Por Bajonas Teixeira, colunista do Cafezinho
Mais de dois milhões de pessoas serão ‘vistoriadas’ sob suspeita de que seus benefícios (por doença ou invalidez) são recebidos irregularmente, ou seja, que praticam fraudes. E é interessante observar que os médicos, a quem caberá o veredito sobre cada uma delas, formam uma categoria que, em grande parte, apoiou o impeachment e o golpe, raivosa com os programas sociais dos governos do PT, em especial como o programa Mais Médicos.
E qual o mote desses setores de direita para justificar seu ódio aos programas sociais? É o “Vai trabalhar vagabundo!”. É a ideia de que os impostos podem ser desviados para os ricos, indivíduos como o diretor da FIESP, sob cuja pirâmide a classe média se prostrou em São Paulo, e que deve (e nunca pagará) 6.9 bilhões à União, mas as causas sociais devem ser combatidas com polícia e tortura (fome, destrato, abandono, miséria e perseguição).
A missão dessa força tarefa é olhar com desconfiança e rancor de classe para deficientes carentes, aposentados por invalidez e pessoas doentes, e enxergar, por trás de cada expressão de sofrimento uma artimanha para enganar a perícia. A mesma turba da classe média que, sistematicamente, deixa de emitir recibo das consultas em seus consultórios, vestirá o avental branco e imaculado para julgar aqueles que quase nada recebem, mas que pagam indiretamente os impostos mais elevados do planeta.
Ninguém duvide: os peritos serão implacáveis, insensíveis e arbitrários. E considere-se ainda o seguinte: a grande parcela deles que dá expediente em dois ou mais hospitais, não cumpre o horário mínimo no serviço público e, de repente, se verá diante de um contingente de milhares de casos para dar conta sem demora. Quanto tempo será dispensado a cada uma dessas perícias sumárias?
A revisão é parte da estratégia de um governo formado por vigaristas e ladrões contumazes, contra os quais há um sem número de processos, inquéritos, suspeitas e investigações. Evidentemente, na cabeça desses delinquentes, todo o país é criminoso e fraudador. Não há nada de surpreendente nisso, aliás. Todo vigarista justifica seus golpes afirmando, para si mesmo, que todos os outros fariam a mesma coisa, se tivessem chance.
Esses mesmos malandros de terno, apoiados pela mídia, são os que concedem todas as facilidades, as incríveis e as inimagináveis, para atrair a escória dos investidores estrangeiros para negociatas em dólar no país. São os mesmos que, como se vê agora com o caso Geddel, se valerem de um banco público, a Caixa Econômica, para desviar dinheiro em grande escala e receber propinas. Uma verdadeira “organização criminosa”, como disse o Ministério Público.
E mais importante, isso não é de hoje. Alguns, como Geddel, estão no negócio desde os 25 anos, outros, há muito mais tempo. São profissionais escolados.
Em que universo esses sujeitos, com longas fichas corridas, tem condições de passar “pente fino” em quem quer que seja? Eles têm é que passar por detectores de metal e andar com tornozeleiras eletrônicas. A matéria traz a seguinte pérola do governo Temer:
“O governo afirma que ninguém precisa correr para a agência do INSS ou telefonar, porque as pessoas estão sendo avisadas sobre a revisão por carta.”
Ou seja, milhares perderão os benefícios sem nunca terem recebido qualquer carta. E não poderão alegar que não receberam. Aliás, alegar não ter recebido será tomado como prova cabal que se trata de um fraudador.
Mas inúmeros beneficiados moram em ruelas sem números, em habitações precárias onde o vento faz a curva e o carteiro não dá as caras, em vielas tortuosas e outras formas de labirintos urbanos que, jamais serão encontradas nem no Google Maps.
Os mesmos canalhas que estão desfigurando o endereço do Planalto, esperam que todo brasileiro que recebe benefícios tenha um endereço praticável. Enfim, o próprio fato de que a convocação será feita por carta, e, pior, que o governo aconselha que aguardem essas cartas, denuncia tratar-se de um jogo de cartas marcadas.
Os critérios fictícios de prioridade inventados pelo governo, delatam também a completa falcatrua que está sendo armada. A prioridade no auxílio-doença traz as duas condições abaixo:
- a prioridade serão as pessoas que recebem o benefício há mais tempo (por exemplo, primeiro quem recebe há 10 anos, depois quem recebe há 5 anos);
- a prioridade serão as pessoas mais jovens e depois as mais velhas (por exemplo, primeiro um trabalhador de 25 anos, depois um de 50 anos);
Ora, como é possível priorizar quem tem mais tempo de benefício, que é o caso de pessoas mais velhas, e, ao mesmo tempo, estabelecer a prioridade para os mais jovens? Essa completa traição à lógica e ao bom senso só entrega a natureza real da revisão programada: uma farsa para retirar direitos em massa.
Essa é a lógica da república dos marginais, comandada por uma gang para a qual todos, quase sem exceção, são vistos como suspeitos e gatunos como eles próprios. Só não o são os ricos e os super ricos porque deles, essa república, espera as gorjetas e os farelos caídos da mesa em forma de propinas.
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