Por Maria Fernanda Arruda, colunista do Cafezinho
A Sociedade ainda está estruturada nos moldes da Casa Grande & Senzala, a brasilidade armazena o ideal da ‘doutoragem’: o que não é doutor de nada e por nada, mas que saiu de uma faculdade. No mundo da República Velha, do mandonismo dos coronéis, os filhos desnecessários do zelo ao patrimônio, ao menos doutores precisavam ser. E o que mudou na modernidade dos nossos tempos?
Inevitável, a visão de mundo da casa-grande é hegemônica. Só o trabalho do doutor advogado, ou médico, ou engenheiro é capaz de enobrecer. Muito abaixo disso ficam as pequenas profissões das classes médias que precisam de ordenado a receber no fim do mês: bancários, balconistas, enfermeiros e taxistas. Por fim: a classe operária, segregada, posta nos bairros de periferia. Vetados a ela, sejamos claros e bem honestos: os bairros melhores, os clubes, as livrarias.
Até o surgimento do Bradesco do Amador Aguiar, operário não devia entrar em banco (anos de 1960) e a lei mandava que ele fosse pago em moeda nacional corrente.
Em meados dos anos de 1970, apenas entre os operários qualificados (já experimentando nível salarial bem superior ao de gerente de banco) havia uma porcentagem mais expressiva (algo como 40%) que aceitava ter filho operário e sindicalizado. Entre os semi-qualificados, a grande maioria do proletariado, não admitia simplesmente essa hipótese: “trabalho para por o meu filho na faculdade”.
Lula, torneiro mecânico, foi um operário qualificado. Lula, Presidente da República, quis universidade para todos. E para isso criou o PROUNI, o FIES.
Faltou quem lhe dissesse: “Lula, isso é utópico e equivocado. Primeiro, vamos lutar por uma sociedade democrática, botar abaixo os valores da casa grande. É preciso ter antes uma democracia, para que ela construa a universidade do povo e para o povo. A que está aí foi criada pelas elites, para as elites e mais recentemente vulgarizada como mais um produto de consumo, comprável a prestação”.
Na busca desse objetivo, o da “Universidade para Todos”, foram criadas 18 novas universidades, rompendo-se com a política neoliberal do período FHC. Isso não foi entendido como suficiente, adotando-se então o uso alternativo de universidades privadas. Há nisso uma renúncia à qualidade? Mesmo as universidades públicas enfrentam muitas carências, mantendo padrões de seriedade. Mas, entre as 50 melhores, conforme critérios do próprio MEC, apenas as Universidades Católicas e a do Vale dos Sinos têm presença constante.
Ao prestigiar as universidades privadas, na sua grande maioria, empresas, que fazem negócios de ensino, com a concessão de bolsas e financiamentos, o MEC assumiu um triste papel de agente ativo em contos do vigário: não deu valor ao estudante , mas vendeu-lhe o sonho vão de ascensão social. Na verdade, o MEC instituiu um PROER dessas empresas, que se dimensionou numa demanda inflada pelas facilidades criadas por ele. Como resultado, a formação em linha-de-montagem dos analfabetos funcionais.
A Universidade nasceu da iniciativa das elites e para as elites. É preciso que se lute por uma estrutura social humana e justa, para que então o povo construa a Universidade do Povo. Uma vez estivemos próximos disso, com o modelo de Darcy Ribeiro para a Universidade de Brasília; a gana com que a Ditadura a destruiu confirma isso.
Sempre existirá numa sociedade nova espaço para a atividade acadêmica, que poderá ser exercitada então em moldes democráticos. Mas não se confundirá com a formação técnica competente que efetivamente qualifique o cidadão para ocupar e desempenhar com eficiência funções no processo de produção de bens e serviços. O modelo de Darcy Ribeiro contemplava isso e libertava o ensino técnico da marca de inferioridade que a sociedade elitista impõe a ele.
Os governos do PT foram os primeiros a ter preocupação real com o ensino a ser oferecido ao povo. Mas tiveram que se empenhar em oferecer quantidade, que antes estava sendo quase nenhuma. Quando a primavera voltar, deseja-se que se criem condições para oferecer qualidade. Então, será necessário ser menos reformista e mais revolucionário: não é a Universidade que construirá uma nova sociedade: ela é que criará a nova Universidade.
Anônimo
09/01/2017 - 23h56
belo texto
emocionante
poesia
Bernardo Severo Filho
09/01/2017 - 18h48
Infelizmente esse modelo de sistema educacional imposto verticalmente de cima para baixo, fez água em todos os países nos quais foi adotado. Tentar formatar os espaços com organização rígida como a de alas de escolas de samba, de desfile de carros alegóricos com altura, número de passistas sambando no chão e outros como destaques explorando a sensualidade e a promiscuidade com o tráfico de drogas, milícias e outros que tais. Posso falar disso à vontade. Fui alfabetizado pela Professora Raimunda Duarte Braga pioneira da primeira escola em Horizonte, próxima de Pacajus, cujo trabalho foi reconhecido de há muito pela luta pioneira em se fazer respeitar `desde a ditadura Vargas, simpatizante dos regimes nazista e fascista que grassavam na Europa. Sou filho de família pobre que ascendeu à classe média desse país com muito esforço aproveitando oportunidade que a Escola Preparatória de Fortaleza me propiciou e na qual ingressei por concurso. Nunca esqueci as palavras do então Presidente Lula ao dizer que havia utilizado os mesmos instrumentos da direita para vencer as eleições. Não é pelo cultivo de ódio que se realizam as transformações sociais necessárias. O esfacelamento da toda poderosa URSS que o diga.
RONALDO
09/01/2017 - 18h39
NAS ENTRELINHAS, MAIS UMA ACUSAÇÃO AO PT.
ESSAS “FACULDADES ” FORAM CRIADAS EM SUA MAIORIA ABSOLUTA NA GESTçAO DO PSDB. MINISTRO PAULO RENATO…MAS NÃO PERDEM A OPORTUNIDADE DE MESMO NA CRÍTICA, COLOCA-LAS NA CONTA DO PT…..
José
09/01/2017 - 18h07
Concordo com o texto, porém acho excessiva a crítica ao PT, fez o que achou certo, da forma que deu, veremos se ou o que ficará de pé.
Vendo agora a sanha dos corvos e a quantidade de apoio que tiveram (interno e externo), do gangsterismo praticado contra eles, acho que fez até muito.
Não sei se quem cursou/cursa através do (Fies, prouni, reuni) estava afim a de esperar a “maturação da democrática” que seria a pedra fundamental da faculdade do povo (essa frase me parece digna de texto religioso).
Lizete
09/01/2017 - 20h08
Acredito que a sanha pela quantidade era para garantir que fossem instaladas e criadas ESPERANÇA e PERSPECTIVA de mudança social. Nesse ponto vingou. O povo quer mais, não menos. E, até o golpe e a derrota do PT nas eleições servirá de LIÇÃO.
Atreio
09/01/2017 - 17h12
Primaveras virão.
Parabéns Rosario!
Não vai levar 21 anos de novo.
foo
09/01/2017 - 11h09
Quando a primavera voltar, deseja-se que se criem condições para oferecer qualidade.
Infelizmente, com o congelamento dos gastos publicos, esta primavera vai demorar pelo menos 20 anos…
Daniel
09/01/2017 - 11h31
Não precisa ser assim. A Constituição, como se sabe, não é escrita em pedra (prova: tem ‘cláusulas pétreas’, que não deixam dúvida que o resto é fácil de mudar). Basta eleger um Congresso Nacional mais progressista e um presidente idem e muda-se o que a EC 95 dispõe.
Lâmpada de Diógenes
09/01/2017 - 13h39
Eleger um congresso nacional que tenha 3/5 de progressistas poderá levar bem mais que 20 anos.
Luiz Mourão
09/01/2017 - 16h54
Concordo com o amigo porém para VOTAR bem é preciso regulação do PIG…
Enquanto a mídia golpista, claramente facciosa, não for regulada pela Sociedade impondo-lhe reserva IGUAL de espaço para a Direita/Dinheiro e para a Esquerda/Trabalho, o POVO continuará sendo apenas “rebanho desorientado” que não sabe operar sua própria Vida, sendo portanto refém do dirigismo canalha das redes GOLPE da Vida…
Nisso LULA bobeou: teve os meios para regular a mídia mas achou que ela estava a seu lado…
E estamos pagando o preço agora…
LULA 2018!!
Roberto Souza
10/01/2017 - 10h28
Regular a mídia no Brasil será mais difícil do que eleger um congresso 2/3 progressista!
Se a esquerda/trabalho não dependesse tanto do estado/PT, poderia-se, talvez, criar uma mídia alternativa de verdade, blogs são bons contra pontos, mas no fundo não fonte de informações, apenas de contra-informaçao