(Fotos: Sergio Silva / CUT)
A colunista do Cafezinho, Denise Assis, nos envia entrevista exclusiva que ela publicou, há poucos dias, no site Colabora, com o presidente da CUT, Vagner Freitas.
CUT já fala em greve geral
Vagner Freitas diz que trabalhadores não ficarão parados diante da destruição de suas conquistas
por Denise Assis, para o Colabora
As ameaças de retrocesso e as possíveis perdas de direitos e vantagens conquistadas ao longo dos anos são muitas. Vão desde o fim do reajuste do salário mínimo, passando pela redução dos gastos com saúde e educação até uma dura reforma da previdência. Para piorar, em momentos de crise como o que estamos vivendo, a capacidade de mobilização e organização dos trabalhadores diminui. Todos estão preocupados em garantir o emprego e o sustento da família. O cenário desfavorável, no entanto, não deixa Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores, desanimado. Ele promete não arredar pé da luta e nem abrir mão do que já foi conseguido:
– Depois da imensa luta que os brasileiros enfrentaram para derrotar a ditadura e restabelecer a democracia, que deixou um rastro de mortes, torturas, censura e miséria incomensurável, não vamos ficar de braços cruzados vendo a direita destruir tudo que conquistamos.
Apesar dos desgastes sofridos pelo movimento sindical nos últimos anos, dados do Ministério do Trabalho indicam que Vagner está à frente da maior entidade de representação dos trabalhadores brasileiros. A CUT foi a central que mais cresceu no período, recebendo cerca de um milhão de novos operários. Foram 518 mil, só no ano passado. Já a Força Sindical perdeu o status de 2ª maior central sindical do país para a União Geral dos Trabalhadores (UGT) em 2015.
Nesta entrevista exclusiva ao #Colabora, Vagner fala sobre o governo Temer, ao qual se refere sempre como “golpista e ilegítimo”, a perda de poder dos sindicatos e a necessidade de mobilização constante dos trabalhadores. Para ele, o presidente está pagando a conta pelo apoio que recebeu dos empresários para a aprovação do impeachment. E adverte:
– Se tem uma coisa que une trabalhadores de todo o mundo é esse ataque brutal aos direitos. Esse governo não resiste a uma greve geral, de todas as categorias, com imensas massas de trabalhadores pressionando o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto.
#Colabora: O ano de 2017 se apresenta com uma pauta, por parte do governo, bastante dura para a classe trabalhadora. De que maneira a CUT está se preparando para lidar com esta perspectiva?
Vagner Freitas: A CUT sempre está preparada para mobilizações, para lutar por melhores condições de trabalho e renda e para fazer campanhas salariais. Portanto, estamos presentes nos locais de trabalho, informando e preparando a classe trabalhadora para o enfrentamento maior que teremos este ano, contra os ataques do governo golpista e ilegítimo de Temer aos direitos duramente conquistados nas últimas décadas.
#Colabora: Um dos pontos da pauta do governo é que as propostas aprovadas nas negociações diretas entre trabalhadores e empresários tenham mais peso nas decisões do que as estabelecidas na CLT. Como a CUT vai lidar com isto, num momento em que os sindicatos não têm mais a mesma força que tiveram num passado recente?
Freitas: Todas as medidas anunciadas pelo governo do golpista e ilegítimo Temer são pagamento da conta do impeachment, atendem a reivindicações antigas do empresariado mais conservador e retrógrado do Brasil, que são basicamente retirar direitos e enfraquecer a resistência da classe trabalhadora. Algumas praticamente trazem de volta o modo escravagista de lidar com o mundo do trabalho. Isso não vai desmobilizar os trabalhadores. Muito pelo contrário. Se tem uma coisa que une trabalhadores de todo o mundo é esse ataque brutal aos direitos. Esse governo não resiste a uma greve geral, de todas as categorias, com imensas massas de trabalhadores pressionando o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto.
#Colabora: De que maneira a CUT vai se posicionar com relação à proposta do governo de priorizar a negociação em detrimento da legislação?
Freitas: A CUT vai lutar pela ampliação do leque de proteção social e reforçar a mobilização da classe trabalhadora contra toda e qualquer proposta que aponte para o retrocesso. Os objetivos da flexibilização da legislação trabalhista não são a ‘modernização’, como dizem os empresários, nem a geração de emprego, como dizem os governos neoliberais. A flexibilização só dá segurança jurídica para os empresários piorarem as condições de trabalho e renda e aumentarem os lucros. É isso que vai acontecer se a proposta de priorizar o negociado em detrimento do legislado for aprovada. O mais provável é que os empregos que existem sejam precarizados, porque o trabalhador ficará vulnerável a acordos e convenções coletivas que não precisarão seguir a regulação das relações de trabalho estabelecidas na CLT. Para a CUT, a negociação coletiva deve ser valorizada como instrumento de fortalecimento da relação capital-trabalho, mas não deve substituir a CLT, muito menos permitir a redução de direitos e da qualidade de vida dos trabalhadores.
#Colabora: Como fortalecer os sindicatos para este enfrentamento?
Freitas: É importante lembrar que quando a economia do país está em ascensão, como vinha ocorrendo desde 2003, os sindicatos têm mais força para negociar e as empresas têm mais gordura para negociar, porque estão crescendo, ganhando dinheiro, registrando mais lucros. Já nos momentos de crise econômica, como a atual, as negociações e os acordos são mais difíceis, a preocupação com a manutenção do emprego é muito maior. Mas essa não é a primeira crise pela qual passamos. Os sindicatos cutistas sempre se mantiveram combativos, na vanguarda da defesa dos direitos dos trabalhadores.
#Colabora: O governo vem falando em automatização do seguro-desemprego como saída para o trabalhador receber o benefício em tempo recorde, ao mesmo tempo em que levaria o sistema a ter mais controle sobre o cadastro, eliminando as possíveis “falcatruas”. Você acredita que essa iniciativa vai ser benéfica para o trabalhador?
Freitas – Acredito que iniciativas como essa, em vez de melhorar a vida do trabalhar, poderão dificultar. Hoje, quando o trabalhador vai acessar o seguro-desemprego, ele precisa se cadastrar e se preparar para se habilitar a uma nova vaga de emprego ou fazer curso de qualificação profissional. Isso ocorre nos postos do Sine ou em postos privados com os quais o governo tem convênio, que fazem intermediação de mão de obra. Essa medida não vai garantir mais agilidade ou mais controle. Até porquê, sabemos da dificuldade que a maioria dos trabalhadores têm de acessar a internet. Como tantas outras propostas do governo golpista e ilegítimo, Temer, essa também não traz benefícios para os trabalhadores. Muito pelo contrário, vai dificultar o acesso ao seguro-desemprego, o que é, na verdade, o real objetivo da medida.
#Colabora – Diante de todas as medidas anunciadas e propostas que estão sendo feitas, o senhor acredita mesmo na possibilidade de um enfrentamento?
Freitas – Iniciamos em 2016 várias mobilizações para alertar toda a sociedade quanto aos prejuízos, para os trabalhadores e para o país, que essas medidas representam. Fizemos jornais e distribuímos nos locais de trabalho, nas estações de ônibus, de metrô, e em todos os pontos de grande fluxo de pessoas. Fizemos debates nas CUTs de todo o país, pois como você sabe, temos CUT em todos os estados e no Distrito Federal. A difusão das informações teve como objetivo preparar a classe trabalhadora para o momento da reação. Mostramos nossa capacidade de reação rápida em várias situações, como por exemplo, em janeiro do ano passado, quando em um dia organizamos um imenso ato no ABC que impediu centenas de demissões.
#Colabora – A reforma da Previdência não leva em conta as diferenças sociais e regionais e eleva muito o tempo a ser trabalhado até a aposentadoria. Esta é uma pauta que tramitará num Congresso que, majoritariamente, apoia o governo. Como vocês pretendem enfrentar essa questão?
Freitas – O governo golpista e ilegítimo de Temer não quer fazer uma reforma da Previdência. Ele quer acabar com a Previdência Social e favorecer o sistema financeiro com uma corrida às aposentadorias privadas para os que tiverem dinheiro para isso. Com o desemprego vitimando mais de 12 milhões de trabalhadores, sabendo que no Brasil os trabalhadores ficam em média seis anos desempregados, a grande maioria dos brasileiros não conseguirá se aposentar.
#Colabora – E que tipo de trabalho vocês estão fazendo para alertar sobre as mudanças?
Freitas – Fizemos um jornal específico sobre este tema e distribuímos em todo o Brasil. Conseguimos explicar para os trabalhadores que a Globo mente quando reproduz as falas de Temer, dizendo que ou reforma ou a Previdência acaba. Estamos nos preparando para grandes embates no Congresso Nacional, vamos fazer atos de rua, nos aeroportos, nos locais onde deputados e senadores vivem, vamos colocar fotos dos parlamentares que querem aprovar essa reforma nefasta em todos os cantos do país.
#Colabora – O problema é que a CUT representa apenas um terço dos trabalhadores brasileiros. Como andam as relações com as outras as Centrais para reverter esse quadro? Elas estão unidas em torno do assunto?
Freitas – A redução dos direitos trabalhistas e previdenciários une as centrais que têm compromisso real e histórico com os direitos dos trabalhadores, como é o caso da CUT. E quem não tiver esse compromisso vai ter de se entender com a sua base. O trabalhador não vai perdoar uma central que apóie esse ataque aos seus direitos. Se a Central não vier inteira para a luta, muitos sindicatos comprometidos e sérios deixarão as posições de suas centrais de lado e estarão conosco nessa luta.
#Colabora – Os aposentados não costumam ter peso na pauta, nem do governo, nem das Centrais, que preferem cuidar do interesse dos ativos. No momento em que até os direitos deles estão ameaçados, as associações dos aposentados vão trabalhar junto com as Centrais? O que fazer por eles, que têm pouco poder de mobilização?
Freitas – Não é verdade que os aposentados nunca estiveram na nossa pauta. Participamos ativamente do Fórum da Previdência Social no governo Lula. Este fórum reuniu representantes das centrais, duas associações de aposentadorias, governo e empresários. Infelizmente, não chegamos a um consenso sobre as mudanças propostas. Antes de ser destituída pelos golpistas, a presidenta Dilma Rousseff, havia prometido fazer um novo fórum para discutir o futuro do sistema. Os golpistas atropelaram o processo e fizeram essa proposta cruel, que acaba até com o Benefício de Prestação Continuada, pago a idosos e pessoas com deficiência mental, pobres, que não podem trabalhar. Aumentar a idade mínima de acesso ao BPC de 65 para 70 e reduzir o valor do benefício é condenar pessoas mais necessitadas à morte, por inanição.
#Colabora – Que lição a CUT tirou do processo de impeachment?
Freitas – O impeachment vitimou principalmente a democracia ao ignorar os votos de mais de 54 milhões de brasileiros. Vitimou o Brasil, que teve sua democracia arranhada, a presidenta Dilma, uma mulher honesta, ética e correta, e a classe trabalhadora, que está perdendo emprego, salário e direito de se aposentar. A lição que ficou para nós foi a de que não basta eleger o presidente. Temos que eleger maioria no Congresso Nacional, temos de ter mais representantes dos trabalhadores, menos empresários, menos banqueiros, menos fazendeiros, menos milionários. Ou seja, menos pessoas que só pensam em seus próprios interesses e mais pessoas que pensem no povo, de forma coletiva, humana e solidária.
#Colabora – O que esperar de 2017?
Freitas – Será um ano de grandes embates com o capital. O empresariado apoiou e financiou o golpe e agora cobra medidas de arrocho para aumentar seus lucros em cima daqueles que eles acham que são os verdadeiros patos dessa história, os trabalhadores. O que eles não sabem é que a classe trabalhadora não tem vocação para pato. Tem vocação para a luta, para proteger seus direitos. Não adianta o governo do golpista e ilegítimo Temer querer nos usar para pagar sua dívida com o empresariado, achando erradamente que estamos desmobilizados e despreparados. Vai se surpreender com a capacidade de mobilização dos trabalhadores, porque ele não conhece o Brasil, não conhece os brasileiros. Não sabe nada sobre luta. Parafraseando Lula, ninguém que ousou duvidar da capacidade de luta da classe trabalhadora teve sucesso nesse país e nunca terá.
#Colabora – Você acredita que teremos eleições?
Vagner Freitas – Depois da imensa luta que os brasileiros enfrentaram para derrotar a ditadura e restabelecer a democracia, que deixou um rastro de mortes, torturas, censura e miséria incomensurável, não vamos ficar de braços cruzados vendo a direita destruir tudo que conquistamos. E eleições diretas são uma dessas conquistas. Vamos ter eleições, sim. Talvez em 2018, quem sabe em 2017. Manter Temer e esse desgoverno que está destruindo o Brasil não é uma das opções. A única alternativa que resta para, de fato, reconstruir o Brasil democrático, com justiça social e distribuição de renda que começamos a construir, é eleger um candidato que tenha compromisso com o país e com a classe trabalhadora, que não esconda a miséria e a fome embaixo do tapete, que enfrente os desafios para nos tornar uma Nação melhor e mais solidária.
Denise Assis é jornalista e passou pela Veja, Isto É, Jornal do Brasil, O Globo, e O Dia. É autora dos livros: “Propaganda e cinema a Serviço do Golpe” e “Imaculada”. Também é idealizadora da coleção “Elas São de Morte” e autora de “Vende-se vestido de noiva”, lançada pela Editora Rocco. Foi assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da CNV, e assessora-pesquisadora da Comissão da Verdade do Rio. Também coordenou os trabalhos de elucidação da explosão da bomba da OAB.