Por Bajonas Teixeira, colunista de política do Cafezinho
Quanto mais o Brasil produza legiões de miseráveis, mais terá necessidade de penitenciárias pavorosas. O caos nas prisões não é uma falha, mas uma obra de arte. É uma máquina de tortura que obriga o miserável comum, mas em liberdade, a agradecer a deus por estar ainda do lado de fora. As penitenciárias do Brasil são vitrines do inferno à céu aberto, e são muito úteis. E serão mais ainda no futuro que se aproxima. Quanto mais se morra e se mate lá dentro, quanto mais horror produza, mas a máquina estará funcionando azeitada.
Sobrevindos em sequência, o monstruoso acontecimento de Manaus e o feminicídio serial de Campinas deixam a sensação de pesadelo. O ano de 2017 começa sob a égide do horror. Não apenas pelos fatos, mas também pelo comportamento das elites responsáveis. Hoje, dia 06 de janeiro, novo contingente de 33 presos foi assassinado em Roraima. O ministro da Justiça correu para as câmeras para dizer que “a situação não saiu do controle”.
Como não saiu do controle, se 95 presos cuja integridade física estava sob a guarda das autoridades responsáveis foram assassinados? O descontrole parece ser a regra do sistema. E essa regra é ‘administrada’ pelo descaso dos governos e da justiça. Contudo, o ministro tem razão: tudo está na mais perfeita ordem – o caos é o efeito da máquina de produzir horror.
É o que se vê em cinco fatos ligados a esse mundo pavoroso e que são, na verdade, os verdadeiros fundamentos de todo horror: 1) o sistema de administração das penitenciárias no AM é terceirizado em parcerias público-privadas (PPP); 2) a empresa que o administra, Umanizzare, recebeu quase 700 milhões governo entre 2013-2016, sendo a que mais sugou recursos públicos no estado; 3) essa empresa financiou, com fartos recursos, uma série de políticos suspeitos, um deles sendo acusado de tráfico de drogas; 4) os valores pagos à empresa por seu serviços têm todas as marcas do superfaturamento; 5) apesar das enormes somas consumidas, a administração das penitenciárias as transformou num inferno à céu aberto.
Como se vê, tudo começa com uma terceirização, esquema que ultimamente se começou a chamar de Parceria Público-Privadas (PPP). No jargão pegajoso dos políticos brasileiros, a PPP é o que há de “mais moderno nas parecerias da governança”. É o neoliberalismo levado às suas extremas consequências, com desmontes radicais de parcelas do estado (por exemplo, das agências públicas destinadas a administrar os presídios). E é essa a menina dos olhos de Michel Temer e Moreira Franco, o grande projeto que acalentam para o Brasil. Foi por isso que o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, defendeu a terceirização dos presídios:
De acordo com ministro, isso não coloca em xeque o sistema de PPP (parceria público-privada) para a administração de penitenciárias. “Uma coisa é o modelo PPP, outra é determinada empresa falhar. Não é porque a empresa falha que o modelo está errado. A falha houve. Outra coisa é analisar se o modelo de PPP deve ser aperfeiçoado.
Claro que o modelo não é um erro. Ele é um crime. O neoliberalismo é, já por si, um modelo canibal, que promove a hiperexploração da mão-de-obra e transfere renda (isto é, vida, sangue, carne) das massas trabalhadoras para uma meia dúzia de vampiros do capital. Mas isso só pode ser feito desmontando, como se viu na crise do subprime nos EUA, as agências fiscalizadoras, enfraquecendo o estado. O que exige a presença de parasitas e de intermediários, servindo como fornecedores políticos de desregulamentações e de ‘oportunidade de negócios’. É o papel exercido por Temer e sua trupe.
No caso brasileiro, a terceirização é infinitamente mais nociva porque aqui, muito antes de ser inventado o neoliberalismo, havia o capitalismo selvagem. E o que é o capitalismo selvagem? Ele também é um ‘neo’, como o neoliberalismo, mas um ‘neo’ de outra natureza. Ele é um neo-escravismo. Ou seja, o desejo e a prática de transformar o trabalhador livre em mera mão-de-obra “livre de todos os direitos”. As palavras livre, liberdade, liberalismo, neoliberalismo, significam a mesma coisa no dicionário dos manda-chuvas: semiescravidão.
O grande ódio aos políticos populistas ou quase-populistas – Getúlio Vargas, João Goulart e Lula – se deve aos seus acenos para assegurar, e por vezes ampliar timidamente, direitos dos trabalhadores. O que hoje Temer se apressa em desmontar, para garantir o apoio das elites empresariais, são as conquistas de direitos trabalhistas e sociais, desde a CLT de 1943.
A Parceria Público-Privada (PPP) é a ponta de lança avançada das terceirizações, portanto, do avanço da escravização. Fatos macabros já nos são familiares. Eles se tornarão cotidianos quando toda a modernização prometida por Temer, e por seus parceiros do PSDB, for finalmente implementada.
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