Procurador escreve artigo e expõe descontentamento com a justiça brasileira em 2016. Para ele, “No âmbito da Operação Lava Jato institucionalizou-se a prisão provisória para delatar, as conduções coercitivas de investigados, a exposição midiática do Juiz e dos Procuradores, o vazamento de trechos das delações premiadas e das interceptações telefônicas, seletivamente escolhidos”.
2016: o ano que nunca será esquecido!
Por Rômulo de Andrade Moreira
Perguntaram-me o que achei da atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário em 2016 e as perspectivas para 2017. Eis uma pergunta difícil de ser respondida.
No Ministério Público há muitos Promotores e Procuradores. No Judiciário, muitos Magistrados. De uma tal maneira que alguma resposta, por mais cautelosa que seja, sempre esbarrará no perigo da generalização, no risco da afirmação temerária.
Mas, inegavelmente, o Ministério Público e o Judiciário são corporações e, neste sentido, os seus integrantes estão todos nelas incorporados, sejam onerados ou bonificados. Então, assim responderei: o saldo é muito negativo neste ano de 2016.
Negativo porque o Ministério Público foi um parceiro fundamental em todas as arbitrariedades (do ponto de vista do Processo Penal constitucional) cometidas na chamada Operação Lava Jato. Mais do que parceiro, na verdade, foi um instigador quando, por exemplo, repetidamente, solicitou a prisão preventiva de investigados sem que houvesse nenhum fundamento legal para a decretação da medida cautelar (razão pela qual, milagrosamente – eu que não creio -, alguns dos pedidos foram negados e outros tantos, nada obstante terem sido deferidos, restaram, mais tarde, revogados).
Também na Lava Jato, o Ministério Público protagonizou cenas bizarras, como o caso do power point ou da denúncia em que foram confundidos Engels e Hegel.
Também o Ministério Público patrocinou umas tais medidas anticorrupção, absurdamente inconstitucionais (quase todas!), manipulando a opinião pública e angariando assinaturas em templos religiosos, praças públicas, etc., clamando por combatentes do bem, como se alguém, entre os incautos, fosse a favor da corrupção.
O Ministério Público valeu-se, igualmente, da possibilidade da delação premiada para, utilizando-se de um meio mais fácil, utilizar-se de uma investigação criminal efetivamente científica e sem coação física e moral aos investigados.
Degenerou-se, assim, a delação premiada, tornando o que seria uma fonte de prova excepcional em estratégia investigatória e, pior, em requisito (ilegal) para a prisão provisória. Neste caso, priorizou-se o fim em detrimento dos meios. A propósito, já vimos isso e os seus resultados. Os heróis de ontem, hoje são meras caveiras da História (às vezes, até fezes).
E o que dizer do Ministério Público no processo de impeachment da Presidente da República? Ao contrário de defender a ordem constitucional, a República e a Democracia brasileiras, sucumbiu a uma omissão imperdoável e a uma leniência absurda. Aqui, o Procurador-Geral da República nada fez para impedir os desmandos do Parlamento, muito pelo avesso.
Quanto ao Judiciário, e fazendo a ressalva primeira (em relação à vulgarização), o saldo também é bem negativo.
Vejamos, por exemplo, a Operação Lava Jato e o seu timoneiro. Aqui foram subscritas as mais absurdas decisões contra a lei e contra a Constituição Federal. O Juiz que está à frente das investigações e do processo decidiu à sua maneira, em um solipsismo inaceitável, como se dissesse: decido porque assim quero e assim será. E isso, nenhum Juiz pode fazê-lo, ainda que se ache um Deus! Aliás, quem se acha Deus, um dia haverá de descobrir quão humano é (e não me refiro, evidentemente, a ida ao vaso sanitário).
Bem, mas porque suas decisões foram referendadas (nem todas, vejam!) pelos tribunais? Até um pedido (cínico) de desculpas foi expressado por ele ao Supremo Tribunal Federal, sem que nada tenha sido feito pelo Conselho Nacional de Justiça. Eis o busílis: é o medo de ser contramajoritário. O temor da opinião pública (ou seria da opinião publicada?).
No âmbito da Operação Lava Jato institucionalizou-se a prisão provisória para delatar, as conduções coercitivas de investigados, a exposição midiática do Juiz e dos Procuradores, o vazamento de trechos das delações premiadas e das interceptações telefônicas, seletivamente escolhidos.
E o Supremo Tribunal Federal? Assistiu a tudo calado, com uma mansidão própria dos poltrões e dos tímidos. Não que sejamos a favor do ativismo judicial, que também assistimos horrorizados neste ano de 2016 (razão pela qual decisões da Suprema Corte foram solenemente descumpridas, desmoralizando-a). Mas, obviamente, uma Corte Constitucional não poderia silenciar-se diante de uma ruptura institucional que estava por vir (e que hoje se vê às claras!).
Bem, então, 2016 foi muito ruim, para falarmos apenas do Ministério Público e do Judiciário. No mais, foi muito pior, obviamente!
E o que esperar de 2017? É difícil algum otimismo neste momento em que se encontra o País. Não creio em melhoras, muito pelo contrário. A tensão aumentará. O cárcere ficará ainda mais lotado por desgraçados (graças, inclusive, ao Juiz de Curitiba, cujas decisões repercutem, por óbvio). Os excluídos serão em maior número (graças à política neoliberal). E a classe média seguirá, como diria Jessé de Souza, tola, acreditando em duendes como Deltans, Moros, Trumps, impeachment, etc.