Foto: Leonardo Benassatto/Futura Press/Folhapress)
Por Tadeu Porto, colunista do Cafezinho
[Esse texto faz referencia, da maneira mais sutil possível, ao ótimo filme “Eu, Daniel Blake” em cartaz nos melhores cinemas do país. Portanto, para aqueles e aquelas que não gostam de spoiler, recomendo a leitura desse texto para depois de ver o filme]
Uma sociedade capitalista, em prol do acúmulo de riquezas, é estruturada a ponto de adoecer seus cidadãos ou cidadãs não importa as consequências. Essa é uma das grande lições do filme Eu, Daniel Blake (I, Daniel Blake) do diretor Ken Loach e merecedor do prêmio mais respeitado do cinema, a Palma de Ouro do Festival de Cannes (estava torcendo para Aquarius, mas não foi dessa vez que o Brasil levou).
Bom, a crítica inerente à sociedade capitalista nos leva a pensar em alternativas para esse modelo. Na minha visão, se tivesse que classificar o filme em apenas uma ideologia, penso que o anarquismo se encaixaria melhor (particularmente, vejo Blake como a representação do “sujeito revolucionário”).
Todavia, a riqueza da obra proporciona argumentos para vários conceitos: liberais vão sair do cinema dizendo que o Estado muito pesado prejudicou o protagonista; socialistas vão criticar a mercantilização dos serviços sociais (que terceirizou o trabalho para o mercado) e sociais-democratas podem argumentar que a fragilidade da lei e suas execuções levaram o mal estar à população.
Na verdade, o filme é construído sobre uma premissa básica que acaba por se encaixar em qualquer tipo de ideologia que visa o bem estar coletivo: a saúde de um cidadão foi colocada em segundo plano. Exemplos disso, podemos observar facilmente no nosso cotidiano, principalmente num país tão desigual e aristocrata como o Brasil.
O caso mais recente de ampla discussão que temos é o AVC que a ex-primeira dama do Brasil, Marisa Letícia, sofreu e os motivos – ou não – que levaram uma senhora aparentemente saudável a ter um ataque tão repentino e violento.
Vamos pensar aqui: imagina que você tenha não só a sua vida, mas a dos seus filhos e marido amplamente expostas para todo o país. Não obstante às revelações (até mesmo de áudios de cunho estritamente pessoal), são reveladas histórias sobre uma premissa de que toda a sua família faz parte de uma organização criminosa que saqueou o Brasil e o destruiu.
Considere,ainda, que isso tudo é uma tremenda injustiça e que, há quase três anos dessas investidas absurdas (sem contar os ataques de sempre), não há absolutamente nada provando as calúnias e difamações que você e seus entes queridos sofrem.
Pensou com carinho, agora responda: isso é capaz de deixar uma pessoa doente?
É impossível não pensar na angústia que ela sofreu ao ver seus filhos serem massacrados pela opinião pública (a ponto de pessoas realmente acreditarem que um deles era um mega milionário dono da Friboi) para, no fim, a PF simplesmente apontar uma “variação patrimonial a descoberto” para um dos filhos.
E sobre o tal Triplex que ela supostamente ganhou de presente da OAS e, por isso, teve que se defender dos mais variados ataques contra a “troca de favores”. No fim, a Polícia Federal terminou um laudo sem implicações a ela e as testemunhas (inclusive de acusação) a inocentaram do caso.
Não há dúvidas que a estrutura social injusta que se instalou no nosso país, feita para proteger uma elite politico-econômica que desconhece a vida sem privilégios, é, talvez, a maior das causas que adoece grande parte do nosso povo. Sendo assim, essa difamação insana que Dona Marisa sofreu trouxe, sim, danos à saúde sela.
É impossível pensar em justiça social sem considerar que o primeiro passo é afastar essa lógica nefasta da desigualdade, que é protegida por políticas opressoras, desde a burocracia em Daniel Blake (“eles vão insistir até você cansar”) até a perseguição fascista que Marisa e sua família sofreu para criar uma falsa ideia de combate a corrupção.
Que Marisa possa sair mais forte ainda de mais essa luta.
Tadeu Porto é Diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense