Entre o apoio e o plano B

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Espiando o poder: análise diária da grande imprensa

Foto: Beto Barata/PR

por Luis Edmundo Araujo, colunista do Cafezinho

Morreu Fidel Castro, o líder da revolução cubana, aos 90 anos, e essa é a notícia mais importante de hoje em todo o planeta. Mas a morte de Fidel ocorreu às 3h29 deste sábado (22h29 em Havana), e por isso não está nas edições de hoje dos jornais e revistas da grande mídia, onde todo o espaço fica com a crise nacional. “Geddel cai, e Temer perde o 6o ministro em 6 meses”, diz a manchete da Folha de São Paulo sobre a queda de Geddel Vieira Lima do cargo de ministro da Secretaria de Governo, embaixo da foto aí de cima,  com Temer confabulando com os tucanos Simão Jatene, Reinaldo Azambuja, Pedro Taques, Marconi Perillo e Aécio Neves. O presidente Michel Temer derrete em ritmo acelerado, apesar do apoio declarado do PSDB, do qual o jornalista Luis Nassif suspeita em seu “Xadrez do golpe no golpe”, no qual relembra as origens de Marcelo Calero, o ex-ministro da Cultura que deflagrou a crise que mesmo em dia de bomba mundial, com a morte de Fidel, ganha espaço também na imprensa internacional. O britânico The Guardian, por exemplo, fala na capa de seu site, mais embaixo, da “mais recente crise no Brasil com o novo presidente encarando acusações de corrupção”. E se a Veja e o Valor colocam de novo na roda das denúncias José Serra e Geraldo Alckmin, o tom entre os colunistas da grande mídia em relação ao governo em frangalhos é de pito, também de muita emoção.

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“Demissão foi um dos momentos mais difíceis do presidente”, diz a chamada na capa da Folha para a coluna Painel, onde a nota de abertura, “Abraço partido”, conta que “a conversa definitiva” entre Temer e Geddel “foi bastante sentimental – repassaram pontos da história em comum. Depois seguiram-se telefonemas do demissionário a líderes aliados, também carregados de emoção”.  Também é emotiva a frase de Geddel destacada na primeira página da Folha. “Em Salvador, vejo o sofrimento dos meus familiares. Quem me conhece sabe ser esse o limite da dor que suporto. É hora de sair”.

Sair mas nem tanto. A coluna da Folha assinada por Natuza Nery diz que “o clima contaminou Temer. No almoço com o PSDB, ficou visível seu semblante carregado. ‘Não era o Michel de sempre”, resumiu um tucano.” Mas logo abaixo, na nota seguinte, “Na faixa”, revela que a amizade que une o presidente e seu ex-ministro continuará firme e forte, sem abalos, já que “Geddel deixou a pasta, mas não o governo. Seguirá ajudando Temer nos bastidores, mas sem cargo”.

Lá em Londres, o Guardian afirma na matéria, em tradução das mais livres, que “a crise explodiu quando o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero disse a investigadores federais que Temer o pressionou para deixar de lado uma ordem de proteção ao patrimônio histórico que suspendia a construção de uma torre de apartamentos na cidade nordestina de Salvador”. O Globo diz no subtítulo que “procurador-geral da República pretende ouvir também Padilha, titular da Casa Civil, sobre pressão por liberação de imóvel polêmico”, mas na manchete chama pra frente, mostrando um Temer atuante, a tomar logo decisões contra a crise, assim como faz o Estado de São Paulo.

“Temer promete ‘alguém que não esteja metido em nada’ para lugar de Geddel”, afirma o Estadão na sua manchete, enquanto o Globo diz que “contra crise, Temer acena com veto a anistia a caixa 2”. “Na tentativa de reduzir o impacto negativo da nova crise, Temer disse a interlocutores que vai vetar, caso seja aprovada no Congresso, a anistia a crimes eleitorais, como o de caixa dois”, diz o jornal carioca, para logo em seguida contar que “também acusado por Calero de pressioná-lo, o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) será ouvido pela Procuradoria-Geral da República, que pode estender a investigação a Temer.”

Na sua coluna de hoje, cujo título é “um prédio em Salvador”, Míriam Leitão também ensaia apoio ao governo atual afirmando, na abertura do texto, que “a queda do ex-ministro Geddel reduziu um pouco o clima de tensão que havia chegado ao auge na quinta-feira”, mas ressalta que “o episódio mostrou uma sucessão de erros e desvios”. “Na hora de se defender, o governo se complicou e exibiu uma inaceitável mistura entre privado e público”.

“O país em crise, e o Planalto mobilizado por um prédio em Salvador”, resume a colunista, para quem a crise ainda não terminou e o caso “foi mais grave pela revelação do ex-ministro Calero de que o presidente Temer entrou no assunto para pressioná-lo a liberar o imóvel embargado pelo Instituto do Patrimônio Histórico.” “Assim, nem mesmo a demissão de Geddel Vieira Lima resolve completamente o problema”, conclui Míriam, enquanto seu colega de redação, Jorge Bastos Moreno, dá nome  e sobrenome do culpado principal pela crise atual.

“Um nome do tamanho da crise” é o título da coluna de Moreno na qual ele afirma que “a crise tem nome e sobrenome: Michel Miguel Elias Temer Lulia. O presidente subestimou as denúncias de Calero, tratando-as inicialmente como uma coceira no pé, depois como uma unha encravada, sem saber que os fungos daquela ‘frieira’ já tinham contaminado todo o pé direito do seu governo, e, agora, viu-se obrigado a amputá-lo, para não poder perder a perna toda.”

O colunista continua afirmando que o presidente “mal sabia que a infecção já tinha tomado todo o corpo de seu governo, que agora vive a agonia de uma septicemia, que poderá reduzir os seus 25 meses que ainda lhe restam de mandato.” Uma redução, aliás, que não é defendida abertamente em lugar algum da grande mídia, muito pelo contrário. Na Folha, por exemplo, o professor de Direito Penal da USP, Gustavo Badaró, diz no título de uma matéria de página interna que “Temer errou, mas não consigo ver crime”.

De acordo com o jornal paulista, Badaró afirma que o “presidente cometeu equívoco político e ético, mas não vê razões para impeachment”. Na mesma entrevista, “Badaró diz não ter a mesma certeza sobre a inocência do ministro Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil, acusado de fazer pressão para que Calero enviasse o caso para a AGU (Advocacia Geral da União)”. Para ele, segundo a Folha, “há indícios de que Padilha pode ter cometido o crime de advocacia administrativa, que ocorre quando um funcionário público promove interesses privados no governo”.

Com relação a um possível pedido de impeachment do presidente, o professor de Direito Penal da USP afirma que “Temer fez atos reprováveis, errados política e eticamente. Mas nem tudo que é errado é crime de responsabilidade”. A opinião é compartilhada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que na Folha aparece no título afirmando que “governo Temer é frágil, mas é o que tem”. No primeiro subtítulo o jornal conta que “em evento em Brasília, ex-presidente chamou administração de ‘pinguela'”, e no segundo diz que “para Aécio, episódio de Calero não afeta ‘nem de longe”, e que “Alckmin disse achar ‘normal’ saída de Geddel.”

No Globo o título para o caso em questão afirma que “de olho em 2018, FH banca apoio a Temer”, e Nassif, em seu blog, diz que “a delação do ex-Ministro da Cultura Marcelo Caleró deflagra o primeiro passo da operação golpe no golpe.” “Ontem, em Brasília, me relataram conversas de Eliseu Padilha em 2012, com um empresário conterrâneo, adiantando a estratégia de sua turma. Apoiariam Dilma em 2014 e no dia seguinte começariam a batalhar pelo impeachment. O PSDB foi a reboque”, conta o jornalista.

Nassif completa afirmando que “controlando o STF (Supremo Tribunal Federal) e o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) através da Ministra Carmen Lúcia, e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), através de Gilmar Mendes, e a PGR (Procuradoria Geral da República) através de Rodrigo Janot, era questão de tempo para (o PSDB) adiantar o golpe no golpe.” Para fortalecer sua tese, o jornalista relembra que Marcelo Calero “não se trata apenas de um diplomata que saiu do nada para o MinC”.

“Trata-se de Marcelo Caleró, 4560, candidato a deputado federal pelo Rio de Janeiro em 2010, pelo PSDB. Bastará agora ir fervendo o caldeirão até virar o ano. Virando o ano, o TSE resolve a questão e a Câmara partirá para eleger um presidente pela via indireta”, aposta Nassif. Resta saber agora por quanto tempo vão durar as denúncias contra caciques do PSDB que pipocaram novamente na grande imprensa.

“Era uma vez três ministros”, conta a Veja na capa com as fotos de Geddel, Padilha e Moreira Franco, a do ex-ministro coberta por um X vermelho. Em cima, ao lado da chamada afirmando que “chegou neles”, a revista relembra os R$ 23 milhões pagos a José Serra pela Odebrecht, na Suíça, durante a campanha à Presidência em 2010 do atual ministro das Relações Exteriores. Também cita o caso em que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin foi apontado como o “Santo” por três delatores ligados a mesma empreiteira, que mereceu um texto de Fernando Brito, no Tijolaço.

“‘São’ Geraldo Alckmin, até agora invulnerável às denúncias de corrupção, tem problemas pela frente. E não aqueles negócios da Alstom, que a imprensa não gosta muito de tratar. É que, agora há pouco, o Valor confirmou que  ‘pelo menos três candidatos a delatores ligados ao Grupo Odebrecht relataram aos investigadores da Operação Lava­ Jato nomes de supostos arrecadadores de caixa dois que teriam captado recursos e os destinado, ao menos em parte, ao abastecimento de campanhas eleitorais do governador de São Paulo”, conta o jornalista.

“Neste caso também há referência ao apelido ‘santo’, diz o Valor. Mas que ninguém se apresse a condenar Alckmin. O tal santo pode não ser vinculado à Opus Dei. Talvez seja à Opus Peguei”, conclui Fernando Brito. Enquanto isso a maior chamada da capa do Globo, fora a manchete, avisa que “recessão joga mais 3,6 milhões na pobreza”, e Folha, na chamada da capa, informa que “depois de 11 anos em alta, renda dos brasileiros recua”.

Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad). Segundo a Folha, “o valor caiu 5,4% em relação a 2014 – R$ 1.845 para R$ 1.746”. E em matéria discreta de pé de página, embaixo de um anúncio com Robert de Niro enaltecendo as qualidades de um hamburger, o jornal publica a matéria em que “congelar Bolsa Família foi erro, diz economista”. No subtítulo, a Folha revela que “para Marcelo Neri”, pesquisador e diretor da FGV Social, “redução da desigualdade obtida no início da década será perdida”.

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Luis Edmundo: Luis Edmundo Araujo é jornalista e mora no Rio de Janeiro desde que nasceu, em 1972. Foi repórter do jornal O Fluminense, do Jornal do Brasil e das finadas revistas Incrível e Istoé Gente. No Jornal do Commercio, foi editor por 11 anos, até o fim do jornal, em maio de 2016.
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