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Os fogos de sempre, com os buracos da crise

Espiando o poder: análise diária da grande imprensa  Foto: Fernando Lemos/Globo Por Luis Edmundo Araujo, colunista do Cafezinho “Ufa!” Assim foi a manchete do Globo de hoje, dando o aviso mais que óbvio da passagem de ano em boa sacada pra fugir da mesmice. E tudo embaixo da foto aí de cima, com os fogos […]

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Espiando o poder: análise diária da grande imprensa 

Foto: Fernando Lemos/Globo

Por Luis Edmundo Araujo, colunista do Cafezinho

“Ufa!” Assim foi a manchete do Globo de hoje, dando o aviso mais que óbvio da passagem de ano em boa sacada pra fugir da mesmice. E tudo embaixo da foto aí de cima, com os fogos de sempre na mesma Avenida Atlântica de todo réveillon, mas mostrando também, na antes sempre superlotada Praia de Copacabana neste dia específico, os buracos na areia e no asfalto provocados, tudo leva a crer, pela crise. E se a Veja, antes da virada, apostou na primeira-dama em mais uma de suas “capas históricas”, a Folha e o Estado de São Paulo vieram com manchetes frias, a primeira dizendo que “Doria terá de cumprir uma promessa a cada 12 dias”; e o Estadão afirmando que “dois em cada três prefeitos trocaram de partido”. Os dois jornais paulistas, porém, também deram seus recados na capa chamando para o editorial, artigos e colunas sobre o que esperam, eles, de 2017. No Globo não houve espaço pra isso na primeira página. Lá dentro, sem chamadas, Míriam Leitão batiza no título de sua coluna “o ano da dúvida”, enquanto Luis Fernando Veríssimo, pra desanuviar mas nem tanto, fala em “criancice”.

“Quem, entre nós, nunca sonhou em ter um suprimento inesgotável de sorvete que atire o primeiro Häagen-Dazs”, começa dizendo Veríssimo. “O poder dá a quem o tem a sensação de que pode realizar tudo, inclusive fantasias infantis”, continua ele, reconhecendo depois “que não foi o Temer que pediu 500 potes de Häagen-Dazs para o avião presidencial, o que, além de um exagero, seria uma desfeita com a Kibon”. Para Veríssimo, “os 500 potes de Häagen-Dazs servem como metáfora, tanto quanto as joias da mulher do Cabral e outros acintes, para uma espécie de delírio que vem com o poder, e que não deixa de ser uma forma de infantilização.”

Segundo Luis Fernando Veríssimo, “a quase compra de potes de Häagen-Dazs simboliza um grau de insensibilidade, nesta hora de aperto geral, que também tem algo de infantil, no sentido que crianças não têm senso de medida”. “Ou, se cabe outra metáfora, 500 potes de Häagen-Dazs simbolizariam um descaso pela opinião alheia que beira a malcriação. Outra criancice”, conclui o colunista, no dia em que, tanto no Globo quanto no Estadão, voltou a dar as caras o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Não houve aviso na capa do jornal carioca para o artigo de FHC exposto no alto da página 4, sob o título “Desbalanço”. No diário paulista, no entanto, o ex-presidente tucano teve espaço na primeira página pra dizer que “o Brasil redescobriu suas mazelas, reagiu a elas e se reencontrou com a contemporaneidade”. No Globo, no subtítulo do artigo o País também “redescobriu suas mazelas, reagiu a elas” mas “mostrou que suas instituições são mais fortes do que parecem, o que não é pouca coisa”.

“A despeito de tudo, vamos navegando no mar das delações com esperança em alguma Justiça e temos um governo que tenta pôr a casa em ordem”, afirma FHC no início do último parágrafo de seu artigo, num otimismo que, virando a página no Globo, contrasta com o que é dito por Elio Gaspari, na nota principal de sua coluna sobre “o mundo encantado de Michel Temer”. “Em 2017 a economia começaria a rodar, pois a máquina do governo seria destravada quando o Senado depusesse a presidente da República”, afirma Gaspari, abrindo o texto.

O colunista lembra que “a caravana Temer dizia que até o final deste ano seriam criados cem mil novos empregos. Nos últimos 11 meses (cinco dos quais na gestão do comissariado) três milhões de pessoas perderam seus postos de trabalho, e há 12,1 milhões de brasileiros desempregados, na pior marca de todos os tempos (11,9%)”. Enquanto isso, de acordo com Elio Gaspari, Temer “e o Banco Central foram aprisionados pelo todo-poderoso ‘mercado’, e, fugindo da realidade, o governo encastelou-se na moderna astrologia dos marqueteiros”.

“Temer roda o país prometendo fantasias encantadoras embebidas de ‘pensamento positivo’: ‘Quero no futuro ser reconhecido como o maior presidente nordestino que este país teve’. Para o presente, informa que o seu mandarinato ‘há de ser um governo reformista'”, prossegue Gaspari, para concluir anunciando que “ganha uma viagem à Coreia do Norte quem tiver lido as autolouvações publicitárias que a marquetagem oficial espalha pelo país, com o dinheiro dos impostos dos outros.”

Elio Gaspari também publica sua coluna hoje na Folha de São Paulo, que, ao contrário do Globo, assim como fez o Estadão com FHC, deu chamada na capa. “Temer viveu sob Dilma e sabe que mágica tem limite”, diz o título na primeira página do jornal paulista. O curioso fica por conta de que Gaspari não escreveu o nome de Dilma no texto, e mesmo assim ele aparece duas vezes na Folha, no maior tamanho possível, na capa, e ainda em corpo maior lá dentro, no ‘olho’ em negrito no qual “o doutor viveu nas fantasias palacianas de Dilma Rousseff, sabe que há um limite para as mágicas”.

Curiosidades à parte, o pessimismo de Gaspari não contagia os jornais, pelo menos não nos editoriais. “A crise e a força da Nação” é o título escolhido pelo Estadão para expressar sua primeira opinião do ano, no lugar de sempre da primeira página, embaixo, onde afirma que “se líderes tiverem valor, o País sairá dessa quadra turva mais forte”. Ao tratar do “enigma de 2017”, o Globo vê  no título do editorial um “ano envolto em temores, mas que pode ser de superação”. E a Folha reconhece traços do estado de exceção atual, mas no título, muito menos na chamada para o editorial que, no geral, vai no mesmo caminho dos concorrentes unidos.

“Muitos anos em um” é o título do editorial na capa da Folha, junto com o assunto, “sobre remédios fortes de que o Brasil precisou na política e na economia e reveses que campo progressista sofreu no mundo”. Lá dentro, no 11o parágrafo do texto o jornal reconhece que neste ano que passou “soergueram-se o Ministério Público e o Poder Judiciário, mas a extensão no tempo e a multiplicação de prisões sem juízo de culpa formado, o hábito de impor condução coercitiva a quem jamais se recusara a depor e a divulgação por autoridades de informações fora dos cânones legais são ocorrências preocupantes que se acentuaram em 2016”.

Nada muito significativo, porém, para o jornal que na frase seguinte se contradiz, elogiando quem praticou tudo aquilo que acabara de criticar ao dizer que “a velocidade exemplar de Curitiba na condução dos processos penais fez ressaltar a morosidade da Procuradoria-Geral da República nos casos submetidos ao Supremo Tribunal Federal.” A afirmação não deixa de combinar com outras duas notas da coluna de hoje de Elio Gaspari. Uma, “Suprema ordem”, dizendo que “não se sabe como, nem se pode dizer quando isso acontecerá, mas o Supremo Tribunal Federal adotará algumas normas para seus ministros”.

“Atualmente, em diversos assuntos, acima de cada um dos 11 ministros da Corte há apenas o Padre Eterno”, continua o colunista que na outra nota, “Odebrecht”, avisa que “há magistrados nos anexos das colaborações da Odebrecht. Seriam dois.” E um ministro do STF também aparece na nota de abertura da coluna Painel, de Natuza Nery na Folha, mas em outra faceta, focado na Justiça Eleitoral. “Junta tudo e joga fora” é o título da coluna e da nota em que “o TSE fará em fevereiro um seminário para analisar sistemas eleitorais mundo afora”.

“Presidente da Corte, o ministro Gilmar Mendes quer discutir não só o financiamento de campanha, mas como os candidatos serão eleitos em 2018”. continua a nota, dizendo que “o objetivo é influenciar a aprovação de um novo modelo até setembro para que o próximo escrutínio ocorra dentro de melhores regras. ‘Ou problema das doações ficará mais grave, porque será briga de elefantes – eleição de governadores e presidente’, diz Gilmar.

Na nota seguinte, “Xerife”, “caciques de alguns dos maiores partidos articulam restabelecer a doação empresarial, mas com limite de repasses. Transferências com CNPJ cairiam em um fundo controlado pelo TSE, e não nas contas de comitês financeiros das campanhas”. e Mendes volta em mais uma nota, “A pão e água”, só com a pergunta dele se “você imagina uma eleição presidencial usando dinheiro do Orçamento?” e com a resposta em seguida, dele próprio afirmando que “serão 30 mil candidatos em 2018. Não se sustenta a ideia de financiamento público”.

E se Natuza Nery fala de possíveis reformas na Justiça Eleitoral visando já o pleito de 2018, Míriam Leitão fala hoje do líder em todas as pesquisas eleitorais do momento, e crescendo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O ex-presidente Lula promete se lançar candidato à presidência. Isso criará um debate que oporá duas leis. A Lei da Ficha Limpa só impede a candidatura de quem é condenado em segunda instância, e a Constituição estabelece que um réu não pode exercer a presidência”.

“A Constituição se sobrepõe naturalmente, mas não há mecanismos de ação preventiva. O Supremo terá que ser provocado. Afinal, Lula é réu em cinco processos e deve ser condenado em primeira instância em pelo menos um deles ao longo do ano”, afirma a colunista do Globo, sem dizer que não há provas contra Lula em qualquer um desses processos, afirmando apenas, com relação ao ex-presidente petista, que ele “dirá que é um perseguido político”.

Com relação ao ano que chega, Míriam Leitão também tenta ser otimista, dizendo que “na economia em si o ano promete ser morno. Sem grandes alegrias, mas pequenos pontos de alívio”. Mas deixa-se tomar pela realidade ao reconhecer que “o quadro, no entanto, pode ser profundamente alterado se houver nova reviravolta política”, para concluir que “por razões internas e externas, 2017 será o ano da dúvida”, e que “o Brasil, que já veio de dois anos ruins, chega a ele cansado e cético.” Na Folha, no texto sob o título “Depende da sorte”, Jânio de Freitas é ainda mais pessimista, ao dizer que “nesse encontro do passado perdido com o não futuro, desejar ‘feliz 2017’ é uma extravagância cômica”.

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Luis Edmundo

Luis Edmundo Araujo é jornalista e mora no Rio de Janeiro desde que nasceu, em 1972. Foi repórter do jornal O Fluminense, do Jornal do Brasil e das finadas revistas Incrível e Istoé Gente. No Jornal do Commercio, foi editor por 11 anos, até o fim do jornal, em maio de 2016.

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Comentários

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lara

03/01/2017 - 05h40

FELIZ ANO NOVO CAFEZINHO KKKKKKKKKKKKK
O QUE VOCES AINDA ESTÃO FAZENDO NESTE PAIS “GOLPISTA”?? PORQUE NÃO CORREM PARA PAISES COM LIDERES QUE VOCES APOIAM-CUBA E VENEZUELA???

Fé e Política

01/01/2017 - 21h24

há um erro no artigo: nos últimos 11 meses, o ilegítimo governou em 8, desde maio, e não em 5. acreditaram na mentira qu ele mandou contar nos jornais dizendo que é governo há 120 dias.

Biana

01/01/2017 - 19h24

Se não fosse esse blog não teria lembrado dá existência da globo folha e veja…
Kkkkk

Antonio Marcos Carvalho

01/01/2017 - 16h26

https://www.youtube.com/watch?v=PYmYeBd3rEk


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