Por Consulta Popular
1 – O aprofundamento da crise política e econômica exige da militância social a capacidade de apreender o movimento das contradições que dinamizam a luta de classes. O fundamental neste momento é termos iniciativa política para derrotar o movimento golpista. Este breve esforço de análise da presente luta política tem por objetivo subsidiar o conjunto da militância que luta por um Projeto Popular Para o Brasil. A realidade é dinâmica e exigirá mais rigor e ajustes na nossa caracterização da luta de classes.
2 – A instabilidade no interior do campo golpista, evidenciada pela crise institucional que atinge os poderes executivo, Legislativo e Judiciário, reflete uma disputa pela direção política do golpe. Importante compreender que o campo golpista constituído no processo de deposição da presidenta Dilma Rousseff é heterogêneo e suas forças sociais têm diferentes representações na cena política. As duas principais forças sociais do golpe são a burguesia associada ao capital financeiro internacional e a alta classe média.
3 – A burguesia associada é a força dirigente do golpe, enquanto a alta classe média é a base social do movimento golpista. A burguesia associada é representada, principalmente, pelos setores politicamente majoritários no Legislativo. Já a alta classe média é representada política, ideológica e moralmente por setores politicamente ativos do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e do Judiciário (estrato jurídico burocrático), que sustentam as medidas de exceção da Operação Lava Jato.
4 – A força dirigente do golpe, a burguesia associada ao capital financeiro internacional, perdeu o controle político sobre a base social do golpe: a alta classe média. Na verdade, a burguesia associada nunca teve total controle sobre as iniciativas políticas da alta classe média, mas após o impeachment da presidenta Dilma se aprofundaram as contradições entre alta classe média/Lava Jato e a burguesia associada.
5 – A alta classe média e a burguesia associada têm unidade na defesa do programa neoliberal (PEC 55, a reforma da previdência, privatizações, etc) e no avanço do Estado de Exceção para conter as forças populares e suas expressões políticas, o movimento de massas e a resistência às medidas antinacionais e antipopular do governo. No entanto, têm diferenças, pois a defesa que a alta classe média faz da continuidade e aprofundamento dessas medidas de “combate à corrupção” ameaça o núcleo político do governo Temer, além de deputados e senadores que compõem a sua base.
6 – Importante ressaltar que esta instabilidade no interior do campo golpista não significa um racha ou divisão entre as forças do golpe que venham a favorecer alianças táticas com quaisquer destas forças. A unidade do campo golpista se expressa no programa neoliberal que objetiva viabilizar a recomposição das taxas de lucros dos capitalistas.
7 – Ainda é cedo para concluir que as duas principais forças golpistas, a alta classe média e a burguesia associada, já estejam rifando Temer. Não existem ainda fatos concretos que demonstrem o desembarque da burguesia associada do governo Temer. A queda do ministro Geddel Vieira Lima e o conflito entre o STF e Renan Calheiros, por exemplo, não comprometeram o andamento e o cronograma das reformas neoliberais. No entanto, as expectativas e confiança das forças golpistas na consolidação e estabilização do governo Temer já não são as mesmas em comparação quando Temer assumiu. Essa perda de confiança ainda não é suficiente para decretar que a burguesia associada desembarcou do governo Temer, mas isso pode ocorrer no curto ou médio prazo a depender do aprofundamento da crise política e econômica.
8 – Contraditoriamente, as movimentações e ataques da alta classe média ao núcleo político do governo Temer são no sentido de fragilizar o governo para deixá-lo nas cordas. Paralelamente, esse movimento fortalece e legitima a Operação Lava Jato. Forças políticas referenciadas na alta classe média, como o PSDB, têm interesse que Temer pague o ônus da impopularidade das reformas. Derrubar Temer, neste momento, seria assumir a agenda terrível do ajuste. É preciso levar em consideração que mesmo existindo unidade entre PSDB e PMDB em torno do programa neoliberal, estes partidos têm conflitos de interesses, disputam espaço no campo golpista.
9 – Um possível rompimento da alta classe média e, principalmente, da burguesia associada, com o governo Temer só ocorrerá se este governo perder a capacidade de fazer avançar as reformas neoliberais. Num cenário em que o governo Temer perca a capacidade de fazer avançar as reformas neoliberais, a alta classe média e a burguesia têm em comum o fato de preferirem a saída de Temer somente em 2017 para viabilizar eleições indiretas (golpe dentro do golpe), eleger um nome pactuado entre a burguesia associada e a alta classe média. Essa movimentação pode favorecer maior estabilidade ao campo golpista para levar à frente as reformas neoliberais e aprofundar o Estado de Exceção. Ao mesmo tempo, as Organizações Globo, núcleo ideológico do golpe, vem atacando duramente o núcleo político do governo Temer, o que poderá reverberar no curto prazo na posição política da alta classe média.
10 – Neste momento, a opção da Rede Globo em atacar o núcleo político do governo Temer (mesmo que o governo esteja cumprindo o compromisso com a aplicação do programa neoliberal) e fortalecer a Lava Jato deve-se ao fato de que somente com o aprofundamento das medidas de exceção é possível reprimir a resistência popular e aplicar o programa neoliberal.
11 – Diante da atual instabilidade no campo golpista, as forças populares não podem perder a oportunidade aberta por essa contradição e têm o desafio de ir às ruas para ainda em 2016 derrubar Temer e, assim, conquistarmos eleições diretas para frustrar o golpe dentro do golpe. Para isso, temos que mobilizar milhões nas ruas.
12 – Caso a situação política fique insustentável para o governo Temer, o cenário mais provável é que Temer renuncie em 2017. E as eleições indiretas se imponham e se viabilize o golpe dentro do golpe (eleições indiretas). Mesmo que nossa mobilização pelas “DIRETAS JÁ!” não seja vitoriosa, desgastaremos e deslegitimaremos a farsa elitista das eleições indiretas. Mas este cenário de eleições indiretas pode melhorar a estabilidade do campo golpista. É um risco que corremos. Ao mesmo tempo, um governo eleito indiretamente já nasceria sem legitimidade devido nossa luta pelas diretas já. Importante sabermos que hoje temos poucas forças pra evitar o cenário de eleições indiretas.
13 – A realização de “DIRETAS JÁ!” contempla tanto o FORA TEMER como se opõe ao golpe dentro do golpe (com as eleições indiretas). Por isso, deve ganhar CENTRALIDADE nesta conjuntura. Ao mesmo tempo, faremos propaganda da Constituinte como saída política para superação da crise nacional de caráter político, econômico e social.
14 – As palavras de ordem respondem a uma situação específica de cada conjuntura. Nascem e morrem de acordo com as mudanças no xadrez da luta política. Em junho a palavra de ordem de “Diretas Já!” tinha o conteúdo de fortalecer o golpe cassando o mandato de Dilma. Agora, essa palavra de ordem tem o conteúdo imediato de demandar o afastamento de Temer e, ao mesmo tempo, rejeitar a eleição indireta e o golpe dentro do golpe.
15 – Precisamos intensificar a denúncia do avanço do Estado de Exceção e os abusos de autoridade da Operação Lava Jato. Temos de defender os direitos civis, como o direito à ampla defesa, a presunção da inocência, o cumprimento do processo penal e denunciar a banalização das conduções coercitivas e prisões preventivas, a generalização dos grampos e o conluio com a mídia no vazamento seletivo de delações. Denunciar a criminalização dos movimentos populares e de lideranças. A Operação Lava Jato é o elo forte do golpe e, certamente, a contradição das bandeiras democráticas e o Estado de Exceção tende a amadurecer e ganhar formas de luta mais complexas e superiores. Neste sentido, ainda cabe a denúncia do papel nefasto que vem cumprindo o STF, que tem sido conivente com as medidas de exceção, com os abusos de autoridade e com o próprio golpe.
16 – A defesa do direito do ex-presidente Lula ser candidato é uma tarefa fundamental para a resistência à consolidação do Estado de Exceção. Impedir a candidatura de Lula é parte importante da estratégia golpista. Aqui está o elo frágil da estratégia golpista pois Lula segue firme fazendo sua defesa e em primeiro lugar nas pesquisas. Impedir a coroação política da estratégia golpista, será uma vitória das forças democráticas, populares e nacionais.
17 – A convergência de crise econômica e política tende a jogar o país em uma crise social sem precedentes. Nosso desafio é organizar uma eficiente defensiva estratégica para resistir às reformas neoliberais, derrubar o governo Temer e exigir “DIRETAS JÁ!”. Ao mesmo tempo, fortalecer a unidade das forças populares em torno da Frente Brasil Popular, aprofundar nossos vínculos com a classe trabalhadora, construir um programa popular, nacional e democrático e apontar a construção de uma Assembleia Nacional Constituinte como perspectiva para a superação da crise nacional.
18 – Cabe ressaltar também que a I Plenária Nacional da Frente Brasil Popular representou um passo importante na construção da unidade das forças populares. Além disso, foi consenso que os ataques à Constituição de 1988 pelo governo golpista estão destruindo o pacto social da chamada Nova República. Isso coloca a luta pela Constituinte no horizonte e nos permite desde já fazer a propaganda desta bandeira estratégica.