(Os patos estão acordando)
Por Pedro Breier, colunista do Cafezinho
A decisão liminar que suspendeu, pela segunda vez, a nomeação de Moreira Franco como ministro de Temer é uma pérola.
Ela simboliza tão bem os tempos bizarros em que vivemos que merece uma análise mais pormenorizada. A íntegra está aqui.
O início já é bastante estranho.
Antes de analisar o mérito da ação o juiz analisa as questões formais do processo, chamadas no mundo do direito de condições da ação. Dentre elas está a competência, que é a avaliação sobre a aptidão do juiz em questão para julgar aquela causa. Um juiz do Rio Grande do Norte não é competente para julgar uma relação de trabalho que aconteceu no Rio Grande do Sul, por exemplo.
Na liminar da juíza Regina Coeli Formisano sobre a nomeação de Moreira Franco ela declara sua competência de uma forma, digamos, peculiar:
Primeiramente é evidente que a Constituição brasileira concede ao Juiz Federal respaldo para apreciar esse tipo de demanda.
SOU COMPETENTE.
Doa a quem doer, custe o que custar, não vou trair a Constituição que jurei fazer cumprir.
Eita.
Mas vamos ao que importa, o mérito. Leiam este trecho:
O Magistrado, ao apreciar os feitos, tem o dever de exarar decisões, sob a égide estrita da legalidade, não podendo através de opiniões políticas ou de “achismos” decidir a vida das pessoas, prolatando decisões desarrazoadas, fundadas em alegações aéreas, sem fundamentos.
O que Regina faz na sequência? Toma uma decisão baseada em achismo, desarrazoada, fundada em alegações aéreas e sem fundamentos.
A juíza alega que a recriação da Secretaria Geral da Presidência da República por meio de medida provisória – que tem como pré-requisito a urgência da medida – só pode significar que Temer deu status de ministro a Moreira Franco para que este passe a ter foro privilegiado.
Ora, esta provavelmente é uma das razões que levaram Temer a tornar o gato angorá ministro, mas dizer que é somente por isso é puro e simples achismo. Moreira Franco é um dos homens fortes do presidente decorativo e é natural que seja um de seus ministros.
Regina baseia sua decisão no fato de que Moreira Franco foi citado mais de trinta vezes em uma delação. O cidadão é completamente enrolado, mas delação é delação, não é prova de coisa alguma. Entretanto, no Brasil surreal dos dias de hoje, delação derruba presidente, impede posse de ministro…
“O Magistrado não pode se trancar em seu gabinete e ignorar a indignação popular”, diz a juíza. E eu, inocente, achando que magistrado tinha que julgar de acordo com as leis e a constituição.
Nas entrelinhas deste tipo de decisão está a adulação a Sérgio Moro. Só o justiceiro-mor tem capacidade para julgar os figurões, ninguém mais. Patético.
Não que não seja bem feito para os golpistas. É muito bem feito, e estão certos os autores das ações contra a nomeação.
Os aprendizes de feiticeiro abandonaram todos os escrúpulos para dar o golpe. Impediram a nomeação de Lula como ministro exatamente com os mesmos argumentos esdrúxulos. Usaram a empáfia e o descontrole do judiciário a seu favor. Nada mais justo que tenham que lidar com o caos que criaram.
Mas a melhor parte, disparado, é o trecho final da decisão. Ei-lo:
Peço, humildemente perdão ao Presidente Temer pela insurgência, mas por pura lealdade as suas lições de Direito Constitucional. Perdoe-me por ser fiel aos seus ensinamentos ainda gravados na minha memória, mas também nos livros que editou e nos quais estudei. Não só aprendi com elas, mas, também acreditei nelas e essa é a verdadeira forma de aprendizado.
Por outro lado, também não se afigura coerente, que suas promessas ao assumir o mais alto posto da Republica sejam traídas, exatamente por quem as lançou no rol de esperança dos brasileiros, que hoje encontram-se indignados e perplexos ao ver o seu Presidente, adotar a mesma postura da ex-Presidente impedida e que pretendia também, blindar o ex-presidente Luiz Ignácio (sic) Lula da Silva.
Ao mestre com carinho.
O pedido de perdão a Temer e o “ao mestre com carinho” são positivamente ridículos.
O parágrafo anterior à dedicatória demonstra incrivelmente bem a confusão mental que se instalou entre os que acreditaram no discurso dos golpistas e realmente acharam, de coração, que o impeachment de Dilma era o melhor para o Brasil.
Dra. Regina está se sentindo traída por Temer ao vê-lo “adotar a mesma postura” de Dilma.
Ela com certeza não está sozinha; não são poucos os decepcionados com o mordomo de filme de terror.
Regina é apenas uma dentre os milhões de coxinhas bem intencionados que caíram no conto do vigário e agora assistem, “indignados e perplexos”, o espetáculo deprimente estrelado pela fina flor da corrupção brasileira.