“Tem sido mistificador o atuante lobby de juízes e procuradores no Congresso. O argumento absurdo é o seguinte: dizer que o corte dos supersalários é retaliação da classe política ao combate à corrupção”.
Cármen Lúcia e Janot não podem se omitir sobre supersalários
Magistrados e procuradores fazem lobby por ilegalidade vergonhosa
Por Kennedy Alencar
É fundamental que o debate para limitar supersalários não perca fôlego em 2017. O Senado aprovou três projetos nesse sentido. A Câmara deveria referendá-los.
Mas há obstáculos. Os maiores defensores dos supersalários são os presidentes de organizações de representação da magistratura e do Ministério Público. O argumento que utilizam para justificar vencimentos acima do teto é tratar esses valores adicionais como verbas indenizatórias.
Por exemplo, como se fosse um almoço de trabalho no qual se apresenta a conta para empresa. Em Brasília, é comum juiz ter casa e receber auxíliio-moradia. Há também um festival de diárias de viagem. Em resumo, o que seria expecional, uma exceção, virou regra e farra salarial.
São inúmeros os auxílios e vales de ajuda para moradia, educação, saúde, creche. A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), que tem feito um bom trabalho ao debater regras a fim de que haja respeito ao teto constitucional, leu no Senado um lista enorme desses chamados penduricalhos. Ora, eles são salários indiretos.
Também é preciso pôr fim ao efeito cascata quando há aumento do vencimento de um ministro do Supremo Tribunal Federal e isso tem impacto sobre o salário de desembargadores e juízes estaduais. No Judiciário e no Ministério Público, é bastante comum ultrapassar o teto constitucional.
Tem sido mistificador o atuante lobby de juízes e procuradores no Congresso. O argumento absurdo é o seguinte: dizer que o corte dos supersalários é retaliação da classe política ao combate à corrupção.
É inacreditável que quem acusa em nome da lei, como procuradores e promotores, e quem aplica a lei, como os magistrados, invoquem um argumento dessa natureza. A apropriação indevida de recursos públicos, por meio de penduricalhos que foram sendo criados ao longo de décadas, é uma forma de corrupção.
Não dá para propor combate à corrupção dos outros e preservar a própria corrupção. A Constituição Federal é clara. Tem havido um desrespeito à lei. É ilegal. Ponto.
A nova regra orçamentária que será aplicada com a PEC do Teto vai demandar muita discussão sobre onde colocar o dinheiro público. Esse dinheiro dever priorizar as políticas sociais para os mais pobres e os investimentos em infraestrutura. Não deve ser usado para aumentar salários de uma elite do funcionalismo que ganha bem para o padrão mundial e de forma acintosa para o padrão brasileiro.
O Poder Judiciário e o Ministério Público deveriam dar o exemplo numa hora de grave crise econômica e política. Nesse debate, falta maior ação da presidente do Supremo, Cármen Lúcia, e do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Seria importante que tivessem uma atuação pública mais clara a respeito desse assunto. Os dois tratam do tema lateralmente.
Como chefes de suas instituições, eles deveriam se posicionar sobre os projetos aprovados no Senado e que serão votados pela Câmara. Deveriam dizer publicamente o que pensam desses presidentes de organizações de representação da magistratura e do Ministério Público que passaram os últimos dias a defender de forma mais agressiva um privilégio vergonhoso.
Fingir que não estão vendo essa discussão é omissão pura e simples. Vira e mexe, juízes procuradores dizem que o Brasil está mudando. É preciso que eles também mudem.