Michel Temer publicou uma MP cujo texto é um drible em decisão do STF sobre política penitenciária nacional. Em 2015, o Superior Tribunal Federal decidiu que o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) não poderia mais sofrer contingenciamento. A medida provisória de Temer permite a transferência de verba destinada ao setor para arcar com custos de segurança pública.
No Justificando
Contra STF, Temer edita MP que retira verba a ser investida na melhoria do cárcere
Ontem, 19, o presidente Michel Temer publicou uma medida provisória que promove uma série de alterações na política penitenciária nacional, incluindo o desvio da verba destinada ao setor para arcar com custos de segurança pública.
A medida anunciada é uma resposta à ação proposta no último ano pelo PSOL no Supremo Tribunal Federal, que decidiu pelo “estado de coisas inconstitucional” do sistema carcerário brasileiro, determinando, como uma das consequências, que o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) não poderia mais sofrer contingenciamento. Frente à determinação do STF, o governo adotou estratégia para “driblar” a decisão e evitar a ampliação de recursos para a área.
Os recursos consignados ao Fundo são aplicados em construção, reforma, ampliação de estabelecimentos penais; formação, aperfeiçoamento e especialização do serviço penitenciário; aquisição de material permanente, equipamentos e veículos especializados imprescindíveis ao funcionamento dos estabelecimentos penais; formação educacional e cultural do preso e do internado; programas de assistência jurídica aos presos e internados carentes; e demais ações que visam o aprimoramento do sistema penitenciário em âmbito nacional. Outra destinação legal dos recursos do Fundo é custear seu próprio funcionamento.
Ocorre que entre os diversos pontos polêmicos, com a edição da Medida Provisória, recursos do Funpen poderão ser utilizados também para finalidades como “políticas de redução da criminalidade” ou para o “financiamento e apoio a políticas e atividades preventivas, inclusive de inteligência policial”. Com a nova redação da lei, o Funpen passará a financiar os órgãos policiais, deixando de se dirigir exclusivamente ao sistema penitenciário, para o qual foi criado.
Além disso, a MP estabelece que os recursos acumulados nos últimos anos e liberados com a decisão do STF de determinar o descontingenciamento do Funpen poderão ser repassados, até o limite de 30%, diretamente para o Fundo Nacional de Segurança Pública.
Para Tatiana Whately de Moura, ex-assessora do Departamento Penitenciário Nacional, as medidas anunciadas são extremamente preocupantes e colocam em risco as políticas públicas desenvolvidas pelo órgão, que poderá sofrer com ainda maior escassez de recursos: “o projeto que estava sendo elaborado pelo Ministério da Justiça na gestão anterior foi totalmente deturpado nessa Medida Provisória”. A cientista política afirma que “o objetivo era qualificar a gestão dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional, mas agora o dinheiro será desviado para outras áreas e o sistema prisional continuará às moscas. É uma ofensa à decisão do STF que determinou a ampliação de investimentos na área”.
Especialistas manifestaram sua preocupação, ainda, com a obrigatoriedade de que no mínimo 30% do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) seja utilizado para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos prisionais, na contramão de programas penitenciários voltados a áreas como saúde, educação, trabalho e alternativas penais à prisão.
Para o pesquisador de direito em Harvard e Professor da UNICEUB, Fábio Sá e Silva, trata-se de um dos maiores retrocessos na história da política penitenciária brasileira – “É o maior retrocesso na política penitenciária brasileira sob a vigência da LEP, que data de 1984, ainda antes da CF de 1988. Devemos lembrar que as más condições das prisões frequentemente motivam condenações do Brasil na esfera internacional. Custa-me crer que o governo tenha tanto desdém pelos poucos avanços que havíamos conseguido alcançar nesta área”.
Força Nacional de Segurança Pública
Se de um lado o Funpen foi drenado mediante a possibilidade de inúmeros repasses, de outro a medida provisória ainda reduziu sua arrecadação via loterias geridas pela Caixa Econômica Federal. Ao invés de 3%, o Fundo passará a contar com 2,1%, sendo que a diferença será diretamente para o fundo nacional de segurança pública.
Outra alteração de constitucionalidade contestada é a alteração na Lei da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), permitindo a atuação de policiais e militares inativos ou aposentados na Tropa, uma vitória pretendida e conquistada pelo Ministro da Justiça Alexandre de Moraes.
Leia a Medida Provisória na íntegra
MEDIDA PROVISÓRIA No – 755, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2016
Altera a Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, para dispor sobre a transferência direta de recursos financeiros do Fundo Penitenciário Nacional aos fundos dos Estados e do Distrito Federal, e a Lei nº 11.473, de 10 de maio de 2007, que dispõe sobre a cooperação federativa no âmbito da segurança pública.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
Art. 1º A Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 3º …………………………………………………………………………
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II – manutenção dos serviços e realização de investimentos penitenciários, inclusive em informação e segurança; ……………………………………………………………………………………………
IV – aquisição de material permanente, equipamentos e veículos especializados, imprescindíveis ao funcionamento e à segurança dos estabelecimentos penais; …………………………………………………………………………………………….
VII – elaboração e execução de projetos destinados à reinserção social de presos, internados e egressos, inclusive por meio da realização de cursos técnicos e profissionalizantes; …………………………………………………………………………………………….
XVI – programas de alternativas penais à prisão com o intuito do cumprimento de penas restritivas de direitos e de prestação de serviços à comunidade, executados diretamente ou mediante parcerias, inclusive por meio da viabilização de convênios e acordos de cooperação;
XVII – políticas de redução da criminalidade; e
XVIII – financiamento e apoio a políticas e atividades preventivas, inclusive de inteligência policial, vocacionadas à redução da criminalidade e da população carcerária.
§ 1º Os recursos do FUNPEN poderão, ressalvado o disposto no art. 3º-A, ser repassados mediante convênio, acordos ou ajustes que se enquadrem nos objetivos fixados neste artigo.
…………………………………………………………………………………………….
§ 5º No mínimo, trinta por cento dos recursos do FUNPEN serão aplicados nos objetivos do inciso I do caput.” (NR)
“Art. 3º-A. Fica a União autorizada a repassar os seguintes percentuais da dotação orçamentária do FUNPEN, a título de transferência obrigatória, aos fundos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, independentemente de convênio ou instrumento congênere:
I – até 31 de dezembro de 2017, até setenta e cinco por cento;
II – no exercício de 2018, até quarenta e cinco por cento;
III – no exercício de 2019, até vinte e cinco por cento; e
IV – nos exercícios subsequentes, até dez por cento.
§ 1º Os repasses a que se refere o caput serão aplicados no financiamento de programas para melhoria do sistema penitenciário nacional, no caso dos Estados e do Distrito Federal, e de programas destinados à reinserção social de presos, internados e egressos ou de programas de alternativas penais, no caso dos Municípios e nas atividades previstas no art. 3º.
§ 2º Ato do Poder Executivo federal estabelecerá:
I – os critério e os parâmetros de repasse de recursos; e
II – as condições mínimas para a habilitação dos entes federativos nos programas.
§ 3º A aplicação dos recursos de que trata o caput fica condicionada à:
I – existência de fundo penitenciário, no caso dos Estados e do Distrito Federal, e de fundo específico, no caso dos Municípios;
II – existência de órgão específico responsável pela gestão do fundo de que trata o inciso I;
III – apresentação de planos associados aos programas a que se refere o § 1º, dos quais constarão a contrapartida do ente federativo, segundo critérios e condições definidos, quando exigidos em ato do Ministério da Justiça e Cidadania;
IV – habilitação do ente federativo nos programas instituídos; e
V – aprovação dos relatórios anuais de gestão, que demonstrem o alcance das finalidades previstas nos programas instituídos.
§ 4º A não utilização, até o final do exercício, dos recursos transferidos nos termos do caput obrigará os Estados, o Distrito Federal e os Municípios à devolução do saldo devidamente atualizado, conforme exigido para a quitação de débitos para com a Fazenda Nacional, com base na variação da Taxa Referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic, acumulada mensalmente, até o último dia do mês anterior ao da devolução dos recursos ao FUNPEN, sem prejuízo de outras ações de fiscalização e prestação de contas a cargo dos órgãos competentes.
§ 5º Para fins de efetivação da devolução dos recursos de que trata o § 4º, a parcela de atualização referente à variação da Selic será calculada proporcionalmente à quantidade de dias compreendida entre a data da liberação da parcela para o beneficiário e a data de efetivo crédito no FUNPEN.” (NR)
Art. 2º A Lei nº 11.345, de 14 de setembro de 2006, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 2º O total dos recursos arrecadados com a realização do concurso de que trata o art. 1º terá exclusivamente a seguinte destinação:
…………………………………………………………………………………………….
V – 2,1% (dois inteiros e um décimo por cento), para o Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN, instituído pela Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994; …………………………………………………………………………………………….
VIII – 1% (um por cento), para o orçamento da seguridade social; e
IX – 0,9 (nove décimos por cento) para o Fundo Nacional de Segurança Pública – FNSP, instituído pela Lei nº 10.201, de 14 de fevereiro de 2001. ………………………………………………………………………………….” (NR)
Art. 3º O superávit financeiro das fontes de recursos concernentes ao Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN, decorrentes de vinculação legal existentes no Tesouro Nacional em 31 de dezembro de 2016, poderá ser destinado, até o limite de trinta por cento de seu total, ao Fundo Nacional de Segurança Pública – FNSP.
Art. 4º A Lei nº 11.473, de 10 de maio de 2007, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 2º A cooperação federativa de que trata o art. 1º, para fins desta Lei, compreende operações conjuntas, transferências de recursos e desenvolvimento de atividades de capacitação e qualificação de profissionais, no âmbito da Secretaria Nacional de Segurança Pública.” (NR)
“Art. 3º …………………………………………………………………………. …………………………………………………………………………………………….
VIII – as atividades de inteligência de segurança pública; e
IX – as atividades de coordenação de ações e operações integradas de segurança pública.
§ 1º A cooperação federativa no âmbito da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos apenas ocorrerá para fins do cumprimento ao disposto no inciso VII deste artigo.
§ 2º As atividades de apoio administrativo, imprescindíveis à atuação da Força Nacional de Segurança Pública, somente poderão ser realizadas pelo mesmo colaborador por um período máximo de dois anos.” (NR)
“Art. 5º …………………………………………………………………………
§ 1º As atividades previstas no caput, excepcionalmente, poderão ser desempenhadas em caráter voluntário por:
I – militares e policiais da União, dos Estados e do Distrito Federal que tenham passado para a inatividade há menos de cinco anos, inclusive os militares da União que tenham prestado serviços em caráter temporário; e
II – servidores civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios aposentados há menos de cinco anos, para fins de atividades de apoio administrativo à Força Nacional de Segurança Pública.
§ 2º O disposto no §1º aplica-se desde que a condição de inatividade não tenha se dado em razão de doença, acidente, invalidez, incapacidade, idade-limite, aposentadoria compulsória, licenciamento a bem da disciplina, condenação judicial transitada em julgado ou expulsão.
§ 3º Aos militares, policiais e servidores de que trata o § 1º aplica-se o regime disciplinar a que estavam submetidos anteriormente à inatividade.
§ 4º No caso dos militares da União que tenham prestado serviços em caráter temporário, a aplicação de penalidades disciplinares em decorrência do disposto no § 3º caberá às autoridades competentes no âmbito do Ministério da Justiça e Cidadania, nos termos do regulamento.
§ 5º O disposto nos art. 6º e art. 7º desta Lei e nos incisos I e II do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, aplica-se aos militares e policiais de que trata o inciso I do § 1º.” (NR)
Art. 5º Esta Medida Provisória entra em vigor:
I – em 1º de janeiro de 2017, quanto ao disposto no art. 2º; e
II – na data de sua publicação, quanto aos demais dispositivos.
Brasília, 19 de dezembro de 2016; 195º da Independência e 128º da República.
MICHEL TEMER
Alexandre de Moraes
Henrique Meirelles
Dyogo Henrique de Oliveira
Sangre di Coxa Conta Mina
20/12/2016 - 22h16
O STF virou Sugestivo Tribunal Federal, segundo o Porchat.
roberto silveira
20/12/2016 - 20h53
Ninguém dá bola para o STF. Nem Temer, que como se sabe, de corajoso nada tem.