, já foi devidamente engavetada, ajustada, blindada e neutralizada.
Ontem, na festinha de aniversário do Noblat, o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), beijou a mão de Aécio Neves, afirmando que não o misturava com outros nomes envolvidos na Lava Jato.
Aécio aparece na lista da Odebrecht ao lado de alguns milhões, e ele mesmo confessa, em vídeo recente, que pediu dinheiro a Marcelo Odebrecht.
A Lava Jato e a Globo, porém, usaram a delação de Marcelo Odebrecht, que revelou que o tucano, de fato, pediu dinheiro a ele, para justificar a presença de Aécio na “lista de propina” da empreiteira.
Os milhões ao lado de “mineirinho” na lista da empresa referiam-se a uma doação legal da Odebrecht. Esta é a conclusão deste ser híbrido, de duas cabeças, formado por Lava Jato e Globo.
Ou seja, a lista da Odebrecht é híbrida: ela não comporta apenas dinheiro de corrupção. Nela, estão também anotadas doações legais, contribuições legalizadas, além de caixa 2 e propina.
Para se distinguir se o valor ao lado de cada apelido é dinheiro sujo (propina, caixa 2) ou limpo (caixa 1, contribuição, pagamento por campanha ou palestras), é preciso identificar se o nome pode ser ligado ao PT.
Se puder, então é sujo.
Se o nome não puder ser ligado ao PT (exemplo: Aécio), então é dinheiro limpo.
Essa é a manipulação. Chico Alencar, representante aguerrido da “esquerda que a Globo gosta”, entendeu perfeitamente como funciona o jogo.
A razão que explica o gesto de Alencar é a mesma que levou Rodrigo Maia a visitar Aécio Neves e a tirar fotos com ele, como primeiro gesto após vencer as eleições para a presidência da Câmara. É a mesma razão que explica Michel Temer nomear um tucano para o STF e encher cada vez mais o governo de caciques do PSDB.
É a mesma razão que levou Luis Roberto Barroso a mencionar FHC como um representante do “iluminismo”.
O PSDB é o partido preferido da Globo e das castas judiciais, e foi o grande vitorioso do “acordo nacional”. Todos os covardes, vaidosos, ambiciosos e oportunistas então se curvam ao novo rei.
Chico Alencar sabe muito bem distinguir o grau de “envolvimento” na Lava Jato… Romério Jucá e Renan Calheiros, por exemplo, foram dois cordeiros gordos que a Globo e a Lava Jato sacrificaram facilmente, porque sabe que eles não tem potencial (nem ambição) para serem candidatos a presidência da república.
Já o tucanos, esses são o “povo eleito” para governar o Brasil.
O Globo, e outros jornais, trazem hoje uma referência malandra a Lula. Um dos delatores da Odebrecht, o executivo Hilberto Mascarenhas, disse que o codinome “Amigo”, que aparece na famosa Lista da Odebrecht, é o ex-presidente Lula, ao lado da cifra de R$ 23 milhões.
Deste total, segundo o mesmo executivo, R$ 8 milhões teriam sido pagos entre novembro de 2012 e setembro de 2013. R$ 15 milhões ainda não teriam sido foram pagos.
Não vou entrar no mérito do completo desequilíbrio da narrativa lavajatense. Os R$ 8 milhões pagos a Lula podem ter sido anotações referentes a doações legais ao PT pedidas pelo presidente, o pagamento de palestras, além das contribuições legais ao instituto Lula (FHC ganhou muito mais de empreiteiras, não esqueçamos, e ainda via Lei Rouanet…).
Entre 2012 e 2013, Lula não era mais presidente há muito tempo, mas isso também não parece importar muito para a Lava Jato.
O “acordo nacional” segue a todo vapor.
Para a Lava Jato, que inaugurou a prisão “sem sentença” dos delatores, a palavra do delator não apenas se tornou verdade absoluta, como a delação é vazada imediatamente após ser feita. Já comentei aqui que houve delação vazada antes mesmo de existir (a Globo ou a Folha diziam que tal delator iria dizer tal coisa…)
Nesse processo de autodestruição no qual o Brasil mergulhou, não podemos mais falar de hipocrisia, e sim de manipulação pura e simples.
Ainda no Globo (é a manchete principal de hoje), me deparo com notícia de que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu criminalizar também o caixa 1.
Os moralistas e os ingênuos adoraram a decisão, mas ela é grotesca e inconstitucional, e traz ainda mais instabilidade ao processo político brasileiro, criminalizando ainda mais a política e politizando a justiça.
Uma decisão como essa dá ainda mais poder ao Ministério Público e ao Judiciário, em sua luta contra a política, porque eles poderão agora associar qualquer doação privada a um político ou partido à uma medida qualquer que esses tomaram em favor da empresa doadora.
Assim, uma das principais funções do governo, que é promover o crescimento (e não há, numa economia capitalista, outra maneira de fazê-lo a não ser melhorando a vida das empresas), é criminalizada.
As conspirações midiático-judiciais atingiram, há tempos, um grau de insanidade.
Se há exagero, hipocrisia e, em muitos casos, desonestidade, em pretender transformar o caixa 2, a prática mais antiga e mais corrente em todas as democracias do mundo (a ponto de, nos EUA, ser praticamente legalizado, pois o lobby é legal), num crime hediondo, a criminalização do caixa 1 representa um ataque frontal às liberdades democráticas no país.
É mais uma etapa do aprofundamento do regime de exceção que estamos vivendo.
Claro que há método nesta loucura. Quem vai definir se uma doação é crime ou não, será esse novo pólo de poder, que é a mídia associada às castas jurídicas: o partido do “acordo nacional”.
A decisão do STF interessa ao “acordo nacional”, porque abre um novo campo de ataques aos governos Lula e Dilma, que trabalharam abertamente em favor da indústria nacional, inclusive oferecendo financiamento para que estas expandissem seus negócios ao exterior.
O resultado foi o que vimos: forte crescimento econômico, pleno emprego e redução brutal da desigualdade de renda.
Para a turma do “acordo nacional”, todavia, nada disso importa. O dinheiro do contribuinte não pode ser usado para financiar empresas, incentivar a tecnologia, criar universidades e escolas técnicas e oferecer programas sociais, e sim, exclusivamente, para bancar a vida fácil dos rentistas e especuladores, e elevar as verbas destinadas aos grandes meios de comunicação.
O Brasil parece ter voltado à normalidade, ou seja, à ausência de esperança.
É a vingança do medo.
Mas não foi para isso que houve o “grande acordo nacional, com STF, com tudo”?